Assédio é assédio, não importa o tamanho da ação. Uma ‘mão boba’ e uma tentativa de roubar um beijo são igualmente graves.
Nenhum homem tem o direito de avançar sobre o corpo feminino sem expressa autorização. Essa é uma conquista inegociável das mulheres.
Dito isto, a Globo acertou ao punir Guimê e Cara de Sapato com a expulsão. Ambos parecem ser homens de bem, mas erraram ao interagir fisicamente com Dania.
O antiético tribunal da internet não pode compará-los a criminosos sexuais, porém, o que fizeram diante das câmeras foi desrespeitoso a ponto de merecer uma lição exemplar.
Com discurso fraco, Tadeu Schmidt ‘esqueceu’ inicialmente de acolher a vítima. Dania foi jogada na arena.
É cruel, muito cruel, ver uma situação cotidiana se repetir no programa: a vítima levada a crer que tem culpa pela penalidade a quem a importunou.
Faltou sensibilidade para não permitir a Dania se sentir vilã da história. Vimos a preocupação dela em minimizar o comportamento equivocado de Guimê e Cara de Sapato a fim de não os prejudicar. Ela sabe que a mulher sempre acaba demonizada.
Agora, outro aspecto da polêmica.
A própria Globo merecia ser expulsa com os dois brothers. Sim, a emissora tem explícita parcela de responsabilidade nessa lamentável ocorrência — e sairá ilesa.
Não é aceitável a generosa oferta de bebida alcoólica em cada festa e a permissão para os porres. Quantas vezes assistimos a vexatórias atitudes movidas pelo consumo excessivo na casa?
O Sala de TV abordou a questão no post ‘Globo erra ao permitir apologia ao abuso de álcool no BBB’, em 10 de abril de 2020.
Ao repercutir as consequências de uma bebedeira de Flayslane, na vigésima edição, o blog lançou uma reflexão.
“A produção deveria ter agido antes a fim de não permitir o vexame público, o risco à saúde da participante e o mau exemplo aos telespectadores.”
Outro trecho: “Parte do público pode achar engraçado. Outro percentual talvez se sinta estimulado, por diferentes motivações, a beber também — e aí está o perigo de uma influência nociva por parte da televisão”.
Houve uma conclusão. “Lamentavelmente, o ‘Big Brother Brasil’ faz o contrário: exibe o consumo excessivo de bebidas alcoólicas — e seus efeitos tóxicos no corpo e na dignidade das pessoas — como se fosse mero entretenimento sem qualquer dano à vida.”
O álcool jamais deve ser usado como justificativa para atos impróprios, como lemos em nota postada pela equipe de um dos expulsos (“Guimê acabou exagerando na bebida o que o fez passar dos limites em alguns momentos.”), mas é inegável que o estímulo a beber desregradamente colaborou para o desfecho dramático desta vez.
Será que a Globo fecha os olhos para o risco inerente ao consumo exagerado por sempre ter marca de bebida alcoólica entre os patrocinadores do ‘BBB’?
O canal e especificamente a direção do reality show não aprenderam nada com as inúmeras ocorrências anteriores de participantes expostos a situações deprimentes após ficar bêbados?
“Eu acho que o que rola de bebidas nessas festas deveria acabar, é um péssimo exemplo para os jovens e sempre acaba mal. Ninguém sabe beber”, comentou Iolanda Sampaio em postagem do Terra a respeito da dupla expulsão.
No ar desde 2002, o ‘BBB’ não é uma atração feita com crianças. Os adultos ali confinados por espontânea vontade deveriam ter discernimento para conhecer os próprios limites e, assim, evitar problemas.
Na ausência dessa virtude (e todos nós estamos suscetíveis a errar), cabe à Globo agir para preservá-los. Não adianta soltar ‘avisos’ durante as festas. Imprescindível impedir que bebam até perder a capacidade cognitiva.
E os patrocinadores de álcool deveriam se envergonhar por permitir que seu produto seja associado a cenas degradantes.
Isso não é, definitivamente, entretenimento. Não faz bem a quem participa tampouco aos telespectadores.