Realidade? Seis dos 52 atores de 'Paraisópolis' são negros

Indo contra a realidade, novela não dá espaço para atores negros em papéis principais

1 jul 2015 - 13h09
(atualizado às 13h14)
O que Paraisópolis pensa sobre a falta de negros na novela?
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Um dos filmes mais famosos do Brasil é Cidade de DeusLançado em 2002, o drama de Fernando Meirelles retratava, de maneira explícita, a complexidade do tráfico de drogas nas favelas do Rio de Janeiro e, por que não, do Brasil, entre o final da década de 1960 e o início dos anos 1980. 

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Com quatro indicações ao Oscar, Cidade de Deus ganhou o mundo e as cenas violentas muito bem produzidas invadiram as televisões dos brasileiros com a chegada da superprodução aos canais abertos. 

O elenco protagonista contava com Leandro Firmino da Hora, Alexandre Rodrigues, Phellipe Haagensen, Seu Jorge, Douglas Silva e Jonathan Haagensen. Além do talento, os atores tinham outra característica em comum: todos eram negros. 

O filme incentivou a produção de obras cinematográficas sobre favelas, na maioria dos casos abordando a violência nas periferias brasileiras. Em I Love Paraisópolis, novela das 19h da Globo inspirada na maior favela de São Paulo, de Alcides Nogueira e Mário Teixeira, o foco é outro. A porcentagem de atores negros, por acaso (ou não?), também. 

Paraisópolis possui quase 56 mil habitantes. De acordo com o último censo, produzido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2010, ela abriga 55.699 moradores e 16.827 imóveis. Entidades locais discordam da medição e estimam a população em 100 mil habitantes, distribuídos em uma área de cerca de 1 milhão de metros quadrados. 

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A comunidade, que tanto sonha em ser reconhecida como bairro, está dentro do distrito de Vila Almeida, onde 44% da população se declara negra. Dentro de Paraisópolis, essa porcentagem sobe para mais de 70%. 

Personagens negros são minoria em 'I Love Paraisópolis'
Personagens negros são minoria em 'I Love Paraisópolis'
Foto: TV Globo / Divulgação

Mas por qual motivo, então, dos 52 atores do elenco principal exibido no site oficial da novela da Globo, somente seis são considerados negros? Para Juliana Gonçalves Rodrigues, vice-presidente da União dos Moradores e Comerciantes de Paraisópolis, e negra, o motivo vem lá de trás. "Acho que esse é um problema instalado no Brasil e no mundo. Ainda tem um reflexo de 500 anos atrás de preconceito, e é algo que os movimentos vão lutando para que isso possa ser modificado. Infelizmente isso ainda rola", disse ela, em entrevista exclusiva ao Terra (veja a íntegra no vídeo do começo da matéria). 

Protagonistas negros em novelas enfrentam barreiras

Em 2011, a novela Insensato Coração, de Gilberto Braga, trouxe ao horário das 21h o ator Lázaro Ramos na pele de André, escalado no roteiro inicial para ser o galã da trama. A atitude de Braga, considerada ousada na época, motivou o quadro Lázaro Ramos da Vida Real, do programa Pânico, onde um humorista negro, pouco acima do peso, com roupas largas e barba para fazer, dava cantadas grosseiras em mulheres nas orlas do Rio de Janeiro e levava foras. 

Em Insensato, André fazia sucesso com as mulheres, tinha dinheiro e vivia em uma mansão. Usava roupas de marca, sempre apostando no visual elaborado para conquistar uma boa companhia. Galãs de novelas posteriores, como Zyah (Domingos Montagner), de Salve Jorge (2013), e Zé Alfredo (Alexandre Nero) de Império (2014), não ganharam o mesmo quadro. 

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"Nós não queremos mais ser representados só no papel de empregada doméstica, de faxineiro, zelador", garante Juliana. 

Grego (Caio Castro) e Mari (Bruna Marquezine) são os "musos" da novela
Foto: TV Globo / Divulgação

Moradores não se sentem representados

Em conversa com alguns moradores da região central de Paraisópolis, o sentimento encontrado pela reportagem é único: Grego (Caio Castro), Marizete (Bruna Marquezine) e companhia não representam exatamente a identidade daqueles milhares de habitantes. 

"Não senti interesse, não. Eu fiquei para assistir, mas sei lá... não sei quem são (os atores)", diz Sara Ramos, estudante de 18 anos, que prefere novelas como A Usurpadora Carrossel. "Eu não gosto da Globo, eles mostram essas cenas de sexo aí e acho que isso não é coisa que se mostre", completa.

Novela trouxe visibilidade para a região 

Em contrapartida, a gravação de uma novela sobre Paraisópolis trouxe bons frutos para a comunidade. Ações promovidades pela Globo no Centro de Educação Unificado (CEU) da comunidade, com aulas de balé e eventos culturais, além de uma visibilidade acima do normal, deram aos moradores um destaque não visto anteriormente. 

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"Vem até turista aqui agora, de fim de semana aparece um monte", diz Sara. "Ajudou bastante no comércio, né? As pessoas visitam mais, querem sempre comprar alguma coisa, e ajuda a gente a fechar a conta do mês", afirma uma dona de lojas de roupas que não quis se identificar. 

Outro beneficiado é Diego Soares. Aos 33 anos, o grafiteiro, colaborador da União dos Moradores e habitante de Paraisópolis desde pequeno, utilizou a novela como inspiração para pintar alguns muros danificados em diversas regiões da favela. "Ajuda a melhor o visual, tira um pouco dessa coisa sinistra de alguns becos", diz ele. 

Grafite de Digo homenageia novela das 19h
Foto: Elisa Feres / Terra

No geral, a sensação de ver sua região representada em uma novela das 19h é algo gratificante para os moradores, que se sentem vistos pela cidade sem os rótulos de violência e degradação que filmes anteriores e programas policiais passam dos bairros periféricos, mesmo que isso ocorra sem uma representação fiel aos rostos que fazem de Paraisópolis o que ela é. 

Repercussão nas redes sociais

Com 21 pontos de média em audiência, I Love Paraisópolis alcança boa parte das televisões brasileiras, o que acabou levando o tema para discussão nas redes sociais. Veja abaixo alguns comentários: 

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Fonte: Terra
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