Não surpreende a notícia de que três profissionais da Jovem Pan News foram hostilizados ao cobrir o ato antidemocrático de bolsonaristas que pedem intervenção contra a posse de Lula diante do Quartel-general do Exército, em Brasília. Precisaram ser escoltados por militares.
Um dos jornalistas hostilizados foi o repórter Bruno Pinheiro. Nos Stories de seu perfil no Instagram, ele repostou dezenas de posts de colegas da imprensa condenando o ataque e agradeceu as manifestações de solidariedade.
Os jornalistas foram atrapalhados ao fazer entradas ao vivo. Ouviram ameaças de agressão caso dissessem algo que desagradasse aos manifestantes. Sem meias-palavras, pequenos ditadores anônimos tentaram cercear a liberdade de imprensa.
Basta conhecimento básico de história geral — e a das guerras, preferencialmente — para prever que o aliado de ontem pode se tornar o inimigo de amanhã. Ou de hoje.
A Jovem Pan colhe o que plantou quando decidiu dar visibilidade valiosa a comentaristas de pensamento extremista e ajudou a alimentar a onda de negação do processo eleitoral.
Era vista até o anúncio do resultado das urnas como fiel aliada de Jair Bolsonaro. A imagem começou a mudar para numerosos bolsonaristas quando determinou o fim dos xingamentos contra Lula e ministros do STF diante das câmeras.
Piorou logo após o 2º turno, com a saída repentina de Augusto Nunes e Guilherme Fiuza, jornalistas idolatrados pelo bolsonarismo.
O canal passou a ser visto como 'traidor da Pátria' por significativa parcela dos eleitores e aliados políticos do presidente.
Na imprensa e nas redes sociais, ecoou o rumor de que haveria uma guinada da Jovem Pan ao centro, abandonando a defesa enfática dos ideais da direita radical.
A atitude de Ana Paula Henkel, que se demitiu em solidariedade ao mentor, Augusto Nunes, reforçou a percepção dessas pessoas de que estava em curso o esvaziamento ideológico da emissora.
Outros porta-vozes do conservadorismo continuam no ar, a exemplo dos comentaristas Paulo Figueiredo, Rodrigo Constantino e Marco Antônio Costa.
Diante da controvérsia, o CEO do grupo Jovem Pan, Roberto Araújo, gravou um editorial enérgico exibido na TV e em plataformas digitais.
Negou que a derrota de Bolsonaro tenha produzido mudança editorial para agradar ao presidente eleito, Lula, por interesse nas verbas publicitárias do Estado.
"A Jovem Pan, independentemente do governo, sempre atuou da mesma forma", disse Araújo. "Não submetemos nosso jornalismo a quem paga mais ou menos."
Com essa inaceitável ameaça contra seus jornalistas, em Brasília, a Jovem Pan teve seu dia de Globo, alvo preferencial dos extremistas.
Com audiência crescente entre as TVs pagas, a JP precisará segurar o público que conquistou em 1 ano de funcionamento e tentar atrair outros perfis de telespectadores a fim de continuar a crescer em direção à líder do segmento de notícias, a GloboNews.
Como será a emissora a partir de 1º de janeiro: ferrenha opositora do governo petista — e pilar de sobrevivência de Jair Bolsonaro na grande mídia — ou mais neutra e virtualmente imparcial? A conferir.
Em tempo: todo veículo de imprensa deve oferecer pluralidade ao noticiar e opinar. Na cobertura política, garantir visão ampla, da esquerda à direita.
A Jovem Pan não erra ao propagar o pensamento conservador, e sim quando corrobora comentaristas inegavelmente favoráveis a ações autoritárias e antidemocráticas.