William Bonner tem sangue frio. Gélido, talvez. Já foi xingado por Jair Bolsonaro de “sem-vergonha”, “maior canalha”, “mentiroso” e “cara de pastel”. Nunca revidou no mesmo tom. Voltou a dar prova de seu autocontrole nas edições de quarta e quinta-feira do ‘JN’.
Ele usou os eufemismos “inverdade” e “declaração inverídica” para dizer que o presidente mentiu ao alegar ter sido proibido pelo STF de atuar amplamente no combate à pandemia de covid-19 e ao rebater denúncias de fraude nas urnas eletrônicas. Em ocasiões anteriores, ao contestar Bolsonaro por outras declarações, amenizou com “faltou com a verdade”.
Como editor-chefe, Bonner tem autonomia para pautar e falar o que quiser diante das câmeras. O máximo a que se permite é, às vezes, manifestar repúdio ao presidente com expressões faciais. Algumas caretas de deboche viraram memes e certos olhares de reprovação geraram manchetes.
Por que, apesar de ser alvo frequente, o jornalista não refuta as ofensas com veemência? Em primeiro lugar, Bonner demonstra respeitar a institucionalidade em torno de Bolsonaro. Goste-se ou não, é o presidente da República e deve ser tratado de maneira protocolar pela imprensa devido ao cargo que ocupa. Chamá-lo de “mentiroso” seria hostil e provocativo.
O âncora parece seguir o conselho do poeta e dramaturgo Henrik Ibsen. “Finge ignorar os teus inimigos; não caia na vulgaridade de se defender”, escreveu o norueguês. Ele sabe que, se for responder no ar a cada ataque verbal, vai dar mais visibilidade a Bolsonaro e alimentar um conflito estéril.
Titular da bancada do ‘Jornal Nacional’ desde 1996, William Bonner desagradou a muitos poderosos de todas as ideologias do espectro político. Nesses 25 anos, quatro presidentes ascenderam e se foram – e ele continua lá, todas as noites naquela bancada, a informar e influenciar milhões de telespectadores.