Todo dia ela faz tudo sempre igual’ (...) ‘Todo dia eu só penso em poder parar’...
As duas frases pinçadas de ‘Cotidiano’, composição de Chico Buarque, representam a rotina robótica que a maioria de nós segue.
Cumprimos as obrigações diárias de maneira automática, sem aplicar sentimento nas atitudes. E assim o tempo passa e ficamos cada vez mais insensíveis.
Aí, de repente, um produto audiovisual criado exclusivamente para entreter o cidadão se mostra capaz de provocar uma catarse.
A trama de Duda (Gloria Pires) e Adriana (Julia Dalavia) em ‘O Outro Lado do Paraíso’ torna impossível assistir ao novelão sem se envolver emocionalmente com o drama das personagens.
Capítulo após capítulo, o telespectador recebe intensa descarga afetiva a partir do amor e da consternação da dona de bordel e sua filha advogada.
É uma situação fictícia capaz de despertar reações orgânicas. O folhetim consegue acessar nossa sentimentalidade e fazê-la transbordar.
Por meio daquelas pessoas que só existem na TV, encaramos nossos próprios medos, frustrações, ansiedades, paixões...
A emoção ‘fake’ produz emoção genuína – e a gente rompe o escudo adotado no dia a dia para suportar as aflições vida.
Após acompanhar o sofrimento emocional de Dudas e Adrianas da teledramaturgia, milhões de brasileiros vão dormir mais conectados com os próprios sentimentos.
Esse é um dos poderes da televisão: mexer profundamente com as pessoas.
A dureza do cotidiano nos faz agir mecanicamente, já a novela estimula nossa passionalidade e relembra o quanto somos humanamente frágeis.