"Acho que fiz as pazes com a crítica", diz autor de Império

Aguinaldo Silva fala sobre a atual trama das nove e afirma que 'Senhora do Destino' salvou sua carreira do marasmo

21 out 2014 - 15h03
(atualizado às 15h22)
Aguinaldo Silva é autor de 'Império'
Aguinaldo Silva é autor de 'Império'
Foto: Jorge Rodrigues Jorge/Carta Z Notícias / TV Press

Reinventar-se foi a maneira que Aguinaldo Silva encontrou para continuar escrevendo. Sem nunca ter experimentado criar novelas em outro horário que não seja o das nove, a modéstia, falsa ou não, passa longe do discurso do autor. "Se pegarem as novelas de maior audiência de 1985 até aqui, meu nome está nos créditos da maioria", valoriza.

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No entanto, ao analisar seus 35 anos dedicados à teledramaturgia, Aguinaldo assume suas fraquezas e comemora o "renascimento" de sua carreira como autor com Império , sua 15ª novela. "Gosto do realismo que essa novela exibe. Já tive várias fases na carreira. O medo de continuar me repetindo quase fez com que eu perdesse a vontade de escrever", conta o autor pernambucano de 71 anos.

De formação jornalística, Aguinaldo começou sua carreira na Globo em 1979, em seriados e minisséries como Plantão de Polícia  e Bandidos da Falange . Pouco tempo depois, estrearia em novelas, assinando com Glória Perez a pouco lembrada Partido Alto , de 1984. Na mesma década, ele começaria a conhecer o gosto do sucesso ao participar da criação das clássicas Roque Santeiro , Vale Tudo  e, sobretudo, Tieta , onde pôde desenvolver uma assinatura totalmente sua.

Ao criar verdadeiras crônicas nacionais ambientadas em fictícias cidades nordestinas, Aguinaldo apresentou ao público obras como Pedra Sobre Pedra  e Fera Ferida . "O Nordeste sempre fará parte das minhas histórias. Mas precisei seguir em frente e criar de forma diferente", conta.

A partir de 2004, ciente de que teria de mudar a rota de suas tramas, Aguinaldo concebeu Senhora do Destino , um de seus maiores sucessos. Para em seguida, criar um exercício de ambiguidade em Duas Caras , de 2007. "Em essência, acho que sou o grande defensor dos 'novelões' clássicos. Em 'Império', tento novamente unir os arquétipos folhetinescos à minha visão contemporânea", diz.

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Império  teve boa audiência inicial, mas perdeu muitos pontos no Ibope por conta do horário político. Como você trabalha para reverter a situação?

A novela já está implementada. O público conhece e gosta do que vê em cena. Mas fica difícil com a propaganda eleitoral levando a audiência a menos de 15 pontos. Império  dá audiência e foi uma aposta segura da Globo. A direção sabia que iria precisar de um produto forte para não perder tanto público em seu horário mais nobre. A novela consegue dobrar o número de espectadores ao entrar no ar e se mantém na liderança. Agora é hora de crescer um pouco mais.

Como assim?

É preciso avançar sempre. Vou dar aquela boa e velha sacudida na trama. Novos casais vão se formar, novos dramas serão desenvolvidos. E a partir daí, surgem outros ganchos. Mas nada que mude substancialmente a trama. Além de ter uma resposta de público muito boa, em Império , acho que fiz as pazes com a crítica. Veículos que, geralmente, denigrem meus trabalhos, falam muito bem da novela e do protagonista interpretado pelo (Alexandre) Nero.

Você já utilizou muito bem a história do homem ambíguo que vence na vida com o Ferraço de Duas Caras . O que o levou a retomar esse arquétipo com José Alfredo?

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Queria fugir do maniqueísmo, o Ferraço era um vilão que se humanizava. O José Alfredo é do tipo que soube aproveitar as oportunidades que apareceram. Se ele fez coisas boas ou não, isso não está em julgamento. Queria mostrar um personagem excêntrico, exagerado. Mas que, mesmo assim, ainda fosse palatável. E mesmo com seu humor corrosivo e gênio forte, é um tipo muito cativante. Isso se deve também ao desempenho do Nero.

Nero foi um dos destaques de sua última novela, Fina Estampa . Ao final da trama você já tinha o interesse de vê-lo como protagonista?

Foi uma crescente. Toda vez que termino um trabalho, a última coisa que penso é no seguinte. Mas gostei do Nero como Baltazar e da "dobradinha" com o (Marcelo) Serrado. Ele é um ator que sabe administrar tipos fortes. Como era disso que eu precisava, quando comecei a pensar em Império , fiz logo a reserva. Pois hoje, na Globo, todos querem trabalhar com ele. Gosto dos tons que ele empresta ao personagem.

De seus trabalhos recentes, Império  surge como uma das tramas mais naturalistas e densas de sua carreira. O que o levou a desenvolver um trabalho, digamos, mais sóbrio?

Meu texto continua igual e com as mesmas marcações. O que difere mesmo é o tom mais melodramático da história. Desde que comecei a falar de Império  que utilizo a palavra "novelão". E é exatamente isso que define a novela. Mas não é um "velho" "novelão". Respeito as bases tradicionais, mas insiro muitos elementos contemporâneos.

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Quais, por exemplo?

Discutir as novas famílias é um deles. Desde o patriarca homossexual, ao garoto que é acolhido por um transexual, passando pela família que só falta vender os filhos para não ter de trabalhar. O tom melodramático está em cena, mas as sequências refletem bem o meu olhar atual sobre o mundo. É muito chato escrever sempre sobre as mesmas coisas. Eu passei muito tempo utilizando os mesmos recursos de forma eficaz. Hoje, prefiro experimentar, mudar e testar outras ferramentas. Buscar a audiência de outras formas. Só assim a vida de um novelista se torna mais saudável (risos).

Voltar às tramas ambientadas no Nordeste, então, está fora de cogitação para você?

Não vou dizer nunca. Mas acho bem difícil. Minhas novelas sempre terão um pé no Nordeste. É minha referência de vida. No entanto, foi um processo muito cansativo e difícil de sair. Lembro que escrever Porto dos Milagres  foi muito complicado. Tinha o melhor elenco e produção em mãos, mas não estava mais feliz fazendo aquilo, sentia que eu estava o tempo todo me repetindo. A novela era um sucesso, tudo funcionava, mas eu não estava contente. Aí vi que era hora de parar ou de ir por outro caminho. A ideia era mesmo parar e ir fazer outra coisa, séries, por exemplo.

Até que você teve a ideia de Senhora do Destino ?

Isso mesmo. Foi a novela que salvou a minha carreira do marasmo e me deu um prestígio imenso. É a maior audiência dos últimos 14 anos e vai continuar fazendo sucesso. A partir daí, fui mesmo trilhando por outros lugares, mais atento ao contemporâneo e delineando meus personagens por um senso maior de realidade. Talvez, Império  seja uma outra guinada em direção a um naturalismo ainda mais forte.

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Você acha que o trabalho do Rogério Gomes na direção evidencia essa mudança em sua obra?

Sem dúvida. Ele é um diretor mais denso. Antes de escolhê-lo para o posto, dei uma olhada em outras tramas dirigidas por ele e gostei muito da estética que ele utiliza e do jeito como trabalha a direção de atores.

Sob o núcleo do Wolf Maya, você fez trabalhos importantes como Senhora do Destino  e Duas Caras , mas foi uma opção sua não ter o diretor à frente de Império . O que aconteceu?

Sempre serei um grande admirador do Wolf. Mas relação entre autor e diretor é que nem casamento. Uma hora desgasta e é melhor fazer outras coisas. Não gostei do tratamento dado por ele em Fina Estampa . Imaginei um outro final para a trama e, quando assisti na tevê, fiquei surpreso. Entramos na rotina do casamento. Aí, vi alguns trabalhos do Rogério, gostei e o escolhi para Império .

Seja por temer a classificação indicativa ou por questões institucionais, a Globo vem cortando cenas de Império . Como você lida com essa interferência?

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Vejo com respeito. Até porque a Globo é a verdadeira dona da obra, é quem a exibe e tem o direito de fazer o que quiser. Às vezes, a direção implica com coisas bobas, mas é preciso seguir a ordem. Tenho um olhar muito crítico sobre o meu trabalho. Quando me sento para escrever, penso mesmo na massa de 40 milhões de pessoas que assistem ao produto. Não quero desrespeitar o público que me prestigia. Portanto, é preciso escrever com responsabilidade.

Império  – Globo – De segunda a sábado, às 21h15.

Perversidade feminina

Aguinaldo Silva até gosta das mocinhas, mas se diverte e fica na lembrança do público pelas vilãs que concebeu ao longo da carreira. De suas tramas nordestinas, Perpétua, de Joana Fomm em Tieta , e Altiva, de Eva Wilma em A Indomada , são dois bons exemplos do talento de Aguinaldo para criar mulheres tresloucadas bem ao gosto do telespectador. "As vilãs movimentam a trama. É muito fácil escrever para elas. É onde jogo os impropérios que penso, vejo e ouço", conta.

De todas as maléficas personagens que saíram de sua cabeça, uma tem lugar especial na lembrança do autor e na memória afetiva de quem assiste a suas obras: Nazaré, interpretada por Renata Sorrah em Senhora do Destino , de 2004. Para Aguinaldo, embora nem seja sua vilã mais ardilosa, Nazaré é a personagem que mais retrata o lado amoral do seu humano. "Ela era doente pelo poder, mas sucumbia a sua própria decadência. É uma personagem carregada de uma forte ironia. Até hoje é muito comentada", exalta.

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Outros caminhos

Antes de Império , Aguinaldo Silva estava com tudo pronto para levar ao ar o seriado Doctor Pri , protagonizado por Glória Pires. O próprio autor afirma que investir mais em formatos curtos é um de seus objetivos na tevê. No entanto, seu contrato atual com a Globo ainda prevê mais dois folhetins. "Espero estar vivo para cumprir esse contrato. Mas realmente quero ter mais possibilidades de formato e não ficar na fila das 'nove'", assume. Aguinaldo torce para que o projeto de Doctor Pri  seja retomado pela Globo no futuro. Ele só não abre mão de ter Glória Pires como protagonista. "Ela já tinha aceitado o convite, mas também estará na novela do Gilberto (Braga). Ele sempre tem prioridade para escalar a Glória. Eu fico na torcida para que o seriado saia do papel", explica.

Trajetória televisiva:

# Plantão de Polícia  (Globo, 1979) - Autor

# Lampião e Maria Bonita  (Globo, 1982) - Autor

# Bandidos da Falange  (Globo, 1983) - Autor

# Padre Cícero  (Globo, 1984) - Autor

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# Partido Alto  (Globo, 1984) - Autor

# Tenda dos Milagres  (Globo, 1985) - Autor

# Roque Santeiro  (Globo, 1985) - Autor

# Vale Tudo  (Globo, 1988) - Coautor

# Tieta  (Globo, 1989) - Coautor

# Riacho Doce  (Globo, 1990) - Autor

# Pedra Sobre Pedra  (Globo, 1992) - Autor

# Fera Ferida  (Globo, 1993) - Autor

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# A Indomada  (Globo, 1997) - Autor

# A Justiceira  (Globo, 1997) - Autor

# Suave Veneno  (Globo, 1999) - Autor

# Porto dos Milagres  (Globo, 2001) - Autor

# Senhora do Destino  (Globo, 2004) - Autor

# Duas Caras  (Globo, 2007) - Autor

# Cinquentinha  (Globo, 2009) - Autor

# Lara com Z  (Globo, 2011) - Autor

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# Fina Estampa  (Globo, 2011) - Autor

# Império  (Globo, 2014) - Autor

Foto: Divulgação

José Mayer em Bandidos da Falange (1983)

Foto: Divulgação

Ary Fontoura, Betty Faria, José de Abreu e Arlete Salles em Tieta (1989)

Foto: Divulgação

Giulia Gam e Edson Celulari em Fera Ferida (1993)

Foto: Divulgação

Adriana Esteves e Eva Wilma em A Indomada (1997)

Foto: Divulgação

Camila Pitanga, Marcos Palmeira e Flávia Alessandra em Porto dos Milagres (2001)

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Renata Sorrah, a Nazaré de Senhora do Destino (2004)

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Foto: Divulgação

Dalton Vigh, Marjorie Estiano e Gabriel Sequeira em Duas Caras (2007)

Foto: Divulgação

Christiane Torloni e Marcelo Serrado em Fina Estampa (2011)

Foto: Divulgação

Alexandre Nero em Império (2014)

Fotos: Divulgação

Fonte: TV Press
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