O telejornalismo precisa abordar seriamente a suposta depressão de Bolsonaro

Transformar em pauta a saúde mental do presidente pode ajudar milhões de brasileiros em sofrimento

3 dez 2022 - 11h43
(atualizado às 11h47)

"Bolsonaro está depressivo, deprimido."

O comentário foi feito pela comentarista de política Natuza Nery ao âncora César Tralli no 'Edição das 18h', da GloboNews.

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Em outros canais, o estado emocional do presidente da República também gerou observações, assim como em alguns sites de notícias.

Para os poucos jornalistas que falam sobre o assunto, Bolsonaro está profundamente abatido em consequência da derrota para Lula na eleição.

No Telegram, o filho número 02, Carlos Bolsonaro, alimentou a suspeita de que o presidente vive um momento de fragilidade emocional em seu autoexílio no Palácio da Alvorada.

“Estive com meu pai... Inclusive dormimos no mesmo quarto, ou melhor, não dormimos. E digo que sei interpretar grande parte de seu comportamento. Papel de filho e amigo. Estarei sempre aqui.”

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O telejornalismo deveria abordar a questão com a profundidade que ela merece e exige. Trata-se da saúde mental do homem que ocupa o cargo mais importante do País.

Os jornalistas que cobrem os bastidores de Brasília prestariam um serviço à sociedade se falassem abertamente sobre a questão, ainda prejudicada pelo preconceito.

De acordo com uma pesquisa do Ministério da Saúde, 11,3% dos brasileiros foram diagnosticados com depressão por algum médico. Ou seja, 24,2 milhões de pessoas.

Some-se a elas um número relevante de homens e mulheres que, fora das estatísticas, sofrem em silêncio sem suporte psiquiátrico e psicológico.

Anteriormente à pandemia de covid-19, o Brasil já vivia uma epidemia de transtornos emocionais como depressão e ansiedade.

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A mídia em geral — e especialmente a televisão, com seu inigualável poder de influência — falha ao não dar o necessário espaço ao tema.

A equação é simples: quanto mais informações, mais pessoas vão buscar ajuda especializada para tratar os sintomas que afetam a qualidade de vida.

Teoricamente, a depressão afeta mais mulheres do que homens. Na prática, eles são dominados pelo medo de ser vistos como fracos e não pedem socorro.

O machismo leva, muitas vezes, a um desfecho lamentável. Relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), de 2019, indicou que no Brasil os homens representam 76% dos casos de suicídio.

Nas duas aparições em compromissos oficiais após o 2º turno, Jair Bolsonaro não conseguiu disfarçar a tristeza. Parecia anestesiado, definitivamente infeliz.

Debater a saúde mental do presidente não seria invasão de privacidade, desde que feito com respeito e o auxílio de profissionais capacitados.

Não é aceitável palpitar, como tantos jornalistas fazem, e sim dar voz a quem está efetivamente habilitado a cuidar das dores da alma.

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Bolsonaro em ato público no dia 1º: tristeza flagrada por câmeras de fotógrados e cinegrafistas
Bolsonaro em ato público no dia 1º: tristeza flagrada por câmeras de fotógrados e cinegrafistas
Foto: Estevam Costa/Presidência da República

O Sala de TV conversou com o psicólogo Alexander Bez a respeito.

É possível afirmar que Jair Bolsonaro sofre de depressão?

A priori, poderia até significar um quadro depressivo, mas é muito difícil afirmar porque há outras variáveis envolvidas. Vale ressaltar que as questões de recolhimento podem ser manifestadas também por fatores externos não aceitáveis, criando uma manifestação sugestiva depressiva de caráter exclusivamente exógeno. Nesse sentido, passageira. Pessoas depressivas não são habitualmente ativas e o presidente é ativo, demonstrando isso em diversas ocasiões. Quadros como o dele envolvem muitas hipóteses diagnósticas. Pode haver tristeza? Sim, pode. Ela pode estar relacionada à derrota? Pode, também. Há frustração? Sim, isso há, mas, particularmente, eu não analiso essa frustração apenas em relação ao resultado da eleição.

Por que não?

A derrota faz parte de qualquer jogo democrático. A frustração do presidente parece mais ampla do que não ter conseguido se reeleger. Como é um caso atípico em que há muitas circunstâncias envolvidas, fica difícil afirmar que se trata do quadro moldado pelo Transtorno Depressivo Maior. Contudo, não faltaram estímulos externos para que Bolsonaro desenvolvesse alguma manifestação depressiva clássica ao longo desses quatro anos. Tem pessoas que possuem baixos índices de tolerância à frustração em qualquer representação que apareça.

Saúde mental de Bolsonaro precisaria ser avaliada antes de se falar em depressão clássica, diz o psicólogo Alexander Bez
Foto: Divulgação

É um indicativo de transtorno emocional?

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Seria muito leviano da minha parte afirmar sem conhecer clinicamente o paciente, independentemente de quem seja, de que há alguma psicopatologia instalada em seu aparelho mental. Para o profissional conhecer o real estado da pessoa analisada são necessários meses de avaliação. Para se traçar um diagnóstico de depressão clássica, é imprescindível ter contato clínico semanal com o paciente, de 6 e 8 meses de atendimento. Qualquer ação diferente dessa não pode ser indicativa precisa de diagnóstico. No caso, recorremos às hipóteses diagnósticas.

A imprensa deve falar abertamente sobre a saúde mental do presidente da República?

Qualquer indicação comprovadamente científica de que há um transtorno mental sempre pode servir de exemplo. Todos estamos suscetíveis a isso, famosos ou anônimos. Títulos e graduações não conferem imunidades psicológicas a ninguém. Quando uma pessoa famosa apresenta um diagnóstico clínico elaborado por um profissional habilitado, serve de exemplo para que a população em geral também busque auxílio. Ressalto que, não só no caso do presidente Bolsonaro, mas em qualquer situação envolvendo personalidade de mídia, o respeito à privacidade é sempre a melhor opção até que a pessoa se manifeste sobre a reclusão.

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