O capítulo de terça-feira (20) do folhetim das 21h da Globo ofereceu ao telespectador a qualidade dramatúrgica que se espera de uma grande novela.
Os principais atores envolvidos na sequência do julgamento do delegado pedófilo tiveram desempenho irretocável em seus monólogos.
Sandra Corveloni finalmente recebeu um papel na TV condizente com seu talento, já reconhecido internacionalmente com o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Cinema de Cannes, em 2008, pelo filme ‘Linha de Passe’.
Sua personagem em ‘O Outro Lado do Paraíso’, Lorena, enfim encarou a realidade, assumiu ter sido omissa em relação ao abuso praticado pelo marido, Vinícius (Flávio Tolezani), e pediu perdão à filha, Laura (Bella Piero).
A atriz já tinha atingido performances interessantes durante o período de negação de Lorena. A dondoca exibiu um cinismo típico de vilãs ao apoiar o ‘homem perfeito’ que imaginava ter ao seu lado.
Na sequência de depoimento no tribunal, Corveloni foi além: atuação notável ao expurgar a fúria materna e a decepção como mulher e esposa de quem percebe ter se casado com “um monstro”.
O texto verossímil ainda teve um alerta oportuno ao se falar de pedofilia no horário nobre da TV.
“O perigo pode estar bem próximo, pode estar do seu lado. Pode ser alguém da sua família, alguém que ninguém desconfia. Alguém que você ama”, alertou a desiludida Lorena.
Estatísticas oficiais indicam que 70% das vítimas de abuso sexual no Brasil são crianças e adolescentes. A maioria dos abusadores é formada por pessoas próximas (parentes, vizinhos e amigos da família).
Ao sentar no banco dos réus, Vinícius tirou a máscara e confessou seu crime hediondo. Mais do que isso: admitiu o desprezo pela mulher mais velha e “cafona”, e a obsessão doentia pela enteada.
Ator com forte presença na cena teatral de São Paulo, Flávio Tolezani também conseguiu em ‘O Outro Lado do Paraíso’ a grande chance de exercitar plenamente sua arte diante das câmeras.
A outra ponta do triângulo dramático, Laura, rendeu a Bella Piero incontáveis elogios por seu trabalho na novela.
A jovem atriz mostrou impressionante maturidade artística nas inúmeras cenas de desespero emocional de sua personagem.
O desenrolar da trama de abuso sexual conseguiu ofuscar a polêmica suscitada pela ação de merchandising de uma escola de coaching.
A controvérsia quase comprometeu o marketing social do enredo de pedofilia intrafamiliar. No fim, a arte e a relevância da discussão sobrepuseram a questão comercial.