Camiseta de banda e piadinhas: a Globo quer ser a MTV?

Com a cintura dura, emissora tenta se renovar, mas falta de gingado breca evolução na audiência

13 mai 2015 - 11h24
(atualizado às 12h36)

Quem costuma acompanhar a programação da Rede Globo - ou seja, a imensa maioria dos brasileiros - já deve ter percebido certas mudanças gradativas no comportamento da emissora e de seus profissionais. Mais jovem, a empresa aposentou alguns elementos tradicionais de sua trajetória, levantou da bancada e tentou entrar no ritmo do processo de "MTVização" de seu estilo. Pena que falta gingado. 

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Maior canal de comunicação entre os jovens no fim do século passado, a MTV Brasil inciou suas atividades em 1990 e ganhou fama por algo muito mais simples que exibição de clipes e Beija Sapo: eram gente como a gente, falavam como a gente, e poderiam muito bem ser vistos no boteco da esquina tomando uma cerveja na mesa ao lado.

No caso da Globo, a mudança mais notada aconteceu no Jornal NacionalNo ar desde 1969, o maior telejornal do Brasil sempre foi apresentado por dois jornalistas, sentados, sérios, quase imóveis, lado a lado. Na época, Cid Moreira e Sérgio Chapelin inauguravam a modelidade "leitor de teleprompter", famosa nos Estados Unidos, na televisão brasileira. Agora, a atração é apresentada de diversas maneiras. William Bonner e Renata Vasconcellos levantam, conversam com repórteres, dão opinião, enfim. Um verdadeiro show de improvisação ao vivo e em rede nacional. 

Jornal Nacional radicalizou com mudança editorial
Jornal Nacional radicalizou com mudança editorial
Foto: TV Globo / Divulgação

Além disso, veio a adoção da câmera nervosa, jargão utilizado para classificar o estilo de filmagem em movimento sem tripé. Ou seja, a imagem fica animada, ganha vida e se aproxima do registro amador, um dos trunfos da comunicação nos dias de hoje. Tudo isso é ótimo, aliás, mas há um problema. 

A doutrina global de transformar âncoras em verdadeiros robôs sem expressão existe há décadas, e isso não se perde de repente. Rodrigo Bocardi e César Tralli são exemplos claros de que não é tão simples encontrar um meio termo para conquistar ambos os lados do público. Para ser direto: eles estão longe de parecer "gente como a gente". Ou você imagina Tralli, Bocardi e Bonner tomando uma cerveja na mesa ao lado do boteco pé sujo que você frequenta com seus amigos?

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César Tralli é apresentador do SPTV em São Paulo
Foto: TV Globo / Divulgação

Dono absoluto do SPTV, Tralli está na Globo desde 1993. Acostumado com o jornalismo elitizado, o líder da sucursal paulistana agora tenta atuar de maneira mais descontraída, simplificada. No entanto, a postura de boneco de Olinda, as frases de efeito completamente montadas e o visível desconforto com a nova linha editorial fazem com que ele se pareça com aquele chefe isolado que, de repente, tenta virar amigo do setor inteiro. Até seu sorriso aparenta desconforto. E utilizar estigmas ultrapassados como "dona de casa" e "amigo trabalhador" não ajudam nem um pouco. 

No caso de Bocardi, a descontração lhe parece mais natural. O problema é que, no fundo, o ex-correspondente de Nova York comete o mesmo erro de Tralli: parecer totalmente artificial com a postura que deve assumir. A falta de diálogo com o grande público faz com que o jornalista, ex-editor de economia de O Globo, fique com um semblante um pouco falso, com expressões vazias, meio como um político em época de eleição. Nem todos são Chico Pinheiro.

Rodrigo Bocardi veio de Nova York direto para o 'Bom Dia São Paulo'
Foto: TV Globo / Divulgação

Boletim do G1 e Tiago Leifert: os erros e acertos do jornalismo moleque 

O novo boletim do G1 é um acerto do jornalismo da Globo. Com G1 em 1 Minuto, aproximando TV e internet, a emissora dá sinais de que entendeu que os meios de comunicação não devem ser rivais, mas sim parceiros. Os jovens Mari Palma e Cauê Fabiano, com camisetas de banda e jeitinho meio nerd, meio hipster, mostram que, para ser sério, não precisa de terno e gravata e, para ser descontraído, não precisa deixar ninguém constrangido com piadinhas de titio.

Cauê Fabiano e Mari Palma apresentam o boletim 'G1 em 1 Minuto'
Foto: TV Globo / Divulgação

Já Tiago Leifert, um dos primeiros a servir como experiência para o modelo, segue o mesmo, com observações brincalhonas e jeitão de rapaz boa praça. O problema é que, especialmente no esporte, a Globo tem certos "pontos sem nó", o que torna o apresentador, muitas vezes, um alvo de torcedores e espectadores em geral, especialmente quando Leifert tenta opinar sobre horários de jogos, estádios vazios e calendário ruim do futebol nacional, uma vez que sua empregadora é apontada como uma das principais responsáveis por tudo isso. 

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Nesse sentido, Fernanda Gentil se supera. Bela, animada, divertida, Gentil dribla facilmente qualquer gafe, sua ou não, e consegue conquistar o público do esporte - e de fora dele - sem fazer muito esforço. O carisma é natural, leve, agrada. 

Carisma natural aproximou Fernanda Gentil do público
Foto: TV Globo / Divulgação

Faustão, Caldeirão, Estrelas, BBB: chegou a hora de mexer nos queridinhos 

Se é para renovar, então renova de uma vez. No campo do entretenimento, a maior emissora do Brasil segue devendo. No sábado, a dobradinha Estrelas Caldeirão do Huck, do casal Angélica e Luciano, é líder de audiência, mas muito mais por incompetência dos adversários do que qualquer coisa. As atrações, nos melhores dias, marcam por volta de 15 pontos nos grandes centros, e superam de longe o segundo colocado, Programa do Raul Gilcom 4,5. 

Mesmo assim, ambos são cada vez mais criticados. O talk show de Angélica não tem sentido algum e mais parece um espaço feito para celebridades mostrarem como são ricas, chiques e, por isso, cheias de motivos para sorrir, algo muito distante da realidade da maioria de nós. Já o Caldeirão se apega aos mesmos quadros de sempre, com um Luciano queimado por tropeços na web e com a mesma linha de atuação da época do Programa H

Preta Gil resolveu fazer seu chá de cozinha no 'Estrelas', programa feito para celebridades ostentarem a vida mansa
Foto: TV Globo / Divulgação

E é aí que entra o BBB. Amado e odiado pelo Brasil inteiro, o reality segura cada vez menos público, e tem audiência instável na casa dos 20 pontos no horário nobre. Muito pouco. Sem novidades, sem emoção, o trunfo de Boninho se arrasta em suas últimas edições, e seus chefes parecem não ter a menor intenção em arriscar alguma mudança. 

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Na dramaturgia, Malhação muda, avança, mas não sai do lugar. A temporada atual tem a melhor audiência em dois anos, mas está longe de seus anos dourados. Enquanto isso, a chefe Babilônia agoniza. A ousada trama de Gilberto Braga já foi freada. Alice, que era prostituta, virou mocinha. Beatriz foi de ninfomaníaca para apaixonada pelo amante, e o personagem de Marcos Pasquim, que entraria como gay enrustido, sabe-se lá como, vai virar galã veterano.

No meio do caminho entre o conservadorismo e a modernização, a Globo se divide em duas, colocando em conflito uma intenção em arriscar com a bajulação aos "queridinhos" da casa e velhos costumes. Diferente da MTV, o canal tem medo da rejeição e, por isso, acaba parecendo um ex-galã que tenta reviver os anos dourados paquerando as amigas do filho. 

Fonte: Terra
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