Quanto o assunto é prazer íntimo, as palavras parecem ser mais potencialmente chocantes do que as imagens. Pelo menos na televisão. Dois episódios curiosos sobre masturbação feminina levam a essa conclusão.
No capítulo de quarta-feira (24) de 'Um Lugar ao Sol', a ex-modelo Rebeca (Andréa Beltrão) se masturba na cama. A cena, ainda que não explícita, mexeu com as redes sociais: provocou choque, críticas, elogios, memes.
No geral, a repercussão da sequência foi positiva e fez bem à novela das 21h, que está com audiência baixa e sem engajamento relevante na internet. A autora Lícia Manzo ganhou aplausos por abordar temática ainda vista como tabu.
Mas a postura liberal da Globo não é vista no canal Viva, que também pertence à família Marinho. Estranhamente, um depoimento sobre masturbação feminina de uma senhora foi cortado da versão on-line de 'Páginas da Vida', que está sendo reprisada no canal pago desde segunda-feira (22).
A novela de 2006 trazia ao final de cada capítulo uma pessoa anônima a falar sobre algum aspecto importante de sua vida. No caso, dona Nelly da Conceição revelou ter tido orgasmo pela primeira vez somente aos 45 anos, sozinha.
"Botei na vitrola a música 'Côncavo e Convexo' (de Roberto Carlos) e fui dormir. Quando acordei, estava com a perna suspensa, a calcinha na mão e toda babada. Comentei com as amigas, elas disseram: 'Você gozou'. Aí é que vim saber o que era gozo. Moral da história: sou uma mulher de 68 anos, que homem pra mim não faz falta, eu mesma dou meu jeito", contou à câmera.
O relato sincero causou alvoroço. Nunca antes os telespectadores tinham assistido a algo parecido. O autor Manoel Carlos chegou a pedir desculpas e disse que algumas palavras poderiam ter sido cortadas na edição para amenizar a descrição minuciosa do ato íntimo.
Dias depois, dona Nelly disse em entrevista ter sido prejudicada pela exibição. Perdeu o emprego de babá e ficou com contas atrasadas. Ela reclamou por ter falado por 1 hora com a equipe e a Globo só ter usado o trecho sobre masturbação. Chegou a processar a emissora.
Alguém no Viva acredita que o depoimento de 15 anos atrás continua polêmico e ofensivo a uma parte do público. Não está errado. A sociedade brasileira continua puritana – ou falsamente pudorosa, se o leitor preferir.
Entretanto, um dos papéis da televisão, enquanto mais influente veículo de massa, é justamente lançar temas polêmicos à discussão. Assiste quem quer, opina quem quer.