Uma das maneiras de o ser humano forjar a imortalidade é deixar uma declaração brilhante a respeito de algo. Beatriz Segall marcou seu nome na história da arte dramática não apenas com atuações memoráveis, mas também com frases inspiradoras.
A atriz não se sentia muito confortável em entrevistas. Mesmo assim, sempre presenteava o interlocutor e o público com sua inteligência e visão apurada de mundo. Aconteceu quando ficou frente a frente com Antônio Abujamra no programa ‘Provocações’, da TV Cultura.
O episódio exibido originalmente em 2014 teve um trecho viralizado nas redes sociais nos últimos dias. Nele, a atriz comenta uma anomalia no universo artístico. “Quando a gente começou, os atores tinham uma preocupação enorme em se formar, em se informar, em ler, aprender, ver o que estava acontecendo fora, tentar fazer um teatro brasileiro”, diz.
“Hoje em dia não há mais essa preocupação. A preocupação maior, eu acho, é aparecer na televisão. Porque é muito fácil, você vai para a televisão e 15 dias depois você é celebridade. Eu acho isso tão engraçado, chamar alguém de celebridade porque está trabalhando na televisão, fazendo um papelzinho.”
Sábias palavras. Na sociedade midiática na qual vivemos, ser anônimo é quase um defeito. Há verdadeira obsessão em ‘virar’ famoso o mais rápido possível para conquistar tratamento privilegiado, sentir-se superior aos demais e ter a tão desejada sensação de pertencimento. A fama seria, sob essa visão deturpada, antídoto contra uma existência desimportante.
Existe também o interesse financeiro. Aparecer na TV possibilita ganhar bons cachês com publicidade e a tal ‘presença VIP’ em eventos. Crítico feroz da televisão, o diretor de teatro Antunes Filho dizia, com seu peculiar humor ácido, que atores com boa formação se prestavam a fazer novelas só pelo interesse em ter dinheiro para comprar eletrodomésticos caros.
Imortalizada pelo papel da vilã Odete Roitman em ‘Vale Tudo’ (1988), Beatriz Segall buscou sólida formação acadêmica. Bolsista, estudou teatro e literatura em Paris. Foi para a TV apenas aos 30 anos, quando já era respeitada no meio teatral. Sempre rejeitou o rótulo de celebridade e manteve a vida blindada contra a invasão de privacidade.
Será sempre lembrada por seu talento e seus personagens, não por questões íntimas superexpostas, como fazem atualmente tantos atores exibicionistas e famosos de ocasião movidos por mero oportunismo. A atriz morreu em setembro de 2018, aos 92 anos.