Não é fácil encontrar uma casa que seja tão milimetricamente o retrato de seu dono. Neste caso, encontrei. Mas a casa é um apartamento. E o dono é uma dona: Costanza Pascolato mora num cenário de filme italiano que em tudo combina com seu jeito de ser, de estar e de se mostrar ao mundo.
Entrar no seu cosmos particular é viver em meio a móveis de família vindos da Europa há muitas décadas, quando seus antepassados italianos chegaram aqui com quadros importantes, objetos e antiguidades, além de muitos livros. As paredes têm cores fortes: seja um vermelho intenso na sala principal, um dourado em uma das paredes da sala de jantar ou um verde claro no seu escritório-biblioteca, tudo é intenso e tem história. Aqui e ali, alguns toques de modernidade — como uma luminária de teto dourada de Ingo Maurer, logo no hall de entrada.
Em um passeio pelas salas de sua casa, uma hora ela cita os quadros importantíssimos que pertencem à família desde séculos passados, de artistas italianos. Conta também dos potes de cerâmica originais que enfeitam uma pequena estante e que traziam especiarias do Oriente para a Europa, em um relato cheio de detalhes. A amiga Marilu Beer, que já morreu, é muito citada na conversa, por ter participado ativamente na renovação da decoração, na escolha das cores e em outros detalhes. Ao redor do apartamento, as árvores do bairro, muitas, verdes e frondosas, são emolduradas pelas janelas amplas.
As frases que Costanza diz, segundo ela mesma, têm a sabedoria de sua mãe e sua avó, mulheres à frente de seu tempo
Assim é Costanza, uma mulher cheia de histórias, uma vida muito bem vivida e anéis de caveira imensos nos dedos — segundo ela, inspirada por seus netos. Ela fala muito das duas filhas, Consuelo, que mora em Florença, e Alessandra, em São Paulo, dos netos que vivem espalhados pelo mundo, de Giulio Cattaneo, ex-marido, o segundo, por quem foi muito apaixonada e que morreu faz tempo, em 1990. Fala também com carinho do primeiro marido, Robert Blocker, pai das filhas, com quem ficou rompida durante muito tempo. Atualmente a família toda se encontra no final do ano em Florença, inclusive o pai das meninas, com quem ela diz estar se dando muito bem nos últimos tempos. Os movimentos são parecidos com os de muitas famílias. Com muito amor e afeto envolvidos, algumas dificuldades e a alegria que dá pra sentir nas histórias.
Moda como estilo de vida
Costanza sempre viveu, respirou e trabalhou com moda, fosse na tecelagem da família, em revistas ou dando consultorias. Ela continua a viajar como sempre várias vezes por ano, para acompanhar as temporadas de desfiles, tanto de alta costura quanto de prêt-à-porter. Sempre fez suas malas sozinha, separando os modelos escolhidos em uma arara para ter uma visão melhor do conjunto. Isso apesar de ter duas funcionárias de extrema confiança, Marisa e Cândida, que estão com ela há mais de 20 anos.
Explica que não usa apenas preto, como grande parte da turma da moda. Ela faz uso de modelos pretos, mas com casacos e outros vestidos com cores fortes, tudo num match perfeito, detalhadamente estudado. Se veste de uma maneira simples mas tremendamente sofisticada, misturando as melhores marcas do mundo com uma bolsa de nylon da Uniqlo, street fashion japonesa com lojas em boa parte do mundo, sugestão de sua neta — esse modelo específico vendeu mais de 6 milhões de bolsas e foi batizada de “Birkin dos millenials”, em homenagem à bolsa da Hermès, uma das mais caras e disputadas do mundo.
Desde os anos 80, a consultora já era essa referência que continua sendo até hoje. Mas preserva um tom de mistério: tudo que é explícito demais, segundo ela, enjoa
Quando se fala de moda, o nome que vem logo em sua cabeça como o principal de todos os tempos é Chanel, marca que ela reconhece como a mais icônica, a mais mítica. Um clássico, único. Seu conhecimento nesse assunto é profundo. Como ela vive tudo isso desde jovem, esse sempre foi seu universo e o principal tema dos muitos livros que tem e que consulta em seu espaço de trabalho, em casa.
Sem álcool e comendo bem
Como não bebe álcool nenhum desde seus tempos de juventude e come pouquinho, tem um corpo super esguio. Confessa que em vez de pratos rebuscados, gosta sobretudo de bons ingredientes, seja em um pequeno restaurante de frutos do mar em Florença, seja num prato com toques brasileirinhos no Carlota, perto de sua casa. Para manter o corpo com uma certa agilidade, faz pilates desde sempre. No momento, padece de dores bem chatas por conta de uma cirurgia nos quadris. Mas nada a impede de manter uma vida social bem fervida, cumprir compromissos e participar ativamente dos eventos mais relevantes de seu mundo.
E quando o assunto chega no amor…ah, como Costanza pode ser engraçada e irônica! Apesar de casada algumas vezes, ela diz que nada aprendeu com os maridos. Cheia de humor e com olhar crítico sobre o casamento, consumo, comunicação nos dias de hoje e o mundo. Uma mulher sábia.
Além dos dois maridos já citados, Costanza também foi casada com o crítico e compositor Nelson Motta. Ela mesma comenta que os dois eram muito diferentes e que a relação só durou esse tempo porque ele morava naquela época em Nova York e ela em São Paulo.
Quanto à religião, ela diz que acredita em Deus — mas o Deus de Spinoza, o filósofo, morto em 1677. Reforça que sua família nunca foi religiosa. Seus pais, pessoas cultas, de muita leitura. Até a governanta suíça, Blanche, teve seu lugar de importância. Foi ela que lhe apresentou Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir, por exemplo.
Mesmo dizendo que já foi o tempo da paixão em sua vida, dá para afirmar que Costanza continua apaixonante.
"Todas as fases da minha vida foram interessantes. Mas esse ano percebi que tenho 85 anos. Eu tinha esquecido disso."
Costanza sobre moda e estilo
"Uso uma bolsa de marca popular que comprei em Londres como um ligeiro esnobismo: todo mundo faz esforço para comprar um produto por conta do logo, mas o logo pode ser falso. Essa bolsa me foi apresentada pela minha neta e cabe tudo!"
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"O que acontece na moda é o que acontece em termos de comunicação. A internet fez com que a moda deixasse de ser elitizada. Cada grupo social tem um comportamento e esses nichos começaram a ter personalidade de moda que, acredito, no futuro vai se acentuar."
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"Ser elegante na moda é uma coisa. Qualquer um pode ser. Mas elegância como definição é uma certa estética que agrada a quase todo mundo e que é baseada na simplicidade. Isso também tem a ver com comportamento."