Débora Falabella detalha os desafios e o impacto de sua peça sobre violência contra a mulher

Com 'Prima Facie', ela arrebata o público gera reflexões sobre a situação de vulnerabilidade das mulheres

14 fev 2025 - 14h01
(atualizado em 26/2/2025 às 15h03)

Débora Falabella impressiona no palco nos primeiros minutos de 'Prima Facie'. Falas fortes e impactantes mostram como a advogada que ela interpreta derruba a promotoria no julgamento de homens acusados de violência sexual. O texto da australiana Suzie Miller incomoda quem já viveu de perto situações de agressão. Irônica, a atriz vai embrulhando o estômago do público ao mostrar a máquina da justiça moendo mulheres.

Prima Facie, a expressão, em latim, é usada para falar de uma evidência ou conjunto de fatos que, se não forem refutados, são suficientes para provar um argumento. À primeira vista, 'Prima Facie' parece ser um espetáculo sobre os meandros jurídicos. Não se trata disso, logo se percebe. É sobre seres humanos. E isso está fortemente ligado à maneira como a atriz vive de e para sua arte. “Eu estava à procura de um texto quando me lembrei desse espetáculo, que já tinha sido montado na Austrália e em Londres, e eu sabia sobre o assunto porque já tinha lido muito sobre ele”, conta. Os direitos já haviam sido vendidos, mas, coincidentemente, poucos dias depois, os produtores a convidaram para fazer o monólogo. Débora entrou como produtora e ficou apaixonada pelo projeto.

“Quando estamos diante de uma obra desse porte, já conseguimos imaginar o que ela vai causar. Cada vez que eu lia e relia, achava mais impressionante e pensava em como chegaria no público. Não é só uma peça sobre violência contra a mulher. É também. Mas é a história da vida de uma mulher que, no auge da sua vida social e profissional, é atropelada por essa violência”, diz.

"A dramaturgia de 'Prima Facie' é de uma excelência como poucas que eu já tinha lido. Fiquei identificada com a personagem e com a forma tão inteligente que essa história é contada e, por isso, quis montar o espetáculo."

A atriz tenta evitar os spoilers, mas afirma que há um momento na montagem que dói mais: “É impactante. A personagem vem de uma extrema felicidade, diversão. E o público está com ela, se divertindo também, mas, de repente, ela se vê à beira de um abismo. Nesse momento, a plateia fica em silêncio e mergulha com ela. Para mim, é muito emocionante”. Todo mundo se remexe na cadeira, desconfortável.

No espetáculo, citações aos aplicativos que norteiam a vida moderna fazem com que as pessoas se identifiquem com a personagem. Débora diz que sempre foi muito curiosa em relação à tecnologia e acredita que muitas coisas vieram para nos ajudar no dia a dia. Questiona, entretanto, se isso não nos tornou seres dependentes, que precisam ser mais eficientes, trabalhar mais horas que o necessário. A personagem trabalha demais, de fato. E a vida que tenta encaixar nos intervalos de descanso não é como ela esperava que fosse.

Cena da peça 'Prima Facie', com Débora Falabella
Cena da peça 'Prima Facie', com Débora Falabella
Foto: Divulgação

Cansada, emocionada e feliz

Passar uma hora e meia no palco, entretanto, não é das tarefas mais fáceis para a atriz. Débora se prepara durante a semana para estar bem fisicamente. No combo, se cuida, faz exercícios e a preparação de voz para ganhar resistência. “Tenho que estar bem para dizer aquele texto por 1h40 ininterruptamente. Uma verdadeira maratona”, revela.

Garante que sai do palco muito cansada, emocionada e feliz. “A personagem visceral fica com a gente. Não tem jeito. E isso é muito bonito na nossa profissão. Claro que precisamos de respiro, viver outras coisas durante um processo como esse. Mas o assunto e a personagem ficam sempre.”

E fica no público também. “Algumas mulheres mandam mensagens, se identificam com o texto, contam histórias que aconteceram com elas e isso me emociona muito. Acaba servindo como inspiração e força para seguir interpretando essa história.” Mas não são só mulheres que se comovem com a narrativa da peça. A atriz também tem recebido depoimentos de homens muito impactados.

A situação da mulher vítima de violência está longe de ser vista sob um prisma positivo. A maneira como a justiça ainda lida com abusos contra a mulher é muito cruel, diz Débora, apesar de hoje termos leis muito importantes que foram criadas, como a Maria da Penha. “Temos um caminho longo a percorrer. Estamos vendo mulheres denunciando, mas a maioria dos crimes não são notificados”, destaca. Outra bandeira importante levantada por Prima Facie é trazer os homens para essa conversa.

Mas não é só o debate sobre gênero que interessa a Débora nas obras em que atua. Desde que fez a série 'Aruanas', sobre ativismo ambiental, essa questão também se ampliou para ela. “É desesperador saber que nosso país está sendo queimado e pouca coisa sendo feita, poucas atitudes tomadas. Essa causa é urgente e precisamos, como sociedade, estar engajados, ensinando nossos filhos, dentro de nossas casas, e cobrar dos nossos governantes que atitudes sejam tomadas.”

Débora também está em cartaz com a peça 'Neste Mundo Louco, Nesta Noite Brilhante', uma parceria antiga com o texto de Silvia Gomez, sua amiga de BH. “O que ela escreve me causa muita identificação. É muito interessante trabalhar com textos contemporâneos, como os da Silvia e de Suzie Miller. Para mim, o texto é meu ponto de partida. E o grande desafio é se apropriar dele. A interferência está justamente na escolha, junto com a direção, em como vamos dar vida ao que foi escrito e imaginado pelo autor”.

Foto: Fábio Audi / Velvet

Discreta, sim; espontânea também

Nascida em Belo Horizonte, sua residência oficial é em São Paulo há décadas. Mas ela tem um apartamento no Rio, onde passa temporadas esporádicas para gravar novelas e fazer teatro. Nos palcos e nas telas, Débora dança com desenvoltura. “Fiz muitos trabalhos que tinham coreografias. Gosto disso e quando vou a uma festa que tenha uma pista, eu me divirto também. Mas, por incrível que pareça, é mais raro”, ela ri.

"O assunto da violência contra as mulheres está entalado nas nossas gargantas e é preciso que seja discutido em casa, na criação de nossos filhos, nas escolas e amplamente pela sociedade."

Um de seus preceitos básicos é preservar a rotina da família, escolhendo o que quer mostrar. A invasão da vida privada a incomoda, ela revela, em tempos em que as redes sociais expõem tudo com facilidade e qualquer limite parece um pouco borrado. Garante, entretanto, que faz coisas muito comuns, como todas as pessoas. “Me preservo, mas sou bem isso mesmo que as pessoas veem”, dá uma risadinha.

Aos 45 anos, se preocupa muito mais com a saúde do que no passado, se alimenta melhor e se exercita mais. “A maturidade me trouxe muitas coisas boas como o autoconhecimento, o autocuidado. Me sinto mais tranquila, mais aberta. Claro que ainda tem muita coisa pela frente. Mas essa fase que estou vivendo tem sido surpreendentemente interessante!”, diz.

Débora segue em cartaz até março de 2025. E deve filmar dois projetos que estão engatilhados no cinema. “Tem muita coisa que quero fazer e esse solo era um desafio. Existem personagens maravilhosos já escritos e outros virão. O bom da nossa profissão é ser surpreendido. Interpretar um personagem que nunca sequer imaginávamos”, reflete sobre as delícias de sua profissão. Satisfeita? Talvez, mas ainda faz planos para dirigir cinema. “Tenho vontade de realizar o que transforma as pessoas”. À primeira vista, já tem conseguido.

"Tenho tomado mais cuidado com a alimentação hoje, aos 45 anos. Faço mais exercícios também. E vivo cada fase da maternidade: a adolescência chegou com tudo."

Débora Falabella em cena da peça 'Prima Facie'
Foto: Divulgação

"PRIMA FACIE"

Teatro Vivo

Endereço: Av. Dr. Chucri Zaidan, 2460 - Vila Cordeiro, São Paulo - SP

Duração: 90 min Classificação: 12 anos

Ingressos: de R$ 20 a R$ 150

Temporada: até 30/03/2025

Sextas e sábados, às 20h | Domingos, às 18h

Cliente Vivo Valoriza pode resgatar cortesias no APP Vivo e também tem desconto de 50% para a compra do ingresso.

Atriz Débora Falabella
Foto: Velvet

O que faz a cabeça de Débora Falabella

Cidades que visitou recentemente:

  • Veneza
  • Berlim

“Queria passar um mês só indo ao teatro.”

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Os livros que mexeram com ela em 2024:

  • '1Q84', de Murakami
  • 'O Perigo de Estar Lúcida', de Rosa Montero
  • 'A Vingança é Minha', de Marie NDiaye

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Filmes que gostou em 2024:

  • 'Dias Perfeitos', de Wim Wenders
  • 'Ficção Americana', de Cord Jefferson
  • 'O mal não existe', de Ryûsuke Hamaguchi
  • 'Malu', de Pedro Freire

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Séries que viu nos últimos meses:

  • 'Kaos', na Netflix
  • 'Feud: Capote vs. The Swans', no Google Play
  • 'House of The Dragon', na HBO
  • 'Ripley', na Netflix

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Podcasts que tem ouvido:

  • 'Rádio Novelo Apresenta'
  • 'Ciência Suja'
  • 'Reinventando a Natureza'
► Confira outras entrevistas especiais da revista Velvet
 
Fonte: Velvet Conteúdos da revista Velvet
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