A gerente de marketing Juliana* (nome fictício) deveria estar retornando nesta semana de uma viagem para o Peru, dada de presente por sua mãe. Mas, dois dias antes de embarcar de São Paulo para o outro país, recebeu uma mensagem da agência que informava o cancelamento da viagem. A empresa alegou "motivos internos".
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"Tentei entrar em contato com a pessoa que falava comigo o tempo todo, mas ela não me respondeu. Aí eu entrei no site 'Reclame Aqui', e comecei a ver que, nas últimas semanas, há registros em uma quantidade absurda de pessoas falando que as viagens estavam sendo canceladas 24 horas antes, 30 horas antes da viagem", conta.
Juliana teve que correr para cancelar o voo, que havia sido comprado à parte. A viagem estava prevista para começar no dia 8 deste mês e custou R$ 10 mil pela Single Trips, empresa de turismo focada em mulheres solteiras. A proposta do negócio é que mulheres que não estão em um relacionamento viajem em grupos, compartilhando quarto e fazendo amizade.
Pelo contrato, a empresa ainda está em tempo de enviar o reembolso, segundo Paula*, outra cliente da Single Trips, que também teve a viagem remarcada em cima da hora.
Aposentada, Paula era analista judiciária e, por isso, tem maior entendimento legal sobre o caso. Ela e Juliana conheceram a história uma da outra depois de uma postagem no Facebook expondo a situação. Agora, elas estão em um grupo com mais outras duas mulheres que temem terem sido vítimas de um golpe. "Ainda não tem crime porque não se consolidou. Eles estão no prazo, pode ser que semana que vem eles façam o ressarcimento do dinheiro", frisa Paula.
O que fez com que as duas escolhessem expor a situação, porém, foi o modus operandi da agência, que continua a anunciar pacotes nas redes sociais, apaga comentários que questionam sobre os reembolsos e não dá retorno para as clientes que tiveram viagens canceladas.
"No dia seguinte, eu tentei entrar em contato. Ninguém me respondia, não me atendia, não fazia nada. Então, uma amiga minha fez um contato com eles pelo Instagram, como se a gente quisesse comprar um pacote. E eles falaram, então a gente entra em contato com você, passa o celular. Ela passou o meu. Aí eles me ligaram", conta Juliana.
O mesmo aconteceu com Paula. Próximo da data da viagem, ela não conseguia retorno da agência com a confirmação do seu passeio para São Luís, no Maranhão. Pediu, então, que sua filha entrasse em contato pedindo por "informações", que foi logo respondida.
"Três dias antes, mandaram o nome do guia, o número do voo, que é um número genérico, instruções do que levar, do que fazer. Pensei: 'Bom, fechou, então vai ter o passeio'", relembra a aposentada. Paula saiu de Niterói (RJ) para São Paulo, que é de onde embarcaria para São Luís. Ela pagou por uma diária em um hotel na capital paulista, de onde recebeu, na noite que antecedia a viagem, uma mensagem de cancelamento. Seu prejuízo gira em torno de R$ 8 mil, considerando o pacote e o custo de ir e se hospedar por uma noite em São Paulo.
No site Reclame Aqui, a maioria das queixas contra a empresa são recentes. Durante todo o ano passado, a Single Trips recebeu nove reclamações na plataforma, enquanto nos últimos seis meses foram 22. Apenas nos últimos sete dias, 15 reclamações foram feitas. "Cancelamento com 9 horas para o início" e "Viagem cancelada 8 horas antes do voo" são alguns dos títulos das reclamações.
"As pessoas vão até a agência e ela está fechada. E o pessoal do prédio fala: 'Não, eles fecharam a agência. Faz mais de 20 dias que ninguém aparece'", relata ainda Juliana.
Depois que sua amiga passou seu contato para que a agência ligasse, achando que estariam oferecendo um pacote para uma nova cliente, Juliana conseguiu pedir explicações para o atendente. Ele teria dito a ela que a empresa está passando por "dificuldades financeiras" após a morte de sua fundadora.
Tanto Paula quanto Juliana informaram que estão judicializando a questão. A segunda, inclusive, decidiu abrir um boletim de ocorrência quando viu a quantidade de queixas contra a empresa, com medo de levar um golpe. O boletim foi aberto na Polícia Civil de São Paulo.
Questionada pela reportagem, a Secretaria de Segurança Pública do Estado informou que o caso foi registrado como estelionato na Delegacia Eletrônica. "Por se tratar de uma ocorrência de ação penal condicionada, a vítima foi orientada a comparecer ao Distrito Policial responsável pela área dos fatos, para oferecimento da representação criminal para o início das investigações", diz nota enviada.
O Terra tentou contato com a agência Single Trips por WhatsApp e não houve resposta. A reportagem também tentou ligar para o número de telefone fixo anunciado pela empresa, mas ninguém atendeu. O espaço segue aberto.
*As fontes preferiram não se identificar, por medo de represálias.
