BRASÍLIA - O secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, Luis Rua, avalia que a crise entre a indústria de carnes e o Carrefour é uma questão que reflete mais na imagem do agronegócio brasileiro do que em impactos comerciais.
"De carne bovina, o que exportamos para a França no ano é equivalente às entregas de frigorífico em qualquer supermercado de Brasília em três dias, de dois a três contêineres, enquanto de frango é zero. Não estamos preocupados com a questão comercial dessa atitude desproporcional do presidente do Carrefour de não comprar carne do Mercosul, mas com a imagem e identidade do Brasil", afirmou Rua em painel no evento Encontro Nacional do Agro e dos Adidos Agrícolas, realizado pela ApexBrasil nesta segunda-feira, 25.
O secretário lembrou que a medida do Carrefour se soma a declarações recentes de executivos da também francesa Danone sobre o fornecimento de soja brasileira e do CEO do grupo sucroalcooleiro francês Tereos, Olivier Leducq, sobre "concorrência desleal" entre União Europeia e Mercosul.
"No nosso entendimento, o Brasil deve responder com altivez porque não estamos discutindo uma questão de comércio, mas de imagem e identidade. Fomos muito atacados de forma desproporcional nos últimos tempos, enquanto o Brasil tem reduzido o desmatamento e tem melhores controles sanitários do mundo", afirmou o secretário.
De acordo com Rua, há 40 anos a União Europeia realiza inspeção em frigoríficos brasileiros e não encontrou irregularidades. "A União Europeia, da qual a França faz parte, vem há 40 anos no Brasil fazer inspeções e nunca disse que a carne brasileira não é alimento seguro", criticou Rua.
O secretário afirmou compreender o protecionismo francês, considerando que o Brasil é mais competitivo que a França, citando que o frango produzido lá emite o dobro de carbono do frango nacional. "Isso faz parte de retórica, mas não às custas de manchar nossa sanidade e imagem", defendeu o secretário.
A crise entre o Carrefour e a indústria de carnes brasileira escalou nos últimos dias, com frigoríficos suspendendo o fornecimento de produtos ao Grupo Carrefour — Carrefour, Atacadão e Sam's Club — no Brasil.
A represália da indústria é em resposta ao comunicado recente do CEO mundial do Carrefour, Alexandre Bompard, de que a varejista se compromete a não vender carnes do Mercosul, independentemente dos "preços e quantidades de carne" que esses países possam oferecer, afirmando que esses produtos não respeitam requisitos e normas do mercado francês.
O Carrefour França afirmou que a medida é restrita apenas às unidades francesas, enquanto o Carrefour Brasil afirmou que não há mudanças na operação local. A indústria brasileira de carnes condicionou a retomada do fornecimento de produtos ao Carrefour Brasil a uma retratação pública de Bompard.
'Medida infundada'
No mesmo evento, a chefe da Divisão de Política Agrícola do Ministério das Relações Exteriores (MRE), Grace Tanno, classificou como "infundadas" as medidas de companhias francesas contra o Mercosul, em relação ao veto recente do Carrefour França de comprar carne do Mercosul.
"A França compra 90% de carnes do Reino Unido. O Mercosul vai prover 1% do consumo francês de carnes. Para o Carrefour, com essa medida, não há grandes dramas em prover o consumo de carnes, porque a maior parte provém do Reino Unido", afirmou.
Na avaliação da diplomata, mesmo que firmado o acordo entre Mercosul e União Europeia, a oferta do bloco latino-americano à França tende a não ultrapassar o volume atual. "É uma medida completamente equivocada porque o Mercosul não representa volume significativo no abastecimento francês de carnes. A pessoa está querendo se cacifar com produtores nacionais e diz qualquer coisa", avaliou a diplomata.