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Câmara aprova 3º projeto do pacote fiscal com teto para salário mínimo, mas desidrata mudança no BPC

Proposta coloca limite de 2,5% para o crescimento do salário mínimo, impõe limite de gastos com o Proagro, mas afrouxa medidas para o BPC

19 dez 2024 - 21h04
(atualizado às 21h25)

BRASÍLIA - A Câmara dos Deputado aprovou nesta quinta-feira, 19, o texto-base do terceiro e último projeto que integra o pacote de cortes de gastos encaminhado ao Congresso pelo Ministério da Fazenda.

Os deputados analisam agora os destaques (sugestões de mudanças a texto principal). Após a conclusão da votação, o texto segue para o Senado Federal. Com isso, dois projetos de lei e uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) estarão sob o crivo dos senadores, com expectativa de conclusão de votação até esta sexta-feira, antes do recesso parlamentar.

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Entre as medidas do último projeto do pacote, aprovado nesta quinta, estão a limitação do crescimento do salário mínimo às travas do arcabouço fiscal, limites de gastos para o programa Proagro e ajustes menores considerados como pente-fino por especialistas, como o obrigatoriedade de biometria para o recebimento de benefícios sociais.

Duas grandes medidas que constavam no projeto original foram enfraquecidas ou rejeitadas. Como antecipou o Estadão, havia forte resistência para mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, que teve as alterações propostas pela Fazenda desidratadas. O Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF), por sua vez, saiu do texto e não sofreu mudanças.

Câmara conclui votação de projetos do pacote de corte de gastos enviado pelo governo.
Câmara conclui votação de projetos do pacote de corte de gastos enviado pelo governo.
Foto: BRUNO SPADA AGENCIA CAMARA / Estadão

Na noite de terça-feira, o primeiro projeto do pacote foi aprovado, tendo sua votação concluída na quarta. Nesta quinta-feira, a Câmara também aprovou, em dois turnos, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com mais medidas de ajuste, após o Executivo entrar em campo para garantir os votos.

A Fazenda estima que os três projetos juntos vão gerar uma economia de R$ 71,9 bilhões em dois anos, mas especialistas em contas públicas contestam esse cálculo e preveem uma economia menor, entre R$ 40 bilhões e R$ 50 bilhões. As contas ainda terão de ser refeitas após as várias modificações feitas no Congresso.

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Câmara afrouxa mudanças no BPC

No projeto aprovado nesta quinta, o deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), relator da proposta, derrubou várias medidas de ajuste no BPC, que registra um crescimento de gastos de 16% em 12 meses até outubro, o que levantou preocupações da equipe econômica.

O relator afirmou que o BPC vinha crescendo de forma "não orgânica" e citou escritórios de advocacia que têm "burlado o programa".

"Sem essas modificações, esse programa, que é um dos programas de distribuição de renda mais bonitos e funcionais, vai colapsar, devido ao crescimento não orgânico dos últimos tempos", afirmou. "Trago notícia não tão boa para os fraudadores do BPC: conhecemos as práticas dos que tiram de quem não merece para os escritórios de advocacia que vivem de fabricar mecanismos para burlar o programa, que foi feito para beneficiar a população mais carente do País."

No texto, Isnaldo rejeitou a definição de "pessoa com deficiência" proposta no projeto do governo e retomou o conceito original da lei que regulamenta o BPC. Ele inseriu, porém, dispositivos que condicionam o acesso ao benefício a uma "avaliação que ateste deficiência de grau moderado ou grave" - ponto que muitos parlamentares pressionaram para derrubar, mas foi matido.

Em outra alteração, o parlamentar excluiu da regra de coabitação os rendimentos de familiares que não moram na mesma casa, mas ajudam o beneficiário de alguma forma. Na justificativa, Isnaldo cita uma "evidente dificuldade de aplicação" da norma. O relator também rejeitou a regra segundo a qual, para a concessão do BPC, seria considerado como meio de prover a própria manutenção a posse ou a propriedade de bens ou direitos, inclusive de terras.

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Ele também não aceitou revogar outra regra que diz que o benefício já concedido a qualquer membro da família não será computado para os fins do cálculo da renda familiar. O relator, porém, manteve a necessidade de apresentação de documento com exame biométrico para receber o benefício, mas incluiu exceções, como nos casos de idosos com dificuldades de locomoção ou pessoas que moram em localidades remotas.

"Queria reconhecer a importância das alterações das possibilidade de recebimento do BPC. Caíram pontos muito sensíveis, como aquele em que duas crianças com deficiências, uma delas teria que abrir mão do BPC. Ou o conceito de família estendida, que iria diminuir a possibilidade acesso ao BPC", afirmou a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP).

A Fazenda previa R$ 12 bilhões de economia com a proposta original até 2030, antes das desidratações feitas pelos deputados.

Outras medidas

O projeto manteve a obrigatoriedade de cadastro biométrico para concessão, manutenção e renovação de benefícios de seguridade social. Além disso, prevê que o Proagro, espécie de seguro rural para pequenos e médios produtores, respeite a disponibilidade orçamentária de cada ano. O projeto muda ainda os parâmetros relativos à permanência no Bolsa Família, incluindo o estabelecimento de índices máximos de famílias unipessoais.

O relator, contudo, retirou o trecho que estabelece que a despesa federal alocada no Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) crescerá limitada ao IPCA. Hoje, o fundo é corrigido pela Receita Corrente Líquida (RCL).

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O FCDF, abastecido com recursos da União, é usado para manter a Polícia Civil, a Polícia Penal, a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal, além de dar assistência à execução de serviços públicos de saúde e educação. Isnaldo excluiu todo o trecho referente ao fundo. A Fazenda previa arrecadar R$ 18,1 bilhões até 2030com a medida.

Resumo do projeto

PL | Relator: Isnaldo Bulhões (MDB-AL)

  • Salário mínimo: Limita o crescimento do salário mínimo a 2,5% ao ano acima da inflação, com piso de Previsão de economia de R$ 109,8 bilhões entre 2025 e 2030.
  • Proagro: Gastos com Proagro, espécie de seguro rural voltado a pequenos e médios agricultores, ficarão limitados ao que está previsto no Orçamento de cada ano. Sem previsão de economia.
  • Biometria: Estabelece biometria para todos os benefícios da seguridade social, medida considerada como "pente-fino" por especialistas. Previsão de economia de R$ 15 bilhões até 2030.
  • Bolsa Família: Permite ao governo modificar parâmetros relativos ao Bolsa Família e coloca limites de unipessoais em municípios. Previsão de economia de R$ 17 bilhões até 2030.
  • Renovação de cadastro: Quem está no CadÚnico terá de renovar cadastro a cada 24 meses para receber programa de transferência de renda. Medida considerada pente-fino, sem projeção de economia.
  • Dados: Concessionárias de serviços públicos terão que oferecer dados para a União. Medida considerada pente-fino, sem projeção de economia.

O que foi 'desidratado' pelos deputados'

BPC: O texto aprovado derrubou várias medidas do projeto original da Fazenda, mas manteve a necessidade de biometria para o recebimento do benefício e disse que só receberá o BPC deficientes (além de idosos) que tiverem limitações de moderada para grave. O governo previa R$ 12 bilhões de economia com as medidas até 2030, e agora o cálculo terá de ser refeito.

FCDF: A proposta do governo queria a correção dos recursos do Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) pela inflação, com uma previsão de economia de R$ 18,1 bilhões entre 2025 e 2030. A ideia foi rejeitada, permanecendo a correção pela Receita Corrente Líquida.

Entenda as outras duas propostas do pacote

A Câmara também aprovou uma PEC e um outro projeto de lei, que seguem para o Senado. Veja abaixo os principais pontos das duas propostas.

PEC | Relator: Moses Rodrigues (União CE)

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  • Supersalários: Restringe as exceções para limites de remuneração. Necessita de lei ordinária para definir o que pode ser excluído do contabilidade da renda. Sem previsão de economia na proposta oficial do governo.
  • Fundeb: permite que até 10% da complementação da União ao Fundeb seja usado para o ensino integral, em 2025 e até 4% de estados e municípios, a partir de 2026. Com isso, o Ministério da Educação poderá cancelar gastos previstos com a ampliação de matrículas. Previsão de economia do projeto inicial era de R$ 42,3 bilhões entre 2025 e 2030.
  • Abono salarial: Estabelece que o abono salarial será pago a quem ganha 1,5 salário mínimo, caindo gradativamente até 2035. Previsão de economia de R$ 18,1 bilhões entre 2025 e 2030.
  • DRU: Prorroga a DRU até 2032, com 30% da arrecadação da União desvinculada de órgão, fundo ou despesa. Previsão de economia de R$ 25,6 bilhões entre 2025 e 2030.
  • Benefício tributário: Diz que uma lei complementar disporá sobre incentivos ou benefícios de natureza tributária. Sem previsão de economia.

O que caiu:

  • Orçamento impositivo: Revoga parágrafos que tornam obrigatórias a execução de programações orçamentárias. Sem previsão de economia.

PLP | Relator: Átila Lira (PP-PI)

  • Seguridade social: Criação ou prorrogação de novos gastos da seguridade social têm que respeitar os limites do arcabouço. Mantido no texto, mas sem previsão de economia divulgada pelo Ministério da Fazenda.
  • Gatilho com déficit primário: Proíbe a renovação de incentivos tributários e limita o crescimento de gastos com pessoal a 0,6%, se o governo registrar déficit primário.
  • Gatilho em caso de queda nominal dos gastos discricionários: Proíbe, até que as despesas discricionárias voltem a subir em termos nominais, a concessão, ampliação ou prorrogação de benefício tributário, de 2027 até 2030, e limita o crescimento anual real de despesas com pessoal e encargos acima de 0,6%.
  • Superávit primário de fundos: Só poderá ser usado para o pagamento de dívidas, mas três dos oitos fundos da proposta original saíram do texto.
  • Emendas: permite contingenciamento e bloqueio de emendas até 15% das dotações. Fica igual qualquer despesa discricionárias.

Caiu no projeto

  • Limitação para compensação de créditos tributários: Foi retirado do texto pelo relator Átila Lira, sob argumentação de que o governo já havia tentando essa proposta, em uma medida provisória, que foi devolvida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco.
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