O uso medicinal da cannabis no Brasil nem era um assunto tão difundido quando Marcel Grecco criou a aceleradora The Green Hub, em 2018. O primeiro contato que ele, CEO da organização, teve com o tema foi em 2016, em uma viagem para os Estados Unidos e Canadá.
"Identifiquei que não era uma questão de se iria acontecer no Brasil, mas quando iria acontecer no Brasil", disse Marcel em entrevista ao podcast Vale do Suplício.
Cerca de cinco anos depois, o que mais compromete o bom resultado de startups que apostam no desenvolvimento de produtos ligados a cannabis no Brasil é educacional: tanto falta de informação sobre o setor quanto de conhecimento sobre negócio, produto e oportunidade.
"A gente vê uma movimentação grande de empresas querendo achar o seu espaço dentro de um mercado que ainda está em desenvolvimento", conta. Esse desenvolvimento passa não somente pelo avanço das pesquisas científicas e aculturamento tanto de profissionais de saúde quanto de pacientes, mas do próprio órgão regulador. Em julho de 2023, por exemplo, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) emitiu a Nota Técnica 35 (NT 35/2023) proibindo a importação de cannabis in natura, bem como de flores e partes da planta. A decisão sufocou um mercado que o próprio órgão havia regulado ao lançar a Resolução de Diretoria Colegiada 660 (RDC 660/2022) um ano antes, gerando um deságue de processos judiciais.
Apesar de o terreno que sustenta a venda de produtos medicinais à base de cannabis ainda estar instável, outro fator dificulta o empreendedorismo no setor: concorrência. "O que era há três, quatro anos atrás, um oceano azul se torna um oceano vermelho. Nesse hype da cannabis, todo mundo queria ter uma empresa de CBD [cannabidiol] num intervalo de tempo muito curto, e muitas empresas não conseguiram colocar seu plano em prática e já têm um movimento de saída desse mercado", continuou, explicando que a chegada das grandes farmacêuticas aumentou ainda mais as barreiras de entrada. "O risco do negócio cresce."
Mercado auxiliar
Se o nicho de fins medicinais está obstruído, outros, que Marcel chama de "mercado auxiliar", guardam oportunidades. "A maconha tem 25 mil aplicabilidades. Estamos na infância dessa indústria", justifica.
Um deles é o de cosméticos, mas há ainda o cânhamo industrial e soluções de tecnologia e serviços É preciso avaliar, contudo, regulação: muitas dessas atividades ainda não são permitidas no Brasil. É ficar de olho no que está acontecendo lá fora, escolher o nicho que melhor se aplica ao objetivo e, assim como Marcel, apostar no "quando" vai acontecer no Brasil, e não "se" vai acontecer no Brasil. Para ele e o The Green Hub, que já captou milhões de reais e acelerou 14 startups, essa tática deu certo.
(*) Adriele Marchesini é jornalista especializada em TI, negócios e Saúde e cofundadora da agência essense, que já apoiou mais de 100 empresas na construção de conteúdo narrativo e multiplataforma para negócios. Junto de Silvia Noara Paladino, criou o podcast Vale do Suplício, que traz histórias de empreendedores que falam pouco, mas fazem muito. Ouça no Spotify.