Com subsídios e incentivos, país escandinavo está perto de alcançar sua meta de que todos os carros novos sejam elétricos. O que outros países podem aprender com os noruegueses?A Noruega se tornou a maior referência na transição dos veículos movidos a combustíveis fósseis para a eletromobilidade. No ano passado, estatísticas oficiais do governo mostraram que quase nove em cada dez automóveis vendidos eram elétricos.
Em 2023 - o ano mais recente para o qual há dados disponíveis - a taxa global de adoção de veículos elétricos foi de apenas 18%, de acordo com a Agência Internacional de Energia (AIE).
O país nórdico assumiu um compromisso notável com o combate às mudanças climáticas, impulsionado por fortes políticas governamentais, uma infraestrutura robusta e uma população cooperativa.
A meta da Noruega é que todos os automóveis de passeio comercializados no país sejam veículos com emissão zero até o fim de 2025, uma década antes da meta da União Europeia (UE), da qual não é um dos estados-membros.
Pioneirismo
A riqueza e o tamanho da Noruega desempenharam, sem dúvida, um papel nessa história de sucesso. O país tem uma população de 5,5 milhões e é uma das nações mais ricas do mundo graças as suas reservas substanciais de petróleo - as maiores da Europa depois da Rússia. No entanto, esses fatores por si só não explicam os notáveis progressos feitos.
O cientista Robbie Andrew, do Centro Internacional de Pesquisas sobre o Clima (Cicero), sediado em Oslo, avalia que o compromisso de décadas da Noruega com o desenvolvimento local de veículos elétricos foi um fator crítico.
"Na década de 1990, a Noruega se esforçou para criar uma empresa própria para fabricar veículos elétricos", explica Andrew, observando como a ausência de um lobby poderoso da indústria automobilística nacional facilitou essa iniciativa.
Embora as primeiras tentativas de produção de veículos elétricos tenham tido sucesso comercial limitado - apenas alguns milhares foram vendidos - elas promoveram a conscientização pública e a aceitação da eletromobilidade. Isso abriu caminho para a adoção generalizada de carros movidos a bateria produzidos por fabricantes globais, como Tesla e Volkswagen.
Incentivos do governo
Além disso, políticas estatais favoráveis facilitaram a transição para os veículos elétricos. A Noruega não cobrava Imposto sobre Valor Agregado (IVA) ou taxas de importação sobre esses veículos, o que pode representar entre um terço e quase metade do custo de um carro novo.
Os veículos elétricos também eram isentos de pedágios e taxas de estacionamento. Eles podiam até usar faixas de ônibus dentro e no entorno de Oslo.
As classes sociais de renda mais alta foram as que mais se beneficiaram das isenções fiscais, e os veículos elétricos eram frequentemente o segundo carro da família.
Com a meta para 2025 quase alcançada, o governo recentemente reverteu alguns desses incentivos. O IVA agora é parcialmente aplicado a veículos elétricos grandes e luxuosos que custem mais de 500 mil coroas (R$ 265 mil). Consunidores de baixa renda ainda se beneficiam de muitos dos incentivos e da queda nos preços desses veículos.
O especialista Bjorne Grimsrud, diretor do centro de pesquisas de transporte TOI, sediado em Oslo, entende que os incentivos do governo têm sido "muito dispendiosos", mas pagáveis diante da riqueza do país e do desejo de ser climaticamente neutro até 2050.
"O governo costumava arrecadar 75 bilhões de coroas anualmente em impostos e pedágios sobre carros, mas isso foi cortado pela metade", observa Grimsrud.
Outras nações, como a Alemanha, são acusadas de retroceder em suas metas climáticas ao cortar subsídios para veículos elétricos novos muito antes de atingir seus objetivos. Recentemente a autoridade federal de transportes da Alemanha KBA revelou que o maior mercado automotivo da Europa registrou uma queda de 27,4% no número desses veículos.
Se a Alemanha, uma grande fabricante de carros elétricos, quiser atingir sua meta de ter 15 milhões de veículos elétricos nas ruas até 2030, precisará reavaliar decisões como essa.
Pontos de recarga domésticos
Outra vantagem no caso da Noruega é a sua matriz energética, uma das mais verdes e robustas do mundo. A energia hidrelétrica é responsável por mais de 90% da produção de eletricidade do país, normalmente produzindo um excedente de energia, o que ajudou a facilitar o carregamento de veículos elétricos nas residências.
Se a recarga é um desafio em outras partes da Europa, a maioria dos noruegueses pode carregar seus veículos elétricos em casa em vez de em pontos de recarga públicos.
Um estudo de 2022 da Associação Norueguesa de Veículos Elétricos descobriu que cerca de três quartos dos proprietários vivem em casas isoladas, o que torna mais fácil instalar pontos de recarga em suas moradias. Um relatório da empresa de consultoria LCP, sediada em Londres, revelou que 82% dos veículos elétricos na Noruega são carregados em casa, embora esse número seja menor nas áreas urbanas.
"A ubiquidade da recarga de nível 1 na Noruega provavelmente teve um impacto muito grande [na adoção de veículos elétricos]", diz Lance Noel, gerente de produtos da ONG Centro para Energia Sustentável, sediado em San Diego. O carregamento de nível 1 é a que usa tomadas convencionais, de menor potência, encontradas em residências, empresas e escolas.
Noel disse que outros países fariam bem em "pensar em maneiras mais baratas e visíveis de tornar os veículos elétricos integrados à sociedade", em vez de priorizar infraestruturas públicas de recarga rápida, conhecidas como níveis 2 e 3.