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Como superar os 8 maiores desafios da mulher empreendedora

Afinal, quais os maiores desafios que passam as mulheres empreendedoras?

27 nov 2023 - 11h52
Tatiana Pimenta
Tatiana Pimenta
Foto: Paulo Liebert 

Quais são os maiores desafios pelos quais nós, mulheres empreendedoras, passamos? Fui convidada a refletir sobre essas questões em uma entrevista recente. Movida pelo desejo de compartilhar meus aprendizados com outras mulheres que estão no início da jornada empreendedora, resolvi escrever esse texto.

Até hoje, muita gente ainda me pergunta o que levou uma engenheira civil a abandonar a carreira corporativa na construção civil e virar empreendedora na área da saúde e ter como missão levar o bem-estar e o equilíbrio da saúde mental ao maior número de pessoas.

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Uma série de acontecimentos e de sincronicidades ocorreram durante os 10 meses dessa transição de carreira. Algumas muito dolorosas, mas essenciais para que eu enxergasse o caminho a seguir.

Quatro de agosto de 2015 foi o marco inicial. Nesse dia eu fui demitida da Hilti, multinacional da área de construção civil com sede no principado de Liechtenstein, um dos menores países do continente europeu. A conjuntura econômica e a Lava Jato foram os fatores determinantes para os cortes da empresa na época. Outros, como o fato de minha demissão ser menos custosa para a empresa que a de outros colegas expatriados, contribuíram para a decisão. A demissão em si foi fria, meu chefe mal olhou para mim e estendeu uma carta impressa com aviso prévio.

Mas o pior ainda estava por vir. No mesmo dia da minha demissão, recebi uma ligação e descobri que meu pai estava com câncer. Como eu havia sido demitida, resolvi adiar minha recolocação e me dedicar à família, que morava em Corumbá, Mato Grosso do Sul, cidade onde nasci e cresci. O apoio era tanto para os detalhes do procedimento médico pelo qual meu pai iria passar, como para minha mãe, que, preocupada com a situação, chegou a ter um pico de pressão alta no dia da cirurgia dele.

A doença do meu pai me levou inicialmente a tentar fazer consultas à distância com especialistas em São Paulo, para saber a melhor forma de tratar seu caso. Mas em 2015 nenhum médico aceitava me atender de forma remota. Tivemos que vir para São Paulo para operá-lo.

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Dessa situação veio meu primeiro insight. A dificuldade de acesso à saúde em um país continental como o Brasil me mostrou que havia uma oportunidade enorme de mercado para uma solução que acabasse com a dor de milhares de brasileiros: o acesso democratizado à saúde de qualidade.

De certa forma, essa experiência também foi similar à minha busca por um psicólogo, quando tive depressão poucos anos antes. Foram várias experiências frustrantes no processo de tentar encontrar um bom profissional pelo plano de saúde. Não dá para escolher um terapeuta só pelo nome, endereço do consultório e número de telefone, que é o que o plano de saúde oferece aos beneficiários. Tive péssimas experiências. Um dos psicólogos chegou a dormir durante a minha consulta. Só muito tempo depois descobri que o que os planos de saúde pagam por sessão faz com que eles tenham de trabalhar muitas horas diárias para poder pagar as contas. Esse modelo não é sustentável.

Quando recebi uma recomendação de um terapeuta, consegui um atendimento de qualidade. O problema, porém, é que o consultório ficava a mais de uma hora da minha casa, inviabilizando o atendimento na minha rotina de então.

Veio aí o segundo insight. Assim como na medicina, o processo frustrante de encontrar um psicólogo adequado, somado à ausência desses profissionais em mais de 50% dos municípios brasileiros indicava outra oportunidade de mercado. Uma conversa que tive em um evento voltado para médicos acabou me levando definitivamente a criar o modelo de negócios inicial da Vittude: uma plataforma para conectar psicólogos e pessoas e permitir a terapia online.

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Depois que meu pai se curou do câncer e passou por todo o processo de recuperação, eu já havia decidido não voltar ao mercado formal e comecei a me capacitar para seguir o caminho do empreendedorismo. Começaram aí os desafios – e tudo o que fiz para superá-los.

Empreender exige novas habilidades

Não conhecia nem de saúde nem de tecnologia, portanto investi muito tempo estudando, me relacionando com pessoas da área, participando de eventos de empreendedorismo. Cheguei a ler 45 livros em um ano.

Por outro lado, olhando o copo meio cheio, não ser especialista em saúde também me permitiu pensar fora da caixa e olhar sob pontos de vista que ninguém nunca havia pensado antes. Exercitei minha criatividade e fui inovadora, pois não tinha pré-conceitos de que algo não ia funcionar. 

Meus mentores sempre me disseram que eu era muito “coachable”, ou seja, alguém que tem vontade de aprender, sai da sua zona de conforto e recebe muito bem críticas construtivas. Por estar aprendendo sobre o assunto, minha sede de curiosidade me levava a absorver e processar os conhecimentos sem barreiras!

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Ausência de financiamento

A educação financeira que tive do meu pai foi fundamental para enfrentar o segundo desafio. O início da Vittude foi bootstrap, utilizando minhas economias e a do meu sócio como investimento inicial. Cresci ouvindo do meu pai que tinha que gastar menos do que eu ganhava e guardar dinheiro, o que fiz desde o meu primeiro emprego. Sem essa poupança, não teria tido fôlego para sobreviver aos primeiros anos da empresa.

Se preparar financeiramente, em especial para os primeiros anos, quando o negócio está sendo construído, é fundamental. Se você estima que o negócio irá dar retorno após dois anos, procure fazer uma reserva de dinheiro para dois anos e meio ou três. Isso será essencial para lidar com surpresas, como um contexto macroeconômico difícil, ou algo inesperado como a pandemia.

No meu caso, como não tinha essa reserva extra, após o segundo ano sem entrada de capital estava praticamente quebrada e tive que recorrer a várias estratégias, como ir morar na casa de uma amiga para alugar meu apartamento no AirBnB, reduzir drasticamente o custo de vida, fazer algumas atividades paralelas para conseguir uma renda extra, tudo para pagar minhas contas pessoais até chegar o primeiro investidor.

Dificuldade de acesso a investimento

Um dos grandes desafios no empreendedorismo feminino é o acesso a financiamento. Você sabia que apesar de as mulheres serem 4,7% do ecossistema de startups elas receberam apenas 0,04% dos mais de US$ 3,5 bilhões aportados no mercado em 2020? Os dados são do Female Founders Report, um estudo feito pela Distrito, Endeavor e B2Mamy em 2020.

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Essa representatividade mudou muito pouco em uma década. Em 2010, quando o ecossistema de startups no Brasil tinha 18% do tamanho que tem hoje, empresas de base tecnológica fundadas por mulheres representavam 4,4% deste mercado. A falta de diversidade nos fundos é uma das razões para esse cenário. À época do estudo, 74% deles não tinham mulheres entre seus fundadores.

No meu caso, não estava sozinha e contava com meu sócio. Mesmo assim, foram centenas de “nãos” de investidores até o primeiro investimento seed em outubro de 2019.

Parte dessa dificuldade deveu-se também ao fato de estarmos entrando em um mercado que ainda não havia sido regulamentado. Nos primeiros anos, investimos muito tempo em advocacy junto aos Conselhos de Psicologia até conseguir que o Conselho Federal de Psicologia regulamentasse o atendimento online em novembro de 2018. Tenho muito orgulho de dizer que esse foi um legado conquistado pela Vittude para a sociedade brasileira.

Manter a saúde física, mental e emocional

Lidar com o medo, a incerteza e a ausência de dinheiro e me manter emocionalmente bem era um desafio constante. Poucos empreendedores dão atenção a isso, dedicando muitas horas ao negócio e deixando de lado o cuidado com a saúde física e mental.

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É só parar para refletir, trabalhar à exaustão pode trazer uma série de doenças. Principalmente no estágio inicial do negócio, ficar doente significa colocar o freio de mão na operação da empresa. Para evitar isso, o cuidado precisa ser amplo: físico, mental e emocional.

Dormir pelo menos 7 horas por dia, se hidratar, praticar exercícios e se alimentar de forma adequada vão contribuir para o bem-estar físico.

Do ponto de vista emocional, recomendo a terapia para lidar com as questões pessoais e aprender a gerenciar o estresse e a ansiedade, que não deve ser subestimado.

Para mim, a meditação, minha corrida diária e a sessão semanal de terapia foram (e ainda são) as equações de sucesso, prioridades que têm lugar cativo e são inegociáveis na minha agenda. Elas me ajudam a ter a resiliência, equilíbrio e confiança necessários para seguir em frente nos períodos mais desafiadores da jornada empreendedora.

Também sou maratonista e o preparo para correr uma maratona envolve disciplina, perseverança e foco. Esse preparo é ou não similar ao que um empreendedor precisa ter para alavancar seu negócio?

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Alto grau de incerteza e instabilidade

Empreender em startups de base tecnológica amplifica ainda mais esse desafio. O desenvolvimento acelerado da tecnologia e a inovação mudam continuamente o modelo de negócio.

Esse caminho, que é muitas vezes solidário, precisa ser trilhado com uma boa rede de apoio. Pessoas de confiança com quem você possa conversar e se colocar vulnerável nos momentos mais desafiadores são fundamentais. Você tem alguém com quem possa chorar quando necessário, sem medo de julgamento?

Essa rede de apoio deve incluir também pessoas que conheçam as especificidades da jornada empreendedora e que possam contribuir como mentores, tanto para o negócio quanto para seu desenvolvimento pessoal.

Tive a sorte de contar com mentores excepcionais, que me instigaram a olhar outros pontos de vista e contribuíram em momentos importantes para meu amadurecimento como gestora de um negócio inovador.

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Hoje procuro retribuir o que recebi ajudando a mentorar outras empreendedoras com seus desafios de negócio. Em maio de 2019, fui uma das 21 finalistas e a única brasileira na premiação mundial Cartier Women's Initiative Awards, que reconhece empreendedoras mulheres que estão à frente de negócios de impacto social. Conquistei o segundo lugar na categoria América Latina e, desde então, me tornei fellow, mentora e membro do júri da premiação, compartilhando meus conhecimentos com outras mulheres.

Conciliar vida profissional e pessoal

Esse é um dos maiores desafios enfrentados pelas mulheres empreendedoras devido às expectativas sociais de sermos responsáveis pelo lar e pela família enquanto lideramos o próprio negócio.

Para driblar esse desafio, minha recomendação é procurar se conectar com associações e comunidades de empreendedoras (como a B2Mamy) para ampliar o networking e a possibilidade de fazer negócios com outras mulheres, bem como a de encontrar estratégias para conciliar esses dois papéis.

Ter uma rede de apoio confiável nesses casos é fundamental para equilibrar os pratinhos de ambos os lados.

Encontre um sócio ou sócia para o negócio

Aqui uma recomendação que vale ouro e que funcionou muito bem pra mim: encontre pessoas com habilidades complementares às suas. E que tenham o mesmo brilho no olho pelo propósito da sua empresa.

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Tenho a honra e o privilégio de ter como sócio Éverton Höpner. Ele é analítico, metódico, organizado, detalhista. Eu, a emoção em pessoa. Adoro falar, me conectar com pessoas novas, me atirar ao risco, sou espontânea e destemida. Juntos, encontramos o perfeito equilíbrio. Se eu quero voar, ele garante meu aterramento.

Existem oportunidades nas adversidades

Para encarar o empreendedorismo é preciso estar preparado para uma montanha russa e muitas pivotagens no negócio. Em especial no Brasil.

No caso da Vittude, dois episódios foram os responsáveis pela nossa virada: a pandemia, que escancarou a crise de saúde mental global que dá ao Brasil o título de país mais ansioso do mundo; e a classificação da Síndrome de Burnout como doença ocupacional pela OMS (Organização Mundial da Saúde) em 1º de janeiro de 2022.

Entendemos que os ambientes corporativos e as empresas precisavam cada vez mais de parceiros especializados que os ajudassem a construir programas estratégicos de saúde mental nas organizações. Ampliamos a atuação, que até então era apenas B2C, para o B2B. Passamos a nos posicionar como um ecossistema de soluções inteligentes em saúde mental para grandes empresas. 

Inovamos e mais uma vez fomos pioneiros ao trazer o 1º prêmio brasileiro de saúde mental, o Vittude Awards, que reconheceu e premiou os líderes, gestores de saúde corporativa, empresas e projetos de saúde mental que saíram na frente e entenderam que sem esse equilíbrio não é possível construir o futuro do trabalho.

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Se em 2016 tivéssemos cedido às inúmeras negativas dos investidores e ficado em nossa zona de conforto esperando passivos o momento em que a regulamentação da terapia online acontecesse, nada disso teria acontecido.

Por isso, sempre digo que em toda adversidade há uma oportunidade para seu negócio. Uma maneira de olhar diferente, de abrir um novo produto ou serviço, ou de buscar um espaço inexplorado no mercado.

Sei que muitos outros desafios virão na trajetória da Vittude. Faz parte da vida empreendedora. Mas nosso compromisso de fazer da saúde mental uma prioridade incontestável continua a ser um farol nos guiando para os próximos passos da empresa.

(*) Tatiana Pimenta é empreendedora, palestrante e CEO da Vittude, empresa de desenvolvimento e gestão estratégica de programas de saúde mental para empresas. 

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