Emissários do Palácio do Planalto fizeram consultas informais a ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a possibilidade de edição de um crédito extraordinário de R$ 10 bilhões para financiar o novo programa de redução de jornada e salário ou suspensão de contrato sem a necessidade de medidas compensatórias de corte em outras despesas ou aumento de receitas.
Segundo apurou o Estadão, os emissários ouviram nas consultas que a edição do crédito extraordinário não "é um problema" e não pode servir de gatilho para um pedido pelo presidente Jair Bolsonaro de Estado de calamidade, como defendem parte do Congresso e do próprio governo.
A discussão trava o lançamento do programa, que prevê a volta do benefício emergencial (BEm), que compensa parte da perda salarial, e os custos operacionais do programa.
Depois da liberação do auxílio emergencial aos mais vulneráveis, essa é a medida do governo mais esperada pelos empresários afetados pelas medidas de isolamento social. Mas técnicos da área econômica alegaram que artigo da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2021 exige a compensação com o corte em outras despesas ou aumento de receitas.
A preocupação maior no TCU é que o pedido de calamidade abra a "caixa de pandora" para uma forte expansão de gastos sem controle na pandemia da covid-19. Os créditos extraordinários ficam fora do teto de gastos (regra que limita o crescimento das despesas à variação da inflação) e podem ser editados em caso de urgência e imprevisibilidade.
O acertado pelo Palácio do Planalto é que seriam editadas duas Medidas Provisórias (MPs): uma com as regras para o pagamento do benefício aos trabalhadores e outra com o crédito extraordinário para bancá-lo. Mas os técnicos da Secretaria Especial de Fazenda do Ministério da Economia alegaram que o artigo da LDO exige a necessidade de uma compensação.
No Palácio do Planalto, há o entendimento que o dispositivo da LDO não se aplica em casos de crédito extraordinário, mas só nas situações de despesas de caráter continuado. Outra das alternativas é encaminhar um projeto de lei mudando a LDO, o que exigiria mais tempo nesse momento de maior urgência por causa do recrudescimento da pandemia.
Em evento nesta segunda-feira, 5, o ministro da Economia, Paulo Guedes, mostrou preocupação sobre uma eventual interpretação futura do órgão de controle sobre o Orçamento de 2021. "O TCU tem uma certa jurisprudência estabelecida e nem sempre explicita respostas a perguntas específicas. O TCU deixa um certo grau de liberdade. Isso poderia ser desagradável para o governo, se o clima político for diferente lá na frente, a interpretação pode ser para um lado e para outro", disse, em videoconferência da XP Investimentos.
Há uma pressão política para que o governo decrete calamidade, suspendendo as regras fiscais e tirando do caminho todos os empecilhos alegados para a edição dos créditos extraordinários. Guedes considera que acionar novamente uma cláusula de calamidade seria muito ameaçador para as finanças públicas. Ele defende medidas "caso a caso", sem dar "cheque em branco" com a calamidade.
Como mostrou o Estadão, o novo programa de emprego deve alcançar entre 3,8 milhões e 4,0 milhões de trabalhadores. Esse é o número máximo de acordos entre empresas e empregados que podem ser abarcados pelo valor estipulado para bancar a medida, que deve ficar em R$ 9,8 bilhões. As estimativas são maiores do que as iniciais porque o governo quer garantir cobertura e disponibilidade de recursos em caso de necessidade, uma vez que diversos prefeitos e governadores têm adotado medidas mais rígidas de distanciamento social. O setor de serviços é um dos mais impactados e tem assistido a um aumento de demissões nas últimas semanas, segundo representantes do setor.