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Defendido por Bolsonaro, abono paga 39% de seus benefícios a terço mais rico da população

Custo anual do programa é de R$ 20 bilhões e apenas 16% vão para o terço mais pobre, famílias com renda per capita de até R$ 479

26 ago 2020 - 17h47
(atualizado às 20h50)

BRASÍLIA - Defendido pelo presidente Jair Bolsonaro, que avisou nesta quarta-feira, 26, que não vai "tirar de pobres para dar a paupérrimos" na formulação do Renda Brasil, novo programa social do governo, o abono salarial é considerado por técnicos de dentro e fora do governo um dos benefícios mais "ineficientes". O diagnóstico é que o repasse acaba contemplando trabalhadores que estão nas camadas mais elevadas de renda. Tentativas de mudar o abono, porém, já naufragaram no Congresso Nacional diante da resistência de parlamentares.

O abono salarial é considerado por técnicos de dentro e fora do governo um dos benefícios mais "ineficientes".
O abono salarial é considerado por técnicos de dentro e fora do governo um dos benefícios mais "ineficientes".
Foto: Arquivo/Agência Brasil / Estadão

Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) publicado em agosto de 2019 mostra que 39% dos benefícios do abono são pagos a um terço mais rico da população, que inclui pessoas comrenda familiar por pessoa acima de R$ 1.010 a R$ 150 mil (valores de 2018). O custo anual do programa fica em torno de R$ 20 bilhões.

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Apenas 16% do abono salarial vai para o terço mais pobre, ou seja, quem tem renda familiar per capita até R$ 479. Outros 45% dos benefícios do abono vão para aqueles com renda familiar por pessoa entre R$ 479 e R$ 1.010.

A realidade é bem distinta do Bolsa Família, que custa cerca de R$ 30 bilhões por ano e paga 77% de seus benefícios para o terço mais pobre dos brasileiros.

A distorção no abono é possível porque o benefício, uma espécie de 14º salário, é pago a trabalhadores com carteira assinada que ganham até dois salários mínimos (hoje o equivalente a R$ 2.090). Seu critério de concessão não analisa a renda familiar. No limite, o filho ou cônjuge de uma pessoa com renda mais elevada pode ter direito ao abono caso seu próprio salário fique dentro do limite de dois pisos.

Além disso, quase metade do abono salarial é pago a trabalhadores da região Sudeste, enquanto o Nordeste (onde a taxa de pobreza é o dobro da média nacional) fica com 22,4% do benefício. Na análise do Ipea, a contribuição do abono para a redução da pobreza no País é equivalente a zero.

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Segundo dados oficiais do governo, dos 24,5 milhões de trabalhadores elegíveis ao abono salarial entre 2019 e 2020, apenas 8,6 milhões ganhavam até um salário mínimo (35% do total). Em termos de gastos, os trabalhadores que recebiam o piso nacional respondiam por uma despesa de R$ 3,95 bilhões do abono (21% do gasto total de R$ 19,1 bilhões).

Em viagem a Ipatinga (MG) nesta quarta, Bolsonaro admitiu que discorda do plano de Guedes, que incluía a revisão do abono, e avisou que não o enviará ao Congresso. "Ontem discutimos a possível proposta do Renda Brasil. E eu falei 'está suspenso', vamos voltar a conversar. A proposta, como a equipe econômica apareceu para mim não será enviada ao Parlamento. Não posso tirar de pobres para dar a paupérrimos. Não podemos fazer isso aí", disse.

"A questão do abono para quem ganha até dois salários mínimo. Seria, né, um 14º salário. Não podemos tirar isso de 12 milhões de pessoas para dar para um Bolsa Família ou um Renda Brasil, seja lá o que for o nome deste novo programa", continuou o presidente.

Como mostrou o Estadão, Bolsonaro deu um prazo de três dias, até a próxima sexta-feira, 28, para que o ministro da Economia, Paulo Guedes, apresente uma nova proposta para o Renda Brasil, programa social que substituirá o Bolsa Família e deve ser a marca social do governo.

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Um novo encontro de Bolsonaro com ministros foi marcado para sexta, mas ainda não foi oficializado pelo Planalto. Segundo apurou o Estadão, técnicos que trabalham no desenho do Renda Brasil se reuniram nesta quarta-feira para dar início aos ajustes pedidos pelo presidente, que quer uma solução sem passar pela revisão do abono.

No início de sua gestão, Bolsonaro deu aval a uma proposta de redução do alcance do abono salarial, que foi incluída na reforma da Previdência, mas acabou sendo rejeitada pelos parlamentares. A percepção dentro do governo, porém, é que o momento político agora é outro e que o custo político da proposta da Economia é alto para quem quer elevar sua popularidade.

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