Após a reforma tributária ser aprovada na Câmara com exceções inseridas no texto na última hora, o Ministério da Fazenda mapeou pontos de atenção para os debates no Senado, principalmente relacionados a setores favorecidos com taxação menor e à distribuição das verbas do novo tributo, o que pode alongar a tramitação, disseram à Reuters duas fontes do governo.
Entre os pontos mencionados estão regimes diferenciados para os setores de transporte, turismo e esportivo, além de isenções para a cesta básica. Na distribuição de recursos, é esperada ampla discussão sobre os critérios do Fundo de Desenvolvimento Regional e também sobre a estrutura do Conselho Federativo.
Como as duas casas legislativas têm diferentes correlações de força, acordos feitos por deputados para aprovar o texto podem não necessariamente refletir interesses do Senado. Enquanto na Câmara cada ente federativo é representado por uma quantidade de deputados que reflete proporcionalmente sua população, o Senado tem três parlamentares por Estado.
Na Câmara, o Sudeste tem maior poder de voto por ser mais populoso. No Senado, esse diferencial desaparece e, ao mesmo tempo, Estados menores como os do Nordeste acabam com poder ampliado quando agrupados, por serem mais numerosos.
"Acredito que o Senado vá se debruçar sobre questões federativas, como critério de partilha do Fundo de Desenvolvimento Regional, governança do Conselho Federativo e talvez a transição na distribuição da arrecadação para os entes da federação", disse uma das autoridades que acompanham de perto a reforma.
Após pressão de governadores do Sudeste, o texto da Câmara definiu que as decisões do Conselho Federativo, responsável por administrar os recursos do novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e formado por representantes dos Estados e municípios, serão aprovadas levando em conta a maioria numérica de votos de Estados e também o fator populacional, o que reduziu o poder do Nordeste.
Em relação ao Fundo de Desenvolvimento Regional e aos recursos arrecadados com o novo imposto, o texto aprovado na Câmara diz que os critérios de distribuição dessas verbas serão definidos posteriormente em lei complementar. Em entrevista ao jornal O Globo desta quarta-feira, o relator do texto no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), indicou que pretende incluir na Constituição parte desses critérios.
EXCEÇÕES
Pouco antes da votação do texto da reforma no plenário da Câmara, foram ampliadas as exceções a setores específicos. Também houve uma redução da alíquota para regimes favorecidos, que passou de 50% da cobrança cheia para 40%.
"Ampliou bastante o setor de transportes", citou a segunda fonte como um dos pontos de preocupação. "Praticamente só ficou de fora o transporte aéreo, mas não o regional".
O texto definiu alíquota de 40% para transporte coletivo rodoviário, ferroviário e hidroviário, de caráter urbano, intermunicipal e interestadual, além de prever um regime especial para serviços de hotelaria, parques de diversão, restaurantes e aviação regional.
A proposta ainda beneficia com a redução de alíquota o setor agropecuário, produções culturais e atividades esportivas.
No caso de instituições religiosas, o projeto ampliou a isenção tributária, hoje vigente para "templos de qualquer culto", para "entidades religiosas, templos de qualquer culto, incluindo suas organizações assistenciais e beneficentes".
Em outra frente, o texto cria uma cesta básica nacional. Inicialmente, a proposta estabelece que a taxa será zerada apenas para hortifrutigranjeiros, com a cobrança de 40% da alíquota para o restante dos itens alimentícios.
Porém, a fonte ressaltou que o texto define que uma lei complementar poderá ampliar o escopo dos alimentos isentos. Hoje, os benefícios tributários à cesta básica são alvo de críticas por incluírem itens considerados de luxo ou que não fazem parte da alimentação de famílias mais pobres.
Segundo uma das fontes, o ideal é que a lista de exceções não seja ampliada no Senado, o que poderia demandar um aumento da alíquota geral para todos os setores como forma de compensação --preocupação vocalizada publicamente nesta quarta-feira pela ministra do Planejamento, Simone Tebet.
Na terça-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse ser importante o Senado limar o texto e reduzir exceções para que a reforma fique mais redonda e evite judicialização no futuro.
O texto deve começar a ser analisado pelo Senado após o recesso parlamentar, em agosto. A previsão do presidente da Casa, senador Rodrigo Pacheco (MG), é de aproximadamente dois meses de tramitação, com aprovação no meio do segundo semestre.
O alongamento da tramitação poderia ocorrer por conta da exigência de mais debates e audiências pelos senadores. Se eventualmente novos critérios e dispositivos forem adicionados ao texto, a proposta terá que retornar para nova análise da Câmara dos Deputados.