RIO - Os trabalhadores brasileiros gastarão R$ 9,6 bilhões dos saques liberados do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do PIS/Pasep em compras no comércio varejista, além de outros R$ 3,5 bilhões no consumo de serviços prestados às famílias, como alimentação fora de casa e hospedagem. Os cálculos são da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), obtidos com exclusividade pelo Estadão/Broadcast.
A liberação dos recursos extraordinários - os saques do FGTS começam na semana que vem - aumentará em 50% a taxa de crescimento do Consumo das Famílias no Produto Interno Bruto (PIB) do quarto trimestre, em comparação ao trimestre imediatamente anterior. Sem os recursos extraordinários liberados pelo governo, a estimativa da CNC para o consumo era de alta de 0,6%. Com a renda extra, a CNC prevê agora um avanço de 0,9% no consumo das famílias no último trimestre do ano.
"Cerca de 70% dos recursos serão liberados no último trimestre do ano. São mais recursos disponíveis para consumo num ambiente de inflação baixa", justificou o economista Fabio Bentes, da Divisão Econômica da CNC, responsável pelo estudo.
O impacto no PIB brasileiro só não será maior por causa do cenário internacional turbulento, que deverá fazer o setor externo contribuir negativamente para as contas nacionais. "As vendas para a Argentina caíram 40% em agosto. Isso vai bater no PIB e vai amortecer um pouco desse efeito. Não dá para esperar ainda um PIB maior de 1% (em 2019) com o cenário que vemos à frente", explicou Bentes.
A equipe econômica do governo calcula que os saques do FGTS e PIS/Pasep somem aproximadamente R$ 30 bilhões entre agosto e dezembro de 2019: R$ 28 bilhões do FGTS e R$ 2 bilhões do PIS/Pasep.
Do total de recursos, R$ 12,2 bilhões, ou 40% do total previsto para este ano, serão utilizados para a quitação ou abatimento de dívidas, e mais R$ 4,7 bilhões serão poupados ou consumidos somente em 2020, diz a CNC.
Poupança
"Uma parcela não desprezível será destinada a consumo em janeiro e fevereiro (de 2020), mas é consumo futuro, é poupança", acrescentou.
O abatimento de dívidas ainda absorverá a parcela mais representativa dos recursos, mas o porcentual é menor do que o observado na liberação de contas inativas do FGTS feita pelo governo do ex-presidente Michel Temer, em 2017. À época, 46% dos saques foram destinados a reduzir o endividamento. Desde então, o comprometimento médio da renda familiar do brasileiro regrediu.
"Uma parcela não desprezível será destinada a consumo em janeiro e fevereiro (de 2020), mas é consumo futuro, é poupança", acrescentou Bentes. "O FGTS (liberado em 2017) contribuiu para a diminuição do comprometimento da renda. Como a situação está um pouco melhor do que em 2017, esse porcentual destinado ao abatimento de dívidas tende a ser menor", disse.
Os segmentos do varejo que mais serão beneficiados pelos saques este ano serão vestuário e calçados (R$ 3,3 bilhões), hipermercado e supermercados (R$ 2,5 bilhão), móveis e eletrodomésticos (R$ 1,7 bilhões) e utilidades domésticas e eletroeletrônicos (R$ 0,9 bilhão). O trabalhador priorizará a compra de bens duráveis e semiduráveis em detrimento de bens essenciais, mesmo no setor de supermercados, que diversificaram a cesta de produtos especialmente via comércio eletrônico.
"Geralmente quando se percebe R$ 500 a mais no bolso inesperados, o consumidor não vai correr para o supermercado, ele vai a uma loja comprar um item que ele não poderia comprar num mês normal", concluiu Bentes.