Um editorial publicado nesta quinta-feira pelo diário econômico britânico Financial Times afirma que a concordata da OGX, de Eike Batista, deveria servir de aviso para que o governo brasileiro pare de interferir tanto no setor de petróleo.
Para o jornal, "o afundamento da OGX trouxe à tona a variedade de problemas que afetam a indústria do petróleo do Brasil". O diário observa que a OGX "não é a única companhia de petróleo que hoje sofre com endividamento alto e receita em baixa", lembrando que a Petrobras tem uma dívida que chega a "extraordinários" US$ 185 bilhões e que as ações da empresa caíram 30% nos últimos três anos.
O editorial afirma que "o governo só pode culpar a si mesmo por cortar as asas de uma indústria antes em ascensão". "O setor de recursos naturais é de fato um símbolo mais amplo da desaceleração de reformas que vem travando o Brasil desde que Dilma Rousseff se tornou presidente em 2011", afirma.
O texto observa que, após um hiato nos leilões de campos de petróleo entre 2008 e 2013, um leilão foi finalmente realizado neste ano, mas com regras que o jornal chama de "bizantinas", obrigando a Petrobras a operar qualquer campo na nova bacia, o que teria afastado muitas empresas estrangeiras do negócio.
Perdas enormes
Para o editorial, "a Petrobras não tem muito a ganhar com esse tratamento preferencial". "Ela precisa vender petróleo refinado abaixo de preços de mercado para ajudar a controlar a galopante inflação brasileira. As perdas para a companhia são enormes", comenta.
O Financial Times diz que "o governo está certo de demandar uma parcela dos tesouros escondidos abaixo do leito marinho". "Mas em vez de fazer uma microgestão da indústria, (o governo) deveria deixar as corporações de petróleo - domésticas e estrangeiras - prosperarem para então taxá-las para tomar uma porção de seus lucros", sugere o editorial.
O jornal diz que, em um momento de "crescimento em queda", o Brasil não pode "se permitir perder seu status de Eldorado do petróleo da América Latina". O texto observa que "a supremacia do Brasil parece sob risco" enquanto o México promove uma "ambiciosa sacudida" em seu setor energético.
"Ainda não é tarde demais para mudar de direção, mas o governo precisa mostrar que aprendeu as lições da queda de Batista. Ele não é o único no Brasil a sofrer de um ocasional excesso de confiança", finaliza o editorial.
Entenda
A OGX, empresa criada em 2007, fez a oferta inicial de ações (IPO, sigla em inglês) em junho de 2008 e levantou R$ 6,7 bilhões. O preço da ação na estreia foi de R$ 1.131. À época, a empresa arrematou 21 blocos exploratórios por meio da 9ª rodada de licitações da ANP. Em decorrência do auge da empresa, em 2011, Eike Batista atingiu o posto de 7º mais rico do mundo.
Em 2012, as críticas ao empresário começaram a aparecer. A Revista Época afirmou que o empresário tinha um ano para “entregar o que prometia” antes que os investidores desistissem da empresa. Para a publicação, o empresário construiu o império das empresas X sobre uma base que não era sólida, já que ele não possuía experiência no ramo de petróleo, prometendo metas consideradas altas, mas que suas empresas não tiveram a capacidade para entregá-las. Além disso, para alguns especialistas, Eike "abriu demais o leque", já que seus investimentos iam de petróleo até o vôlei, por exemplo.
Segundo a revista, Eike conseguiu estruturar as empresas X graças ao dom nas vendas e ao bom momento do Brasil no cenário internacional pré-crise. Porém, sua principal empresa - a petrolífera OGX - não conseguiu entregar os altos resultados prometidos, comprometendo assim as demais companhias criadas para fornecer estrutura para ela, como a OSX, por exemplo. Além disso, Batista também perdeu diversos executivos de ponta (uma das bases para ele ter credibilidade no mercado), o que fez com que ele tomasse o pior dos golpes: a perda de confiança no mercado internacional. Com isso, segundo a Época, o empresário não teve verba para reinvestir em suas empresas do ramo de petróleo.
Ainda em 2012, a crise na empresa apareceu mais notoriamente quando a OGX rebaixou a projeção de produção de barris diários nos blocos de Tubarão Azul, na Bacia de Campos, no Rio de Janeiro. O campo, que deverá interromper suas operações no ano que vem, era o único produtor de petróleo da empresa. Inicialmente, a companhia previa reservas de até 110 milhões de barris no local, mas até maio deste ano só tinha produzido 10 mil.
No ano de 2013, Eike perdeu a colocação que tinha na Forbes (passou da 8º para a centésima posição no ranking dos mais ricos) e amargou um prejuízo de R$ 1,2 bilhão na OGX, 135% maior na comparação com o ano anterior. Ele começou então a vender parte das operações da petroleira.
Em crise, Eike Batista conseguiu um empréstimo de R$ 10,4 bilhões concedido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Em outubro, a companhia anunciou que deixaria de pagar uma dívida de US$ 45 milhões (aproximadamente R$ 100 milhões) referentes a juros de bônus externos, o que gerou a expectativa de um pedido de recuperação judicial em 30 dias (nesta quinta-feira) para evitar um pedido de falência. Os juros são referentes a um empréstimo de US$ 1,063 bilhão com vencimento em 2022. No mesmo mês, a empresa demitiu cerca de 20% (60) dos cerca de 300 funcionários que ainda atuavam na companhia.
Segundo a agência de notícias Bloomberg, Batista, depois da crise, deixou de ser bilionário e agora teria menos de US$ 500 milhões líquidos (R$ 1,1 bilhão), segundo estimativa da publicação.
Crise no grupo EBX
Outros braços do grupo de Eike também enfrentam problemas. A construtora de navios OSX, muito dependente das demandas geradas pelas plataformas da OGX, deve sofrer em conjunto após o pedido de recuperação judicial da petroleira.
Em julho, Eike renunciou à presidência e do conselho de administração da MPX, empresa do setor de energia do conglomerado, que mudou de nome e passou a se chamar Eneva e é controlada pela alemã E.On. A empresa de energia também anunciou no começo da semana que firmou um contrato com bancos credores para assumir a parcela que não possui da OGX Maranhão, uma subsidiária da petroleira de Eike Batista, por R$ 200 milhões caso sua controladora, a petroleira OGX, fique inadimplente.
Segundo a consultoria Economática, apenas no primeiro trimestre de 2013, as seis companhias de capital aberto (ou seja, negociadas na bolsa) do empresário (OGX, MMX, MPX, OSX, LLX e CCX) registraram um prejuízo total de R$ 1,154 bilhão, alta de 539% em relação ao mesmo período do ano passado.
Com informações da Reuters, BBC Brasil e DW