BRASÍLIA - Os cortes de impostos e as variações do custo do petróleo no mercado internacional provocaram uma forte queda nos preços da gasolina e do diesel no Brasil - a tal ponto que, hoje, esses combustíveis são vendidos aqui mais baratos que no mercado internacional. Mas o mesmo efeito não aconteceu no gás de cozinha. Mesmo com reduções recentes anunciadas pela Petrobras no preço do produto, o botijão custa hoje no Brasil 25% mais que no mercado internacional.
Essa situação, que afeta diretamente o bolso das camadas mais pobres, tem persistido pelo menos desde abril. Os dados se baseiam nos preços internacionais que são usados como referência para calcular a defasagem diária no custo da gasolina, do diesel e do GLP, que é o gás de cozinha. A Petrobras, teoricamente, estabelece seus preços com base nessas variações externas. É a chamada "paridade internacional", ou seja, o custo praticado no Brasil deve seguir as oscilações internacionais.
No caso da gasolina e do diesel, como o preço aqui está mais baixo que lá fora, o governo federal passou a pressionar a Petrobras, nos últimos dias, para que não faça nenhum reajuste para cima neste momento, por receio de que isso prejudique o presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, em sua corrida no segundo turno, que acontece em 30 de outubro. Segundo os dados da Associação Brasileira de Importadores de Combustíveis (Abicom), para a gasolina, a defasagem está em 10%, enquanto o diesel tem valor represado em 13%.
No caso do gás de cozinha, a situação é inversa: o preço praticado pela estatal tem se mantido bem acima da média internacional. Enquanto o valor internacional correspondente a um botijão de 13 kg está estimado em cerca de R$ 39, a Petrobras pratica hoje, em seus desembarques no Porto de Santos, o valor de R$ 49,19, o que significa um preço 25% superior à referência internacional. Na casa das pessoas, o valor do botijão varia conforme o Estado, mas tem média nacional hoje, incluindo impostos e margens das revendas, de R$ 112,13, conforme acompanhamento da Agência Nacional do Petróleo (ANP).
Em agosto, Bolsonaro ampliou o valor do vale-gás, auxílio concedido a pessoas de baixa renda, de R$ 53 para R$ 110. O desembolso, que atende cerca de 5,6 milhões de famílias, é pago a cada dois meses. Um pagamento foi feito em agosto, outro está previsto para este mês e um terceiro, para dezembro.
Os anúncios de redução de preço do gás pela Petrobras têm sido bastante explorados por Bolsonaro na campanha. Nos últimos seis meses, a estatal federal fez três reduções no preço que pratica para as distribuidoras do insumo. No dia 9 de abril, o custo médio do botijão vendido para as distribuidoras saiu de R$ 58,21 para R$ 54,94. Em 13 de setembro, caiu para R$ 52,34 e, no dia 23 de setembro, para os atuais R$ 49,19. O fato, porém, é que esse valor continua bem acima do que tem se praticado em todo o mundo.
Bolsonaro tem afirmado que o governo federal fez a sua parte ao zerar os impostos que aplica sobre o gás de cozinha, e que a alta dos preços se deve a impostos cobrados por Estados e municípios, entre a chegada do insumo nas distribuidoras e a casa da população.
A reportagem questionou a Petrobras sobre os patamares que a empresa tem mantido no preço do gás. Por meio de nota, a estatal afirmou que "as cotações publicadas pela Nymex (Bolsa de Nova York) são uma referência de valor para o produto negociado no mercado americano" e que "o valor no mercado brasileiro é resultado do equilíbrio global de oferta e demanda, sendo influenciado, portanto, por outras frentes de suprimento".
A companhia disse ainda não que toma medidas para não repassar "volatilidade" no mercado nacional, apesar de os dados mostrarem que o custo do gás no Brasil está acima da média internacional desde abril, ou seja, há ao menos um semestre. "A Petrobras reafirma seu compromisso com a prática de preços em equilíbrio com o mercado, sem repassar a volatilidade conjuntural das cotações e da taxa de câmbio."
"É o pior dos mundos. A Petrobras cobra mais caro da população mais carente, que depende do acesso ao gás de cozinha, ao mesmo tempo em que alivia a vida das pessoas de renda mais alta, que consomem mais gasolina. Isso tudo sem qualquer transparência, já que o discurso da empresa segue sendo a de que o PPI (preço de paridade de importação) é essencial. Tanto não é que, na prática, não existe mais, e no caso do gás, nunca existiu", afirmou o senador Jean Paul Prates (PT-RN).