Um colosso de 31 mil toneladas de aço despertou neste ano no estado mexicano de Veracruz. Com US$ 5,2 bilhões de investimento, Etileno XXI é o maior complexo petroquímico da América Latina, onde 8% da força de trabalho é feminina.
Um marco para uma nação que na média emprega só 3,5% de mulheeres no setor da construção. Em um universo total de 28 mil trabalhadores de 29 países, a empresa pôde reverter o machismo imperante com capitações, cooperativas e um sistema para denunciar o assédio trabalhista.
Obra faraônica no meio da selva
A fábrica, à qual a Agência Efe teve acesso, parece de longe um arranha-céu, por causa de uma torre de 120 metros e outra de 102 sobressaem na paisagem do município de Nanchital.
Ela ocupa 200 mil hectares às margens do Rio Coatzacoalcos e começará a produzir etileno, matéria-prima que é transformada em “pellets”, uma espécie de bola esbranquiçada de três centímetros de diâmetro que são o produto final de um longo processo.
O volume total de “pellets” que será produzido é de 1 milhão de toneladas de polietileno de alta e baixa densidade (plástico), que resultará em uma redução de 70% das importações do material pelo México.
“Saímos da fase de construção e começamos o processo de operação. Nossa preocupação continua sendo a segurança, que as pessoas tenham consciência e reconheçam os riscos. A fábrica está cheia de fases e os sistemas estão em operação”, afirmou à Efe Eduardo Lima de Rozendo, diretor-geral da Etileno XXI.
Em 2016, se encerram cinco anos de construção do complexo, no qual foram empregados 411 mil toneladas de concreto, com as quais poderiam ser construídos 3,4 estádios de futebol como o Maracanã; 3,8 mil quilômetros de cabos que poderiam percorrer a distância entre Panamá e Houston, e uma estrutura de aço de 31,8 mil toneladas, capazes de erguer quatro Torres Eiffel.
“Durante cinco anos estivemos trabalhando para materializar uma ideia grandiosa em tamanho e impacto. Já estamos produzindo etileno, a matéria-prima deste processo”, diz Roberto Velasco, diretor industrial da Braskem Idesa.
Já estão em funcionamento grandes compressores, cujo consumo elétrico equivale ao de uma pequena cidade, e quatro dos seis fornos instalados, os maiores do tipo já construídos.
O centro de controle da fábrica possui três ilhas e dezenas de telas conectadas a cerca de 30 câmeras. De lá, os operadores observam o funcionamento dos seis fornos, de um reator biológico, de o “cracken”, local onde o etano se transforma em etileno com ajuda do vapor, e milhares de quilômetros de encanamentos.
Geradora de emprego e riqueza
O complexo gera energia elétrica para se autoabastecer, equivalente ao consumo total da cidade vizinha de Coatzacoalcos. Mil canais de rádio garantem a comunicação de todas as áreas, cujos dados criptografados passam por uma torre de comunicação própria.
A água usada, cerca de 83 mil metros cúbicos por hora, é bombeada desde a represa de La Cangrejera. Tanques de tratamento a devolvem ao rio 100% limpa.
No ápice da construção, a fábrica empregou 17 mil pessoas, com mão-de-obra total de 28 mil trabalhadores de 29 nacionalidades. Elas eram transportadas diariamente por 420 caminhões.
O complexo terá uma capacidade de processamento de 66 mil barris de etano por dia, que serão comprados pela estatal Pemex e que antes eram desperdiçados.
Com o etano recebido por um encanamento de 200 quilômetros em Villahermosa, no vizinho estado de Tabasco, serão produzidos 750 mil toneladas de polietileno de alta densidade, para capa de celulares ou tablets, próteses médicas ou qualquer outro objetivo deste material, e 300 mil toneladas de polietileno de baixa densidade, para fazer bolsas.
Os cofres do governo mexicano receberão US$ 1,5 bilhão anualmente pelo projeto, que produzirá por pelo menos 25 anos e cujos produtos serão distribuídos por quatro linhas ferroviárias e milhares de caminhões de carga.
O Etileno XXI foi liderado pela Odebrecht Engenharia & Construção Internacional. Agora está sendo operada pela Braskem Idesa, empresa mexicana formada pela brasileira Braskem (braço petroquímico do Grupo Odebrecht e maior produtora de resinas termoplásticas da América) e pelo Grupo Idesa, importante grupo do setor petroquímico no México. A fase de operação gerará 3 mil empregos diretos e indiretos.
Construir com igualdade de gênero
Além da magnitude da iniciativa, outro de seus atrativos é que, em cinco anos, 8% da força de trabalha usada na construção do local foi formada por mulheres. Em universo total de 28 trabalhadores de 29 países, se pôde reverter o machismo imperante no setor com capacitações, cooperativas e um sistema para denunciar o assédio trabalhista.
"Mediante um programa de motivação com os líderes de construção e um programa de recrutamento, alcançamos uma participação recorde de mão de obra feminina", afirmou à Agência Efe Caetano Rocha, que lidera o projeto de igualdade de gênero elaborado na construção do complexo.
No México, apenas 3,5% dos funcionários do setor da construção são mulheres, segundo números do Instituto Nacional de Estatística e Geografia (Inegi). “Estabelecemos metas concretas de porcentagens de mulheres. Tivemos que capacitar as mulheres para que se incorporassem a obra de forma segura”, afirma Rocha.
O modelo inclui um sistema de 28 caixas de correio, instaladas no local de trabalho e nas comunidades próximas, para dar resposta em um prazo de 20 dias úteis a qualquer ofensa ou queixa.
Dessa forma, foi possível solucionar controvérsias que incluíram alguns casos de assédio trabalhista ou sexual contra mulheres, que foram separadas dos homens que incorreram em condutas impróprias.
Além disso, profissionais foram buscados nas universidades. Aos estudantes de engenharia foi oferecido um horizonte profissional.
Yarizbeth Hernández Guarneros estudou engenharia mecatrônica. Seu trabalho como operadora de campo consiste em verificar níveis, regular válvulas ou colocar bombas em funcionamento. Ela garante que é apoiada por seus companheiros homens e que está satisfeita em desempenhar sua atividade.
“Fiz um curso de cinco meses e assinei contrato. Estou contente porque há muita dificuldade para encontrar trabalho. Esse trabalho só era considerado para homens por algumas supostas limitações físicas. Aqui não há diferença se você é mulher. Sempre houve respeito”, disse.
Um modelo internacional
Mas Yarizbeth não é um caso isolado. Na fábrica há outras seis mulheres que desempenham a mesma função. “No total, somos 36 de 76 trabalhadores”, explicou.
Durante a fase de construção, houve sete operadoras mulheres, 18 coordenadoras, 20 engenheiras, 34 supervisoras, 78 operárias e 37 vigilantes, postos tradicionalmente ocupados por homens.
Várias outras mulheres foram empregadas nas áreas administrativas e de serviços. Adicionalmente, foram criadas oficinas produtivas nas comunidades próximas, com 96% de presença das mulheres.
“Me ensinaram como ser empresária, a romper paradigmas, a como buscar clientes”, disse Azucena Torres, participante das oficinas.
Atualmente existem na região cinco cooperativas, que se formaram graças às oficinas. Elas confeccionam uniformes, produzem sabões e criam frangos e tilapias para venda. Com essas atividades, muitas donas de casa conseguiram mais receitas e uma independência econômica.
Luz Elvira Barragán afirma que sua vida mudou muito ao participar da cooperativa da cidade Frango de Ouro. “Somos mulheres que antes estavam só dentro de casa, agora trabalhamos para ajudar nossos maridos, filhos e netos”, afirmou Luz.
O projeto foi destacado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que participa com um empréstimo de US$ 600 milhões e considera a iniciativa como um estudo de caso.
Em comunicado, o gerente-geral do Departamento Financeiro Estruturado e Cooperativo do BID, Hans Schulz, afirmou que a “participação do BID contribuição para a elaboração de programas que garantem o equilíbrio de gênero e a criação de empregos locais”, disse.