BRASÍLIA - O governo avalia veicular em cadeia nacional de televisão um pronunciamento do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para explicar o pacote de contenção de despesas. A fala pública do ministro seria ainda nesta semana, depois do anúncio das medidas.
A ideia de um pronunciamento de Haddad para defender o pacote fiscal, segundo apurou a reportagem, partiu do Palácio do Planalto. Contenções de gastos são impopulares entre o eleitorado mais tradicional do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de esquerda e refratário à austeridade fiscal.
Haddad dedicou semanas a convencer Lula da necessidade de um ajuste. Depois, ele e o presidente passaram quase um mês discutindo os termos da contenção de despesas com os outros setores do governo. Na segunda-feira, 25, houve uma reunião "definitiva" com o presidente, afirmou Haddad.
O ministro da Fazenda disse a jornalistas que o pacote havia sido finalizado e que deve ser anunciado nos próximos dias, depois de apresentado à cúpula do Legislativo.
Anúncio pode ficar para quinta-feira
O anúncio das medidas, porém, pode ficar para quinta-feira, 26, segundo apurou o Estadão/Broadcast. Como a divulgação da proposta já foi sinalizada e adiada diversas vezes, até mesmo interlocutores que acompanham as discussões de perto preferem evitar cravar uma data.
Hoje, o Ministério da Fazenda anunciou que as atividades programadas para esta quarta-feira, 27, em comemoração ao aniversário da Secretaria de Política Econômica (SPE), foram canceladas por causa de ajustes na agenda do secretário Guilherme Mello, o que levantou a possibilidade de que o anúncio do pacote ocorresse amanhã.
Inicialmente, estavam previstas as participações de Haddad, do secretário Guilherme Mello, do secretário-executivo da Fazenda, Dario Durigan, e do secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron na abertura do evento. A previsão agora é apenas que Mello participe, na parte da tarde.
O governo está discutindo, no entanto, como fará a comunicação das iniciativas enquanto se organiza para apresentar os projetos previamente à cúpula do Congresso.
Nesta terça-feira, Haddad passou o dia em reuniões internas na sede da Pasta com a sua equipe. Embora seja grande a expectativa pelo anúncio oficial das medidas, o governo já demonstrou não ter pressa para essa tomada de decisão. O clima na Fazenda hoje foi de compasso de espera pelas reuniões para apresentar as medidas às lideranças do Congresso.
O ministro teve agenda pública divulgada tardiamente nesta terça-feira, 26, com apenas um compromisso: participação telepresencial em uma reunião extraordinária do Conselho Monetário Nacional (CMN). Na segunda, 25, ele disse que o pacote ainda seria apresentado aos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em reunião a ser marcada pela Casa Civil. O titular da Pasta, Rui Costa, cumpre agenda em Natal (RN), e ainda não há previsão de quando esse encontro ocorrerá. Mais cedo, Lira disse que ainda não foi chamado para conhecer o pacote e que essa votação tem de ocorrer neste ano.
Haddad era esperado na abertura do 99º Encontro Nacional da Indústria da Construção (Enic), em Brasília, evento do qual até o presidente Lula participou. O ministro não foi: em seu lugar, mandou o secretário de Política Econômica, Guilherme Mello, que destacou bons indicadores da economia e falou sobre a importância do setor da construção em breve discurso no evento.
Medidas
Como mostrou o Estadão/Broadcast, o pacote deve incluir mudanças nas regras para concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC), no abono salarial, na política de reajuste do salário mínimo e na previdência e pensão de militares.
Um dos pontos em discussão envolve mudar regras para concessão do BPC - um tipo de aposentadoria paga a idosos muito pobres ou pessoas com deficiência cujo rendimento familiar seja de um quarto do salário mínimo, ou, em casos excepcionais, de meio salário mínimo -, cujo gasto explodiu neste ano. A principal delas, segundo apurou a reportagem, é determinar que o Poder Judiciário não pode, ao analisar se uma pessoa é elegível ou não para receber o benefício, excluir determinadas receitas.
O objetivo é incluir na Constituição e na lei que ganhos com serviços informais - como renda com Uber, por exemplo - tenham de ser contabilizados. O governo pretende, dessa forma, fechar a brecha que permite que pessoas com rendas informais superiores às permitidas para o BPC sejam beneficiadas com o programa.
No caso do abono salarial, o Estadão/Broadcast apurou que a mudança visa à limitação do pagamento do benefício. Hoje, o abono funciona como um 14º salário e é pago para quem recebe até dois salários mínimos - entra no cálculo o número de meses trabalhados no ano e o benefício é limitado ao valor de um salário mínimo. A alteração é focalizar mais o público-alvo da medida, liberando o abono para pessoas que recebem até um salário mínimo e meio.
Embora não preveja uma alteração nos pisos de saúde e educação, o governo deverá propor, como antecipou o Estadão, um aumento no porcentual dos recursos destinados ao Fundeb que são contabilizados no mínimo destinado à educação. Hoje, essa fatia que entra na conta do piso é de 30%.
Como mostrou o Estadão/Broadcast, o pacote de corte de gastos também incluirá mudanças na regra de reajuste do salário mínimo. Em vez de um aumento que considera a inflação e o aumento do PIB de dois anos anteriores, o governo vai propor um limite seguindo os limites do arcabouço fiscal. Assim, o crescimento será de no máximo 2,5% e de no mínimo 0,6% ao ano acima da inflação.
Outra medida que deve compor o pacote é a criação da idade mínima de 55 anos para a reserva remunerada de militares, com período de transição, como mostrou o Estadão. Atualmente, o critério para aposentadoria é pelo tempo de serviço - ao menos 35 anos.
Na área das Forças Armadas, o pacote também terá o fim da morte ficta (ou fictícia) - quando militares expulsos das Forças por crimes ou mau comportamento têm garantido, às suas famílias, o direito a receber pensão. Agora, a família do militar passará a ter direito a auxílio-reclusão, tal como previsto na Lei 8.112/90, para os servidores públicos.
Ainda, deve ser fixado em 3,5% da remuneração a contribuição do militar das 3 Forças para o Fundo de Saúde, até janeiro de 2026.