A equipe econômica apresentou nesta terça-feira proposta de transferência direta de recursos a Estados e municípios de 40 bilhões de reais por três meses, em contraposição a projeto aprovado na véspera pela Câmara dos Deputados que previa aos entes cerca de 85,5 bilhões de reais por seis meses.
A medida veio após profunda insatisfação da equipe econômica com o formato do texto chancelado pelos deputados, que instituía a obrigatoriedade de a União recompor, de maio a outubro, todas as perdas com ICMS e ISS computadas na comparação com o ano passado, desenho encarado pelo ministro Paulo Guedes como um cheque em branco.
"A nossa proposta traz diversos graus de superioridade em relação ao que foi aprovado ontem pela Câmara dos Deputados", disse o secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues, em coletiva no Palácio do Planalto.
A transferência de 40 bilhões de reais integra pacote de ajuda de 77,4 bilhões de reais aos entes regionais anunciado nesta terça-feira, que inclui também a suspensão de pagamentos de dívidas junto à União, Caixa Econômica Federal e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
"Nós temos alguns caminhos, é possível que seja editada uma Medida Provisória para contemplar os elementos passíveis de serem postos em uma Medida Provisória", afirmou Waldery.
"A transferência direta, 40 bilhões, sim, é possível de ser tratada em Medida Provisória", acrescentou ele, pontuando que, com isso, os demais elementos do pacote seriam encaminhados ao Congresso via Projeto de Lei Complementar.
Questionado se o governo não buscaria negociar com os senadores mudanças no texto já aprovado na Câmara, o chefe da Assessoria Especial de Assuntos Institucionais do Ministério da Economia, Esteves Colnago, afirmou que "obviamente" haverá essa conversa.
"O Senado é uma opção, na realidade é uma opção natural porque é a segunda Casa. Então vai haver uma conversa com o Senado. Se o ajuste puder ser feito no Legislativo, ainda melhor", disse.
Os integrantes da equipe econômica ressaltaram que a ideia é que a maior parte dos recursos sejam transferidos pelo conceito per capita, com mais dinheiro sendo canalizado para locais com mais habitantes.
De acordo com o secretário-executivo da pasta, Marcelo Guaranys, isso garante alocação de forma mais efetiva para a saúde, já que o objetivo primordial da medida, segundo ele, é fortalecer os entes regionais para o combate ao coronavírus.
Pela proposta aprovada na Câmara, recebem mais os Estados e municípios que arrecadam mais tributos. Nesse modelo, o Estado de São Paulo seria o maior beneficiado (22,4 bilhões de reais), seguido por Minas Gerais (7,8 bilhões de reais) e Rio de Janeiro (5,5 bilhões de reais).
Colnago frisou a importância de a legislação prever um valor fixo de despesa, que pode ser elevado posteriormente se necessário.
"Ajuda a Estados e municípios pode ser feita por medida provisória, se 40 bilhões não forem suficientes podemos propor nova MP com novos recursos e outras finalidades", disse.
Durante a coletiva, os integrantes da equipe econômica ressaltaram que a estimativa de impacto de 85,5 bilhões de reais apresentada nesta terça-feira para o projeto da Câmara segue o pressuposto defendido pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ) --o de que haverá redução na arrecadação com ICMS e ISS na casa de 30%.
Mas eles ponderaram que, além de a compensação automática gerar um incentivo ao descuido da arrecadação estadual e municipal, não é possível assegurar que o tombo será dessa ordem em meio à crise, o que traz imprevisibilidade para a gestão orçamentária.
Também criticaram trecho do projeto que abre espaço para que Estados e municípios concedam isenções e diferimentos tributários, aumentando a conta de compensação a ser paga pela União.
BENEFÍCIO EM RELAÇÃO ÀS DÍVIDAS
Em relação à possibilidade de suspensão de dívidas dos Estados e municípios junto à União por seis meses, a equipe econômica estimou um alívio total de 22,6 bilhões de reais.
A maior parte desses recursos, contudo, já estavam assegurados por decisões judiciais. Antes da crise com o coronavírus, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Goiás já não estavam realizando esse pagamento (10,6 bilhões de reais em seis meses). Outros Estados entraram na Justiça, em meio à pandemia, para solicitar o mesmo, ganhando liminares com impacto de 9,9 bilhões de reais para o mesmo prazo.
A novidade propriamente dita virá com a extensão do benefício a outros Estados e municípios, ao custo de 2,1 bilhões de reais.
Já a suspensão de dívidas junto à Caixa e BNDES em 2020 foi calculada em 14,8 bilhões de reais.
Além dessas ações, o governo afirmou que outras iniciativas para beneficiar Estados e municípios já estão em andamento, ao custo de 49,9 bilhões de reais. Entram nesse pacote transferências fundo a fundo para a saúde, recomposição para fundos de participação dos entes, securitização de dívidas com garantia da União e prorrogação do recolhimento de PIS/Pasep e Cofins.
Sobre a proposta do Executivo, a presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, senadora Simone Tebet (MDB-MS), disse que "a conta não fecha", uma vez que os 40 bilhões de reais oferecidos não cobrem as perdas estimadas com ICMS e ISS em seis meses.
"O desafio do Senado será mediar essa conta sem qualquer disputa política, mantendo o foco no cidadão, porque a nossa resposta, ela não pode ser negativa nestes tempos de pandemia", afirmou.
(Com reportagem adicional de Gabriel Ponte e Maria Carolina Marcello)