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Haddad diz que juros do Brasil estão num 'patamar fora de propósito'

Ministro da Fazenda compara taxas e inflação do mercado brasileiro com as dos Estados Unidos e da Europa

3 jan 2023 - 09h58
(atualizado às 13h44)
Posse do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), realizada na manhã desta segunda-feira, 2
Posse do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), realizada na manhã desta segunda-feira, 2
Foto: Wilton Junior/Estadão / Estadão

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que o Brasil vive hoje o paradoxo de ter uma inflação menor que a dos Estados Unidos e de países europeus e, ao mesmo tempo, ter a maior taxa de juros real do planeta. Para ele, a taxa de juros no Brasil está num patamar fora de propósito. Ele também falou de câmbio, tema sensível para o Banco Central, que agora é independente.

"Olha o paradoxo que estamos vivendo! Uma situação completamente anômala: uma inflação comparativamente baixa e uma taxa de juros real fora de propósito para uma economia que já vem desacelerando", afirmou, numa entrevista de uma hora ao portal 247, transmitida pela internet. A taxa de juros real a que o ministro se referiu é aquela calculada acima da inflação.

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"Só não diz isso aquele que quer mal informar a população. A economia já vinha desacelerando", acrescentou, sem fazer referências diretas ao Banco Central.

Haddad foi questionado como está sendo o diálogo dele com Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e com mandato para ficar no cargo até 2024. A resposta de Haddad foi direta: "Eles sabem disso. Estão acompanhando o dia todo."

O ministro ressaltou que houve aumento brutal da taxa Selic (juros básicos da economia definidos pelo BC), de 2% para 13,75%, em decorrência do que chamou de "farra eleitoral" promovida por Bolsonaro.

Haddad queixou-se do custo dessa farra eleitoral não vir à luz com a clareza necessária.

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"Nós tivemos uma farra eleitoral de um presidente fadado ao fracasso, que desesperadamente buscou a sua reeleição e produziu uma expansão dos gastos, das isenções, que veio acompanhada de um brutal aumento de juros, que saiu de 2% para 13,75%", afirmou.

Para ele, é esse problema que deveria se estar discutindo para entender as dificuldades para o saneamento das contas públicas. Segundo Haddad, se as "peças forem encaixadas direitinhas", tomando as medidas necessárias para enfrentar esse problema, o Brasil poderá voltar a crescer com qualidade. "Com baixa inflação e baixo desemprego."

Meta de câmbio

Haddad descartou a adoção pelo governo Lula de uma meta para taxa de câmbio. Para ele, é possível atuar com "governança" das contas públicas para estabilizar e não permitir tanta volatilidade tanto no câmbio como nos juros.

"Não está em discussão ter uma meta para taxa de cambio", disse. Segundo ele, o real é uma das moedas mais negociadas do mundo devido à ação dos especuladores. "Se ela (o real) não é conversível como o Euro, o dólar, por que é tão negociada? É negociada pelos especuladores justamente em função de ter alta volatilidade", disse.

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Para ele, a volatilidade da taxa de câmbio no Brasil é um mal para a moeda brasileira porque os investidores não têm um horizonte de planejamento. A razão, disse Haddad, é com volatilidade não se consegue "planilhar" um investimento e saber com segurança qual será a taxa interna de retorno do quando mais volátil é taxa de câmbio.

"Alguém pode dizer que tem uma média. Mas, se a pessoa precisa de liquidez, ela não pode contar com a sorte", ponderou o ministro. Ele ressaltou que por essa razão a taxa de cambio e de juros são variáveis muito importantes para o investidor ter um longo horizonte de confiança no Brasil com mais previsibilidade.

"Não tem meta para essas duas variáveis. Até porque é quase impossível ter metas para coisas que respondem tão avidamente para as forças do mercado", disse.

A fala sobre o câmbio foi feita em resposta a uma pergunta sobre a contribuição que uma taxa mais baixa poderia ter para combater a inflação.

Inflação e emprego

Haddad também respondeu a uma pergunta de um dos entrevistadores do portal 247 se é possível combinar inflação baixa com bom nível de emprego. O entrevistador fez a pergunta ao ministro começando com uma referência sobre o Banco Central dos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed), que tem na sua sede uma placa que aponta a sua missão de garantir a estabilidade levando em consideração o nível ótimo de emprego.

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Haddad respondeu que o Brasil já viveu momentos de inflação e desemprego baixos. Mas ponderou que, às vezes, o cenário ajuda muito. Por exemplo, quando o mercado externo está bom e os preços dos produtos que o País exporta estão altos. "Existem condições mais e menos favoráveis. O grande mérito dos grandes governantes é aproveitar janelas de oportunidade quando o céu está azul", disse, ressaltando que esses períodos benignos não são duradouros numa economia de mercado com a especulação financeira que existe no mundo.

Segundo o ministro, há bolhas especulativas para todos os lados. Ele avaliou que a crise internacional de 2008, na prática, não acabou até hoje. "Os Estados Unidos estão com inflação alta, 7% a 8%. Têm países na Europa com inflação de 10%, o que não acontecia desde a segunda guerra mundial."

Nova âncora

Haddad disse que vai enviar a proposta de um novo arcabouço fiscal até o final do primeiro trimestre. Com esse cronograma, o novo ministro do governo Lula acredita que a partir de abril, com as comissões do Congresso já instaladas, o projeto poderá começar a ser discutido. Segundo ele, com o projeto da nova âncora fiscal, que novamente não foi detalhado, será possível colocar o País no rumo certo.

Os entrevistadores questionaram a ênfase dada pela imprensa em relação ao arcabouço fiscal em detrimento de outros assuntos. O ministro não respondeu. Ele também prometeu a partir do fim de abril começar a discutir a reforma tributária com o Congresso.

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O ministro disse que o governo do presidente eleito foi eleito para corrigir erros do governo Bolsonaro. Mas ponderou que o governo está no seu segundo dia. "Sabemos que o tempo é curto", disse.

Críticas do mercado

O ministro atribui às críticas e à do mercado no início do governo Lula ao impacto das políticas adotadas pelo governo Bolsonaro na véspera das eleições para ganhar o pleito. Esse tem sido um ponto recorrente de Haddad desde que o seu nome foi indicado por Lula para o cargo.

Para ele, a "ficha está caindo" para o mercado financeiro com o impacto que ele calcula de R$ 300 bilhões das medidas adotadas para o ex-presidente tentar a reeleição. "É o legado de Bolsonaro. Não é ataque especulativo. É que a ficha caiu", disse.

Plano de Voo

Haddad informou que a equipe econômica vai apresentar um "plano de voo" a Lula assim que o espaço da agenda do presidente abrir. Lula está recebendo muitas delegações estrangeiras com chefes de Estado e de governo, que vieram ao Brasil para a posse. Haddad previu uma ou mais dias para apresentar o plano ao presidente.

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"No meu primeiro despacho, vou apresentar o primeiro de voo ao presidente Lula de curto, médio e longo prazo. E vou apresentar um conjunto enorme de ações a ele e decisões que vai ter que tomar", afirmou. Haddad disse que Lula é muito detalhista e gosta de saber qual é o impacto de cada uma delas.

"Ele (Lula) vai concordar com parte ou discordar de outra. Ele vai querer analisar com mais calma outras tantas e é assim que ele trabalha e é assim que eu estou acostumado a fazer", ponderou. Com base na decisão a ser retomada, Haddad disse que o governo vai ter que re-estimar os indicadores.

Segundo Haddad, o governo encontrou muitas falhas e fará revisão das estimativas do que foi planejado pela equipe anterior. "Tudo vai ter que re-estimado", afirmou. O ministro informou que está nesse momento debruçado na tarefa de fazer essas reestimativas.

Sem dar detalhes , o ministro disse acreditar que o que está para o presidente Lula é bastante razoável para o nível de estrago que foi feito na economia. Mas deixou claro que o tempo de implementação e a oportunidade de fazer, Lula vai ter que "puxar para si" ouvindo a equipe econômica como um todo.

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