A Venezuela, um dos maiores exportadores de petróleo do mundo, importará petróleo.
O país confirmou a informação nesta segunda-feira, quando a estatal Petróleos de Venezuela (PDVSA) soltou um comunicado, explicando que buscará petróleo leve no exterior "devido à necessidade de utilizá-lo como diluente do petróleo pesado da Faixa Petrolífera de Orinoco 'Hugo Chávez' (FPO), já que o petróleo pesado não pode ser produzido ou transportado sem ter sido anteriormente misturado com um hidrocarboneto de menor densidade".
O comunicado vem após informações veiculadas pela agência Reuters de que a Venezuela estaria em negociações com a Argélia sobre a importação do produto e fechado a compra de dois carregamentos de petróleo leve de origem russa.
A empresa, que na década de 1980 já comprou petróleo leve para refinarias suas que ficam fora da Venezuela - não diz que esta é a primeira vez que petróleo estrangeiro entra Venezuela em 100 anos de exploração petrolífera no país.
No entanto, a PDVSA confirma o que para alguns pode ser incomum: uma potência petrolífera, que tem as maiores reservas de petróleo do mundo, agora vai importar petróleo. Por que eles vão fazer isso?
'É mais rentável'
A PDVSA diz que precisa de petróleo leve importado para responder ao aumento na produção de petróleo bruto no país no momento em que uma instalação na Faixa do Orinoco que permite deixar o petróleo pesado mais leve passa por manutenção.
A maioria das reservas de petróleo da Venezuela são de petróleo pesado, um hidrocarboneto que, para ser vendido, precisa ser melhorado com aditivos ou com petróleo leve. "A mistura de petróleo leve permite uma rentabilidade maior do que o uso de nafta (aditivo), um produto que é US$ 30 por barril mais caro do que o petróleo leve", diz a PDVSA.
A decisão do governo não surpreende alguns especialistas. O diretor do Departamento da Universidade de Petróleo de Zulia, Rolin Iguarán, disse à BBC que "pode até não ser muito bem visto um país petroleiro importando petróleo". "Mas aqui estamos falando de negócios, não de política, nem de bom gosto", disse o professor.
"Não é a primeira vez que compramos petróleo leve porque durante os anos 1980, compramos petróleo leve no México e na Rússia para nossas refinarias de fora", acrescentou.
Críticas
Mas, outros analistas se perguntam por que a produção atual de petróleo leve não é suficiente e veem a operação como uma prova de que a indústria de petróleo do país está em crise.
"A produção de petróleo no oeste do país, onde está o petróleo leve, tem diminuído nos últimos anos", disse o especialista em petróleo do Instituto de Estudos Superiores de Administração (IESA), Igor Hernandez.
"Isso ocorre porque os lugares sobre-explorados não se recuperaram devido à falta de investimento", diz ele sobre as injeções de vapor de água e gás - descritos como "caras e complexas" - que permitem a recuperação dos poços.
Hernandez cita o exemplo dos poços El Furrial no Estado de Monagas, onde estavam sendo produzidos 375 mil barris por dia em 2004 e, no ano passado, 290 mil/dia, segundo dados da PDVSA.
A petrolífera, no entanto, diz no comunicado que a sua produção de petróleo leve está "totalmente comprometida" no sistema de contratos nacionais de refino e abastecimento.
Indústria petrolífera
De acordo com o comunicado, "a produção de petróleo aumentou" e, portanto, a PDVSA foi obrigada a importar petróleo leve: o que ela produz desse tipo de petróleo não é suficiente.
No entanto, o relatório de gestão 2013 da mesma petrolífera diz que ela produziu 2,899 milhões de barris por dia naquele ano, uma queda de 11 mil barris por dia em comparação com 2012. Em 2008, a Venezuela produziu 3,26 milhões de barris por dia.
"No final, muitas das importações têm a ver com dinheiro", diz Hernandez, que atribui a queda da produção à perda de subsídios da gasolina no mercado doméstico e à venda de petróleo a preços inferiores aos do mercado para a China e os países do Petrocaribe.
"Dos 2,9 milhões de barris que estamos produzindo, 1,5 milhão só estão gerando divisas e 40% deles estão sendo transferidos por 6,3 bolívares por dólar", explicou Hernandez sobre uma taxa de câmbio que hoje é 15 vezes menor que a taxa livre do mercado negro.
Enquanto isso, Iguarán disse que "a política de petróleo do governo é coerente, com empresas mistas e acordos com outros países."
"Se você olhar para a nossa história de petróleo, você vai ver que nós nunca fomos um dos principais exportadores de petróleo leve", explica ele.
Mas Hernandez, por sua vez, diz que "não é uma questão de disponibilidade de recursos." E lembra um fato: dos 316 bilhões de barris que a Venezuela tem em suas reservas, 40 bilhões são de petróleo leve, de acordo com estudos realizados pela PDVSA. Isso é mais do que as reservas totais do Brasil ou mesmo da Argélia.