Pela oitava vez desde que o sistema de metas de inflação foi implantado no Brasil, em 1999, o alvo para o IPCA perseguido pelo Banco Central foi descumprido, sendo sete por ficar acima do teto e uma por ficar abaixo do piso (em 2017).
Em 2024, o índice ficou em 4,83%, segundo dados divulgados nesta sexta-feira, 10, pelo Instituto Brasileiro de Geográfica e Estatística (IBGE). O centro da meta é de 3%, com margem de tolerância de 1,5 ponto porcentual para mais ou para menos.
Nos últimos quatro anos, a meta foi descumprida três vezes (2021, 2022 e 2024). E a tendência é isso volte a ocorrer este ano. A mediana das previsões das instituições consultadas pelo Projeções Broadcast indica um IPCA de 5% para 2025.
Além disso, a partir deste ano, há uma mudança no regime de metas de inflação, que passa a ser contínua, e não mais relativa ao ano inteiro. Dessa forma, se a inflação ficar acima do teto ou abaixo do piso por seis meses seguidos, a meta será considerada descumprida.
Aceleração em dezembro
Os dados divulgados nesta sexta-feira pelo IBGE mostram que a inflação acelerou em dezembro, ficando em 0,52%, uma alta de 0,13 ponto porcentual em relação à taxa de novembro (0,39%).
Segundo o instituto, à exceção do grupo Habitação (que teve queda de 0,56%), os demais grupos de produtos e serviços tiveram alta em dezembro. "A maior variação (1,18%) e o maior impacto (0,25 ponto porcentual) vieram do grupo Alimentação e Bebidas, seguido por Transportes, com alta de 0,67% e 0,14 ponto porcentual. O grupo Vestuário (1,14%) teve a segunda maior variação em dezembro, após o recuar 0,12% em novembro", informa o IBGE, em nota.
No caso do grupo Alimentação e Bebidas, a alta em dezembro foi a quarta seguida. "A alimentação no domicílio subiu 1,17%, influenciada pelas altas das carnes (5,26%), com destaque para costela (6,15%), alcatra (5,74%) e contrafilé (5,49%), além do óleo de soja (5,12%) e do café moído (4,99%)", diz o IBGE. "Já as quedas em destaque foram limão (-29,82%), batata-inglesa (-18,69%) e leite longa vida (-2,53%)." Já a alimentação fora do domicílio, com alta de 1,19%, acelerou em relação ao mês anterior (0,88%).
No grupo dos Transportes, o resultado foi influenciado principalmente pelo aumento nos preços do transporte por aplicativo (20,70%) e das passagens aéreas (4,54%). "Os combustíveis aumentaram 0,70%, com as seguintes variações: etanol (1,92%), óleo diesel (0,97%), gasolina (0,54%) e gás veicular (0,49%)", segundo a nota do IBGE.
No grupo Habitação, segundo o IBGE, a energia elétrica residencial recuou 3,19%, influenciada pelo retorno, em dezembro, da bandeira tarifária verde, sem cobrança adicional nas contas. Em novembro, estava em vigor a bandeira tarifária amarela, que acrescentava R$ 1,885 a cada 100 kWh consumidos.
Reaceleração esperada
Para a estrategista de inflação da Warren Investimentos, Andrea Angelo, o IPCA de 2024 trouxe uma reaceleração já esperada dos núcleos e da inflação como um todo, com destaque para os serviços. "Temos a particularidade de serviços e dos núcleos como um todo refletindo essa piora que a gente já vem vendo nas últimas leituras. Reflete a atividade aquecida, o que dá espaço para esse tipo de reajuste em preços de serviços, com destaque para os intensivos em mão de obra", detalha.
Ela destaca que os bens industriais já refletem boa parte da depreciação cambial. "É menos sobre Black Friday e mais sobre o câmbio", afirma. A economista também destaca, por outro lado, uma surpresa baixista em carnes, que registraram alta de 5,26% em dezembro. "Tivemos uma alta mais modesta que o esperado. Devemos ter um alívio dessa pressão no primeiro trimestre, até porque o preço da arroba do boi voltou", salienta.
A projeção da Warren é de alta de 5,4% para o IPCA de 2025, com balanço de riscos assimétrico para cima.
Segundo os cálculos do Santander Brasil, divulgados em nota, as métricas de núcleos e a taxa de difusão continuam a apontar para uma taxa de inflação em torno de 6% até meados de 2025, com riscos para cima. "A média dos cinco núcleos já está próxima de 6% na média móvel trimestral anualizada e dessazonalizada, com dois componentes já neste nível", afirma o banco.
Em relação ao IPCA de dezembro, o Bradesco avalia, em relatório, que o resultado foi impulsionado pela aceleração em bens industriais (0,49%), principal surpresa para cima do mês. "O dado de dezembro seguiu pressionado em especial pela parte de bens industriais, que reflete a depreciação recente da moeda", destaca o banco. "Nossa expectativa é que tal dinâmica prossiga ainda no curto prazo", acrescenta. Por outro lado, houve desaceleração no grupo de Alimentação e Bebidas (1,55% para 1,18%), mas que ainda segue pressionada para cima, devido à alta de 6,81% em carnes.
O Bradesco afirma que continua vendo serviços pressionados, "com alguns subitens mais voláteis mais elevados neste último mês". Em serviços (0,59%), houve desaceleração pelo comportamento mais ameno de passagens aéreas. Porém, serviços subjacentes avançaram 0,66% e fecharam o ano em 5,8%, influenciado pelo subitem ligado a serviços por aplicativo./Com Gabriela Jucá e Anna Scabello