Líder da maior bancada partidária no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM) classificou como "impossível" a meta do governo Bolsonaro de aprovar na Casa até início de setembro o projeto que abre caminho para a venda dos Correios. A proposta foi chancelada pela Câmara no último dia 5, e a expectativa do Ministério da Economia é de realizar o leilão entre março e abril do próximo ano.
Para manter essa previsão, no entanto, o governo conta com um aval rápido dos senadores ao texto. Após a deliberação na Câmara, o secretário especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados da pasta, Diogo Mac Cord, afirmou que o cronograma ficaria comprometido caso o Senado não aprove a proposta até no "máximo" o início do mês que vem.
A tarefa, no entanto, pode se mostrar difícil. Os senadores decidiram primeiramente tramitar o texto na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) da Casa. A princípio, o trajeto é diferente do escolhido pela Câmara, que votou o projeto diretamente no plenário.
"Impossível (o prazo estimado no governo). A proposta tem que tramitar na CAE, as comissões estão funcionando", disse Braga. Por isso, e pelo fato de o tema ser novo para o Senado e já encontrar focos de resistência, Braga afirmou ao Estadão/Broadcast que o prazo trabalhado dentro do governo é "inexequível".
"Porque, na dúvida, você vota contra. Quer votar amanhã? Ok, se Rodrigo Pacheco (presidente do Senado) pautar, como nós temos dúvidas, votamos contra", alertou o líder do MDB, que conta com 15 cadeiras no Senado.
Além de questionar o cronograma, Braga apontou que guarda "graves dúvidas" sobre o processo de privatização da estatal. A preocupação é a mesma apontada por partidos de oposição ao governo na Câmara: a entrega de cartas em localidades distantes dos centros urbanos. Eleito pelo Amazonas, Braga afirmou que o futuro do atendimento em alguns municípios de seu Estado o preocupa, caso os Correios sejam vendidos.
O projeto aprovado pela Câmara obriga a empresa que arrematar a estatal a manter os serviços universalizados. O senador, no entanto, diz ter receio quanto ao preço que a população de cidades remotas vai acabar pagando. O texto define que as tarifas poderão ser diferenciadas geograficamente, com base no custo do serviço - trecho que a oposição tentou retirar da proposta durante a votação na Câmara, mas não conseguiu.
O governo vem afirmando que o atendimento integral - tanto de municípios lucrativos quanto dos mais custosos financeiramente - vai permitir o subsídio cruzado nas tarifas - ou seja, cobrar mais onde é lucrativo para subsidiar o preço de onde o serviço não gera lucro.
"Problema é o custo. A carta pode até chegar. Mas e o custo? Tenho graves dúvidas com relação à privatização dos Correios. Em algumas regiões do meu Estado, ainda não temos 3G, 2G. Privatizar os Correios é não reconhecer essa diversidade que existe no Brasil", disse Braga. "O problema é que a obrigatoriedade legal pode ficar inviabilizada pelo custo", continuou o senador.
Essas dúvidas também são compartilhadas por outros senadores. A decisão de o projeto passar pela CAE foi tomada em reunião de líderes na última sexta-feira, 13, em que colegas já aproveitaram para expor alguns receios quanto à proposta.
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) questionou o motivo da privatização. "Como estatal, não é o lucro o grande objetivo dos Correios, mas o bem coletivo. Não é à toa que, em todas as pesquisas de opinião sobre a importância e a credibilidade das instituições públicas e das empresas privadas, os Correios sempre aparecem no topo. Por que, então, privatizar o coletivo de afogadilho, sem sessões presenciais, sem debate com a sociedade e sem consultar a população para saber o que ela quer? Pior. No meio de uma pandemia. O Congresso Nacional, como Casa representativa da população brasileira como um todo, deveria se preocupar mais com a vontade de seu povo", disse ela.
Funcionários
Braga lembrou que o contexto é diferente do da privatização da Eletrobras, aprovada no Congresso, e cujo texto da medida provisória editada pelo governo já atendia previamente algumas das demandas do Senado. "Construímos a várias mãos com o governo. Isso não teve com os Correios", disse Braga. Não obstante, a proposta de privatização da estatal de energia passou por maioria apertada entre os senadores.
Outra preocupação relatada por Braga sobre o projeto dos Correios gira em torno dos trabalhadores, especialmente dos carteiros, e como será a absorção pelo mercado em caso de demissões. A estatal conta hoje com mais de 90 mil funcionários. Pelo texto aprovado na Câmara, os funcionários da estatal terão garantida a estabilidade por um ano e meio.
"Você tem uma mão de obra com conhecimento específico, quem vai contratar? A empresa privada? Não sei. Nos grandes centros ela poderá utilizar novas ferramentas tecnológicas, o que diminuirá muito a necessidade do conhecimento acumulado dessas pessoas. Onde não tem essa tecnologia, essas pessoas serão fundamentais. Mas dependerá da demanda. Se o preço for muito alto e não houver demanda, o que vai acontecer com eles?", questionou Braga.