"Um método de favorecer o balanço da sua empresa este ano (embora só funcione uma vez) é atrasar seus pagamentos." O que antes parecia ser apenas uma dica contábil extraída do livro "Dobre Seus Lucros", de Bob Fifer, agora é apontada nas redes sociais como um modus operandi da Americanas.
O motivo é que a obra publicada pela editora HarperCollins com o "ensinamento" informa, em sua capa, tratar-se do "livro de cabeceira de Marcel Telles, fundador da Ambev". Ao lado de Jorge Paulo Lemann e Carlos Alberto Sicupira, ele é também um dos maiores acionistas da varejista que entrou em recuperação judicial com uma dívida que supera R$ 40 bilhões.
No Twitter, usuários divulgaram trechos do capítulo 37 da obra, intitulado "Contas a pagar", que defende que os empresários devem segurar o pagamento de dívidas pelo máximo de tempo possível. "Nunca pague uma conta até que o fornecedor pergunte por ela pelo menos duas vezes", diz trecho da publicação.
A busca pelo livro atingiu seu pico no Google entre 15 e 21 de janeiro, menos de uma semana depois de Sergio Rial divulgar um rombo bilionário e renunciar à presidência da Americanas.
A publicação promete ensinar, em 78 etapas, empresários a reduzir custos, aumentar vendas e melhorar "drasticamente" os resultados das empresas em apenas seis meses.
"'Dobre seus Lucros' é o livro perfeito. Baseado nos resultados obtidos em empresas incluídas na lista das 500 maiores feita pela revista Fortune, Bob Fifer mostra como maximizar seus lucros em etapas fáceis de aplicar", diz a editora em seu site.
Economista formado pela Harvard College, consultor e gerente de treinamento empresarial, Bob Fifer escreveu o livro em 1993, e a obra logo se tornou um best-seller. De acordo com a revista Fortune, Jack Welch (1935-2020), ex-CEO da General Electric, chegou a comprar 125 cópias do livro para distribuir para os principais gerentes da empresa.
Segundo a revista Exame, a quem a editora atribui a informação de que o livro é um dos favoritos de Telles, o acionista da Americanas "costuma reler a obra a cada dois anos".
Atualmente, a varejista de Telles e seus sócios trava uma batalha judicial com os credores. Os bancos têm tentado bloquear recursos da Americanas e obter informações que apontem responsabilidades sobre o rombo.
Ainda não se sabe exatamente como a Americanas perdeu bilhões de reais. Nem mesmo as operações conhecidas como "risco sacado", que foram a origem do problema, estão esclarecidas.
O risco sacado é uma linha de crédito que faz uma triangulação entre a empresa, seus fornecedores e os bancos. Ao recorrer à operação, a companhia pede ao banco que realize o pagamento de uma compra com o fornecedor. Assim, o banco quita o contrato em nome da companhia, que passa a dever para o banco com a cobrança de juros. Essas operações não foram, porém, registradas devidamente nos balanços contábeis da empresa.