BRASÍLIA - O mercado vem semana a semana elevando as taxas de juros e câmbio no desespero pelo anúncio de medidas fiscais, mas o Banco Central (BC) não dá sinais de que atuará para conter a piora dos ativos. Mesmo com o dólar escalando em direção à marca de R$ 5,90, a autarquia tem se mantido firme na institucionalidade da política cambial. Segundo essa cartilha, intervenções devem ser raras e ocorrer apenas em momentos de disfuncionalidade ou volatilidade excessiva.
O Estadão/Broadcast apurou que, entre os operadores, não há pedidos diretos de necessidade de recursos ao BC. No total, 16 bancos têm contato permanente com a autoridade monetária, segundo uma lista publicada no site do BC. Elas costumam indicar quando há necessidade de leilões por questões técnicas. Uma "prova" de que há liquidez suficiente para os negócios, de acordo com um estrategista de mercado que trabalha para uma dessas instituições, é que o fluxo cambial não está no seu auge de robustez, mas que segue positivo — estava US$ 244 milhões até a sexta-feira da semana passada (25).
Outros operadores ouvidos sob a condição de anonimato concordam que não faria sentido uma intervenção do BC no mercado de câmbio. A depreciação da moeda é puxada pelo risco fiscal, e não por um episódio de falta de liquidez, eles explicam. Socorrer o real agora, inclusive, seria contraproducente no que diz respeito ao sinal para a necessidade de ajustes nas contas públicas, argumentam. "Não tem motivo para fazer intervenção, mesmo porque, com o dólar cada vez mais alto, maior é a chance de o governo fazer alguma coisa. Então, por que o BC iria derrubar o dólar artificialmente?", questionou um deles.
Nesta sexta-feira, 1º, o dólar passou de R$ 5,80 e a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2029 superou a marca de 13%, refletindo a piora da percepção de risco fiscal. "É uma nova pancadaria que teve início em um fim de mês, porque nada foi definido na área fiscal", comentou um experiente operador. Em terra de ninguém, de acordo com essa fonte, quem tem condições segue pressionando, mas o BC tem optado por evitar entrar no mercado. "O BC não aparece de jeito nenhum."
O motivo de uma falta de atuação vem sendo abordado pelos porta-vozes da autoridade monetária com alguma regularidade nos últimos tempos. "Deixamos a política cambial para absorver choques externos, e temos escolhido intervir no mercado muito raramente, apenas em momentos em que há disfuncionalidade ou volatilidade excessiva", explicou o diretor de Assuntos Internacionais e Gestão de Riscos Corporativos do BC, Paulo Picchetti, há uma semana, em uma reunião da XP com investidores, em Washington.
Uma semana antes, o diretor de Política Monetária e futuro presidente da instituição, Gabriel Galípolo, também afirmou que o BC estará pronto para agir quando houver necessidade, mas que, até aquele momento, não havia "nenhuma mudança do ponto de vista de institucionalidade do consumo desses dados e da lógica de atuação".
À espera do 'choque positivo'
Neste último ciclo de comunicação, os diretores vêm repetindo que o risco fiscal adicionou prêmios às expectativas e aos preços de ativos e que, sem um choque positivo nas contas públicas, não será possível diminuir a Selic. Em um evento, o diretor de Política Econômica, Diogo Guillen, reforçou que a instituição não trabalha com uma "meta" para a taxa de câmbio, mesmo que ela tenha efeito sobre a inflação importada.
Apesar de a falta de um anúncio sobre o pacote fiscal ser uma lacuna importante em termos de fundamentos macroeconômicos, um operador comentou que não há novidades pontuais que tenham levado à escalada dos juros e da moeda americana. "Temos visto muitos desmontes de operação, mas sem embasamento técnico. Mesmo algumas reações a falas (do presidente do BC) de Roberto Campos Neto que não são novas têm sido exageradas", comentou a fonte de mercado. Segundo esse operador, o mercado tem melhorado "de escada" e piorado "de elevador" nos últimos meses.