Quantas pessoas teriam coragem de reformular um negócio bilionário? Pois foi exatamente isso o que fez Reed Hastings, fundador da Netflix. Percebendo que o serviço de aluguéis de DVD estava fadado ao fracasso com a ascensão do streaming, o empresário se antecipou à queda do seu modelo de negócio e passou a oferecer para seus clientes o formato stream. Assim, a companhia preservou boa parte de seus antigos consumidores, ganhou um número ainda maior de novos assinantes e hoje fatura cifras astronômicas.
Como gerir uma empresa com poucos recursos?
Mas isso só foi possível porque, ao longo de sua trajetória, Hastings se acostumou a tomar decisões ousadas. Aos 21 anos, por exemplo, o jovem pediu dispensa do corpo de fuzileiros navais dos Estados Unidos para se juntar ao Peace Corps, programa de voluntariado que tem como objetivo promover a cultura norte-americana no exterior.
Como membro do projeto, ele foi enviado à Suazilândia, no continente africano, entre os anos de 1983 e 1985 para dar aulas de matemática, e esta experiência foi fundamental no desenvolvimento de seu espírito empreendedor. “Uma vez que você pegou carona por toda a África com apenas US$ 10 no bolso, começar um negócio não parece muito intimidador”, afirmou em entrevista à Fortune Magazine, em março de 2007.
Após retornar da missão, o jovem decidiu cursar a faculdade de Ciências da Computação. Porém, teve seu ingresso ao MIT recusado, sendo aceito apenas em Stanford, que era sua segunda opção. Em 1991, quando já estava formado e havia conseguido o primeiro trabalho na área de TI, a veia empreendedora de Hastings falou mais alto. Abandonou o emprego e fundou a Pure Sotware, focada na detecção e resolução de problemas em softwares.
A falta de experiência em gestão acabou pesando, e o jovem foi pego de surpresa quando a empresa começou a crescer rapidamente. Sentindo-se despreparado para assumir tamanha responsabilidade, ele tentou ser substituído do cargo de CEO por duas vezes, mas os pedidos foram recusados pelo conselho da empresa.
Sorte de Hastings, que se viu forçado a entrar de cabeça no ramo dos negócios e enfrentou alguns desafios que o ajudariam futuramente com a Netflix. Primeiro, ele promoveu a entrada da empresa no mercado de ações, em 1995. Nos dois anos seguintes, a Pure passou por um processo de fusão e, na sequência, foi vendida para outra empresa do ramo de TI.
Depois de conduzir estes processos com sucesso, o empresário se sentiu mais confiante para começar a pensar em uma nova empreitada. Hastings sonhava em vender algo pela internet, mas não sabia exatamente o que. A grande ideia surgiu quando ele atrasou a entrega do filme “Apolo 13” na locadora e teve de arcar com uma dívida de US$ 40.
Após estudar o mercado, Hastings se associou a Marc Randolph, que havia trabalhado com ele na Pure Software, para fudar a Netflix. Lançada em abril de 1998, a empresa oferecia aluguel de filmes por via postal e contava com apenas 925 títulos e 30 funcionários.
Modelo de sucesso
Entre as inúmeras ideias que tiveram no primeiro ano da empresa, a dupla resolveu instituir, sem muitas pretensões, um modelo de assinatura mensal. Mesmo sem se dar conta disso, a Netflix lançava as bases para o modelo de negócio que a transformaria em um império bilionário, pois as assinaturas permitiam aluguel ilimitado de obras e dispensavam inconvenientes para o consumidor, como datas de entrega e multas por atraso.
A ascensão da empresa coincidiu com a popularização dos aparelhos de DVDs nos lares norte-americanos, e Hastings soube integrar isso ao potencial da internet e do comércio eletrônico. Para completar, a empresa criou um sistema de rankeamento de títulos baseados em avaliações e resenhas dos usuários, que teve grande aceitação no mercado. Como resultado, a Netflix chegou à marca de 4,2 milhões de assinantes em 2005.
Apesar do enorme sucesso da empresa, Hastings continuou atento ao mercado de filmes e percebeu que o modelo de streaming iria substituir os DVDs, colocando em risco o futuro da Netflix. Diante desta constatação, o empresário tomou mais uma decisão radical e pegou todos de surpresa quando anunciou, em 2007, que a própria companhia passaria a oferecer um serviço em streaming, antes que outro concorrente o fizesse.
Inicialmente, o streaming servia como um “bônus” aos assinantes da empresa, que passavam a contar, gratuitamente, com mais uma alternativa para assistir aos filmes. Em 2011, quando a tecnologia de transmissão de dados avançou e o mercado de vídeos online amadureceu, a Netflix começou a cobrar pelo serviço, promovendo a migração gradual dos seus assinantes de conteúdo físico para o conteúdo virtual.
Inicialmente, o movimento levou a uma série de reações e de cancelamentos por parte dos consumidores, mas a Netflix manteve sua política firme, baseado na crença de seu fundador. Como prova de que Hastings estava certo, o faturamento da companhia cresceu mais de 60% ainda em 2011.
Em pouco tempo, o número de assinantes também voltou a subir, e já superou a barreira dos 60 milhões em mais de 50 diferentes países. Apesar do inegável impulso que o streaming deu para o crescimento da companhia nos últimos anos, o serviço de aluguel de DVDs da Netflix ainda existe e continua dando lucro, segundo informações do jornal The New York Times.
Isso só é possível porque a companhia manteve uma base de clientes em área com internet deficiente, como zonas rurais, e aprimorou processos para enxugar seus custos e melhorar o atendimento ao consumidor. Hoje, a empresa figura na 27ª posição entre as companhias mais inovadoras, segundo a revista Forbes, com 2.450 funcionários e faturamento superior a US$ 25 bilhões.