Ele sonhava com um mundo mais justo e igualitário, mas tudo o que conseguiu foi criar uma sociedade de homens com a barba aparada. Inventor do aparelho de barbear moderno, King Camp Gillette criou o que hoje é a 26ª marca mais valiosa do mundo, avaliada em US$ 20,4 bilhões pela revista Forbes. Porém, o que pouca gente sabe é que ele foi um militante socialista e que sua empresa se tornou um sucesso mundial graças à Primeira Guerra Mundial, quando forneceu aparelhos para todo o Exército dos Estados Unidos.
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Gillette nasceu em 1855, em Fond Du Lac, no estado norte-americano de Wisconsin. Logo cedo, se mudou para Chicago, tendo sobrevivido ao grande incêndio que atingiu a cidade em 1871. No entanto, seu pai perdeu tudo na tragédia, obrigando o jovem a trabalhar como vendedor para ajudar no sustento da família.
Ao longo de duas décadas, ele trabalhou para diversas companhias como caixeiro viajante. Nas horas vagas, Gillette gostava de se arriscar em pequenas invenções e militava em prol do socialismo, tendo escrito manifestos e livros defendendo a construção de uma sociedade igualitária.
Uma ideia nada descartável
Sua vida, porém, só viria a mudar radicalmente na década de 1890, quando ele trabalhava em uma empresa que fabricava tampas de garrafa. Em uma conversa, o dono da companhia sugeriu a Gillette que investisse em um produto parecido com as tampinhas que fabricava: algo que fosse jogado fora após seu uso, mas que as pessoas tivessem de adquirir novamente.
Tais palavras ficaram na cabeça de Gillette, e em 1895 ele notou que, apesar de existirem inúmeros modelos de lâmina de barbear, ainda havia espaço para aperfeiçoar o produto. Assim, passou a trabalhar em um modelo revolucionário, que desse mais segurança aos usuários e fosse descartável.
Passados quatro anos, ele apresentou a primeira patente do aparelho. No entanto, muitas pessoas o desencorajaram, afirmando que era tecnicamente impossível produzir lâminas de aço fino, duro e suficientemente barato para que fossem descartáveis. Tais argumentos não o desanimaram, e sua sorte mudou em 1900, quando ele conheceu William Emery Nickerson, que se tornou seu sócio.
Apesar da falta de tino para negócio, Nickerson era um inventor vinculado ao famoso Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês) conhecido pela capacidade em transformar ideias em realidade, e resolveu trabalhar no projeto de Gillette. No ano seguinte, era criada a Gillete Safaty Razor Company, mas as vendas foram decepcionantes, com a comercialização de apenas 51 aparelhos e 168 lâminas descartáveis.
Com as barbas de molho
Apesar do fracasso inicial, a dupla seguiu trabalhando pacientemente para aperfeiçoar o aparelho. Em 1903, Nickerson finalmente terminou de desenvolver as máquinas que viabilizaram a produção em série das lâminas e Gillette conseguiu o apoio financeiro necessário ao projeto. Com isto, as vendas da empresa dispararam, chegando a 90 mil aparelhos e mais de 12 milhões de lâminas.
Em pouco tempo, Gillette se tornou um dos homens mais conhecidos dos Estados Unidos graças à sua foto estampada nas embalagens das lâminas, que prometiam reduzir o tempo de barbear de 20 para 5 minutos. Em 1908, a companhia já contava com fábricas no Canadá, na Inglaterra, na Alemanha e na França.
Mas foi durante a Primeira Guerra Mundial que o produto se tornou um sucesso global, pois a empresa passou a fornecer aparelhos para os 36 milhões de soldados norte-americanos que entraram em combate. Tal base de clientes foi mantida mesmo após a assinatura do Tratado de Versalhes, garantindo um alto nível de vendas por muitos anos.
Socialista até o fim
Ao mesmo tempo em que via seu império econômico crescer, Gillette seguiu escrevendo obras que pregavam mudanças radicais nos sistemas econômico e social do país. Seus escritos defendiam, entre outras coisas, que todos os norte-americanos vivessem em uma cidade gigante chamada Metrópolis. Ela deveria ser construída próxima às Cataratas do Niágara, para máxima eficiência no abastecimento de água. Nesta cidade, haveria cooperação universal e nenhuma competição econômica.
Gillette morreu em 1932, um ano depois de se afastar da presidência da empresa que criou e muito longe de ver seus escritos políticos transformados em realidade. Mas se os seus ideais revolucionários foram incapazes de fazer um mundo melhor e acabaram esquecidos, não se pode negar que ele cumpriu com louvor a segunda meta que estabeleceu para sua vida: criar uma lâmina de barbear mais segura.