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Motoristas de aplicativos brancos ganham mais dinheiro do que negros, aponta estudo

Mesmo com uma jornada de trabalho igual, brancos recebem em média R$ 300 reais a mais

14 nov 2023 - 05h00
No Brasil, o rendimento médio mensal de motoristas brancos é de R$ 2.634,00, enquanto o de motoristas negros é R$ 2.287,00 - uma diferença de mais de R$ 300
No Brasil, o rendimento médio mensal de motoristas brancos é de R$ 2.634,00, enquanto o de motoristas negros é R$ 2.287,00 - uma diferença de mais de R$ 300
Foto: Getty Images

Desde 2019, o piauiense Josemar Galdino, de 39 anos, trabalha como motorista de aplicativo. “Antes era minha única renda, mas na pandemia, precisei procurar um trabalho formal”. Hoje, com um ganho em torno de R$ 600 a R$ 800 reais, em uma jornada de cinco horas diárias, Galdino faz parte dos mais de 50% de profissionais negros que constituem a força de trabalho de aplicativos para transporte pessoal e que estão abaixo da faixa média de rendimento de motoristas brancos no País.

No Brasil, o rendimento médio mensal de motoristas brancos é de R$ 2.634,00, enquanto o de motoristas negros é R$ 2.287,00 - uma diferença de mais de R$ 300, como aponta o estudo Economia de Bico no setor de transportes e entregas: desigualdades regionais e raciais da Universidade de São Paulo - USP.

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A disparidade fica ainda maior quando apontada para entregadores autônomos. Os profissionais brancos recebem cerca de R$ 550,00, e os negros R$ 430,00 em uma jornada de trabalho média de 40,9 horas semanais.

Apesar de afirmar nunca ter sofrido racismo como motorista de aplicativo, Josemar relata que percebe a diferença de tratamento para motoristas brancos e negros. “Tenho amigos brancos que pegam corridas em todos os bairros de Teresina, mas, se eu estiver em determinados locais, pode ter vários pedidos que, quando verem minha foto, eu sei que vão cancelar”, conta.

As regiões Norte e Nordeste concentram a maior parte de pessoas pretas, pardas e indígenas do País – e também as maiores disparidades de remuneração por raça na análise da economia de bico. De acordo com o sociólogo amazonense Luiz Antônio, a baixa densidade demográfica e salarial são alguns dos fatores que explicam o fenômeno.

“Os motoristas que atuam em localidades mais remotas enfrentam desafios acentuados, como uma base de clientes mais restrita e baixa densidade salarial por região. A remuneração é afetada por variáveis como o menor número de corridas disponíveis, trajetos mais curtos, remuneração inferior e custos de manutenção dos veículos”, afirma.

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Lógica ‘outside option’ na economia de bico

Do ponto de vista econômico, cenários como a forte onda de demissões durante a pandemia desencadeiam uma busca por recursos financeiros de diferentes maneiras, o que fortalece o trabalho informal. Segundo o economista Renan Pieri, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), essa configuração de trabalho é conhecida como outside option, e costuma ser comum em momentos de crise e/ou recessão.

“A outside option, lógica por trás dos aplicativos de transporte pessoal e entrega, considera a renda que alguém teria ao trabalhar fora do mercado formal. Em regiões como o Nordeste, onde a média salarial e a renda da população são mais baixas, o custo de oportunidade do mercado costuma ser menor, o que reflete na renda dos trabalhadores”, explica.

Cenários como a forte onda de demissões durante a pandemia desencadeiam uma busca por recursos financeiros de diferentes maneiras
Foto: Paul Hanaoka / Unsplash

O especialista esclarece que fatores como uma melhoria geral no mercado de trabalho, com mais vagas e salários mais altos, pode afetar a disponibilidade desses trabalhadores em serviços informais. Mas que, apesar da taxa de desemprego estar no menor nível desde 2014 (7,7 % em outubro de 2023, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a tendência é que esses tipos de trabalho continuem existindo. “Ainda existem trabalhadores que não conseguem trabalhar tantas horas quanto desejariam. Embora essa atividade não vá desaparecer, pode passar por mudanças em seu formato”, afirma Pieri.

Outro fator para a manutenção desses trabalhos no Brasil seria a regulamentação, que, para o economista, “deve ser elaborada com o princípio de continuar viabilizando essa atividade econômica”.

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“Os trabalhadores não buscam uma regulamentação semelhante à CLT, pois, em geral, eles obtêm uma remuneração superior à dos trabalhadores sob esse regime”, acrescenta.

Perfil racial

Com um rendimento médio efetivo por hora trabalhada equivalente a R$ 11,80/hora, os entregadores são os trabalhadores que apresentam a maior discrepância racial na remuneração média: entregadores brancos recebem R$ 13,50/hora e entregadores negros, R$ 10,60/hora.

Entregadores são os trabalhadores que apresentam a maior discrepância racial na remuneração média
Foto: senivpetro / Freepik

Para o recorte de raça, o estudo considerou pessoas que se autodeclararam brancas ou amarelas e negras aqueles que se autodeclararam pretos, pardos ou indígenas (na classificação do IBGE). Aproximadamente 38% dos entregadores são pessoas brancas e 62% são pessoas negras.

Com relação aos motoristas, a proporção de brancos sobe para 45%, reduzindo a participação de negros para 55%. Para os mototaxistas, a representatividade de negros é ainda maior, 76% contra 24% de brancos.

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Idade, escolaridade e jornada de trabalho

Em regra, motoristas autônomos são os mais velhos entre as ocupações estudadas (em média, 43 anos), os com maior nível de escolaridade (ensino médio completo e, por vezes, ensino superior completo) e com uma jornada de trabalho mais intensa (43,3 horas semanais).

Por sua vez, entregadores por conta própria são os trabalhadores mais jovens (em média, 34 anos), considerando as três categorias. Têm um nível de escolaridade (fundamental e/ou ensino médio completo) mais baixo do que os motoristas, porém, mais elevado do que os mototaxistas. Sua jornada de trabalho é a menor das três profissões (40,9 horas semanais), embora ainda esteja acima da média para a população ocupada em geral.

Os mototaxistas estão mais concentrados no Nordeste, com uma idade média de 39 anos e uma jornada de trabalho de 42,2 horas semanais. São os trabalhadores que apresentam um menor nível de escolaridade (fundamental incompleto ou menos).

Em nota, a Uber Brasil e a 99 Pop afirmam que os ganhos dos trabalhadores com viagens ou entregas são definidos igualmente por critérios de tempo, nível de demanda e distância de viagem, sem nenhuma diferenciação de cor, raça, gênero ou nível de escolaridade.

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Luana Ozemela, Vice Presidente de Impacto Social do Ifood, afirma que a desigualdade de remuneração é reflexo do País, mas que devem investir ainda mais em projetos educacionais, como o “Meu Diploma do Ensino Médio”, programa da companhia voltado à escolaridade de entregadores, além de melhores condições de trabalho para seus prestadores de serviço.

* Trainees sob supervisão de Karen Lemos

Fonte: Redação Terra
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