Desde 2017 vivo como um nômade digital. “Nômade” porque, assim como os beduínos do Omã ou os berberes do deserto do Saara, estou sempre em movimento e não tenho residência fixa. “Digital” porque utilizo a internet para executar meu trabalho de forma remota de qualquer lugar do mundo.
Nos últimos anos morei e trabalhei de forma remota numa dezena de países. Desde um bangalô numa ilha paradisíaca na Tailândia, passando por um apartamento histórico na Turquia que já foi sede do consulado francês no começo do século 19 e até mesmo num barco ancorado na Doca de Belém em Portugal. Na maioria das vezes, conseguindo ótimos acordos no Airbnb.
Na maior parte do tempo viver como nômade digital é tão incrível quanto parece. Você tem a oportunidade de conhecer outras culturas, pessoas, cores e sabores. No entanto, isso não significa que você é um turista em tempo integral, bebendo aperol spritz numa segunda-feira em Roma – não que eu nunca tenha feito isso, mas você entendeu.
Embora possam ser classificados como “perrengues chiques”, eles – os perrengues –, fazem parte da rotina. A internet que deixa de funcionar num país em que você não fala o idioma no dia em que você precisa entregar um projeto, o fuso-horário que te faz ficar acordado até mais tarde por causa de uma reunião com alguém que está no Brasil ou então ficar “preso” num país que fechou suas fronteiras por causa de uma pandemia.
A pandemia de Covid-19, inclusive, mostrou para muita gente que não é preciso mais um escritório físico para que seus trabalhos sejam desempenhados. Ferramentas como Zoom e Slack passaram a fazer parte da rotina de milhões de brasileiros.
Um estudo realizado pela Corona em parceria com a Box1824 e o The Summer Hunter mostrou que a quantidade de brasileiros trabalhando de forma remota subiu de 1,2 milhão em 2019, antes da pandemia, para 8,9 milhões em 2020, durante a pandemia. De acordo com a pesquisa, 94% das empresas afirmam que atingiram ou superaram suas expectativas de resultados com o home office e 73,8% delas pretendem instituir o trabalho remoto como prática definitiva após a pandemia.
Agora que tantos profissionais perceberam os benefícios do trabalho remoto, que tal trabalhar literalmente de qualquer lugar do mundo?
Neste artigo vou te contar como é a vida de quem colocou o escritório na mochila. Alguns pensamentos e dicas para você viajar o mundo enquanto trabalha de forma remota.
Tenha todos os seus documentos salvos na nuvem
Isso serve tanto para documentos de trabalho como pessoais. Não confie no disco rígido do seu laptop.
Utilize serviços como o Google Drive ou o iCloud da Apple para salvar seus projetos, comprovantes de passagens e de hospedagens, um PDF com o seu passaporte e qualquer documento que possa ser útil.
Ter um backup na nuvem significa que mesmo que algo aconteça com o seu laptop, seu trabalho e seus documentos estão seguros. Não consigo imaginar ser um nômade digital sem isso.
Esteja sempre à procura de novas fontes de renda
Isso é especialmente importante para freelancers, mas vale também para quem trabalha como CLT e precisa prospectar novos clientes.
Quando caí na estrada minha única fonte de renda eram meus freelas como redator. Ao perder um cliente, percebi que precisaria de novas fontes de renda – de preferência passivas – para que a conta fechasse.
Lancei cursos online, prestei serviço de mentoria por um tempo, escrevi um livro, fiz (e ainda faço) ações no papel de influenciador e expandi minha atuação para o mercado europeu – hoje tenho um cliente na Alemanha que me paga em euro. Tudo isso, claro, de forma remota.
Faça novos amigos
Sou uma pessoa introvertida e acredito que, como nômade digital, essa foi uma das partes mais difíceis pra mim. A questão é que o isolamento não é bom para a saúde mental – muita gente percebeu isso durante a pandemia.
Várias das minhas melhores memórias de viagens incluem amigos que fiz na estrada. Além disso, negócios e parcerias podem surgir através de novas amizades com outros nômades.
Não se sinta culpado por sucumbir a pequenos prazeres
Há um ditado popular entre os viajantes que diz que “quem converte não se diverte”. O problema é que como nômades digitais não somos turistas tradicionais. Ficamos mais tempo nos lugares, vivendo a rotina dos locais e, muitas vezes, gastando como tais.
Por mais que às vezes o orçamento esteja curto – principalmente para quem ganha apenas em real –, você não deve se sentir culpado se, vez ou outra, sucumbir aos pequenos prazeres daqueles que não convertem.
Dinheiro vem e vai. O que fica são as experiências. Se dar de presente um final de semana num resort na beira de uma praia paradisíaca na Tailândia pode doer no bolso, mas vai te fazer feliz. Não se sentir culpado por essa ostentação é um dos aspectos-chave para desfrutar dessa ostentação.
Merecemos nos presentear de vez em quando, não é mesmo?
Acumule experiências
E, falando em experiências, algo que aprendi nesses anos é a desacelerar – uns chamam isso de slow travel. Um dos maiores erros que cometi no início da minha jornada como nômade digital foi me mudar com frequência. Uma semana aqui, quatro dias ali, dois em outro lugar. Isso cansa – fisicamente e mentalmente. Logo, atrapalha o trabalho.
Hoje minha regra geral é ficar, no mínimo, 1 mês em cada lugar. Se o lugar parece bom, tem opções de lazer interessantes, uma boa culinária e o custo é baixo, fico por mais tempo.
Assim consigo ter uma experiência real no lugar onde estou; e não apenas colocar na bio do meu Instagram que estive em mais um país.
Um guia para você viver e trabalhar como e onde quiser
E aí, se empolgou com essa história de colocar o escritório na mochila? Em "Nômade Digital: um guia para você viver e trabalhar como e onde quiser", mostro o passo a passo para aqueles que estão pensando em abandonar a vida de escritório.
O livro, que foi finalista do Prêmio Jabuti 2020 na categoria Economia Criativa, desmistifica o estereótipo de “mochileiro itinerante”, revelando como se preparar para viver todos os lados desta jornada: o lado glamouroso das viagens e experiências exóticas e também o lado das dificuldades em lidar com orçamentos apertados, contratempos, trabalho remoto, além de surpresas nada agradáveis.
(*) Matheus de Souza é escritor, educador e TEDx Speaker. Autor de "Nômade Digital", livro finalista do Prêmio Jabuti.