É difícil observar os movimentos da Bolsa de Valores sem ficar intrigado. Como pode o mercado de investimentos, do qual participam tantos profissionais talentosos e altamente qualificados, alterar bruscamente sua visão de valor em um espaço de um ano ― em mais de 80% para algumas empresas? Há quem diga que o mercado é eficiente, mas às vezes ele comete excessos e simplesmente erra. A fonte desses excessos pode ser mais sutil do que imaginamos.
Em seu famoso livro “Thinking Fast and Slow”, Daniel Kahneman, ganhador do prêmio Nobel de economia, descreve a existência de dois sistemas de raciocínio que coexistem em cada cérebro humano: o sistema 1 é rápido e heurístico, responsável pelo que chamamos de intuição; enquanto o sistema 2 é lento e metódico, responsável pelo que entendemos como a racionalidade clássica.
A resposta que nos vem à mente primeiro é sempre do sistema 1. Esse método de pensamento rápido é útil em diversas situações de estresse, em que não há tempo para ponderações mais elaboradas, mas ele pode introduzir uma série de erros crônicos de raciocínio, chamados de vieses cognitivos. Um desses vieses é o de prova social, em que um indivíduo tende a imitar o comportamento que enxerga em outras pessoas ao seu redor.
O viés da prova social
Esse viés tem mais uma característica importante: ela se intensifica em situações de incerteza e estresse. Sob pressão, é instintivo buscar conselhos das pessoas que transmitam maior confiança ou simplesmente copiar o que estiverem fazendo. O problema é que o instinto julga apenas a aparência, e não qualidade da recomendação.
Quando há muitas incertezas no cenário macroeconômico, político ou no contexto em que determinada empresa está inserida, seria adequado que os investidores se mantivessem em um estado de dúvida. Porém, há sempre quem esteja disposto a discursar publicamente sobre temas incertos com extrema confiança e assertividade, seja por falta de consciência sobre as incertezas envolvidas ou por saberem que esse tipo de discurso é mais eficiente para sua autopromoção do que o estilo mais ponderado.
Em ambos os casos, a imagem de certeza é falseada, mas atrai mesmo assim os que buscam orientação para decidir o que fazer em uma situação de incerteza e estresse. Assim se iniciam os ciclos viciosos que conduzem a erros coletivos.
Primeiro, um orador autoconfiante leva a público conclusões que seriam questionáveis sob uma análise mais rigorosa, mas que apelam aos ouvintes em busca de um meio para abandonar seu estado de dúvida. O discurso conclusivo se soma à prova social de enxergar alguém defendendo o ponto publicamente, e os analistas menos rigorosos começam a adotar o novo ponto de vista.
Depois, passam a divulgá-lo também, aumentando o número de pessoas que se posicionam a favor da tese e tornando a prova social cada vez mais forte, o que passa a atrair cada vez mais pessoas e reforça o ciclo.
Notem que, nos casos reais e de grandes proporções, os discursos por trás desses movimentos não costumam ser obviamente falhos. Podem ser raciocínios elegantes, logicamente consistentes e apoiados em vários fatos e dados reais. Porém, basta exagerar a probabilidade de algumas premissas que favorecem a tese para que toda ela se torne frágil. Realizar um diagnóstico desse tipo não é uma tarefa simples, especialmente se a maioria das pessoas estiver endossando a tese.
(*) Ivan Barboza é sócio-gestor do Ártica Asset Management.