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Precatórios no Renda Cidadã não é adequado e ameaça teto

Proposta de usar recursos destinados a precatório e do Fundeb para bancar novo programa foi mal recebida por consultorias da Câmara

14 out 2020 - 14h25
(atualizado às 14h35)

Uma nota conjunta das consultorias Legislativa e de Orçamento da Câmara avalia que financiar o programa Renda Cidadã, do governo Jair Bolsonaro, usando o dinheiro reservado para o pagamento de precatórios não é adequado e compromete o teto de gastos, regra que limita o crescimento real das despesas federais.

Bolsonaro e Guedes conversam em evento em Brasília
11/12/2019
REUTERS/Adriano Machado
Bolsonaro e Guedes conversam em evento em Brasília 11/12/2019 REUTERS/Adriano Machado
Foto: Reuters

Para tirar um programa de renda básica do papel em 2021, o governo propôs adiar o pagamento de precatórios - dívidas que a União precisa pagar depois de condenação judicial - e também destinar recursos do Fundo de Desenvolvimento Nacional de Educação Básica (Fundeb).

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O modelo de financiamento do novo programa, porém, foi mal recebido pelo mercado financeiro e por órgãos de controle por ser considerado uma espécie de calote e por causa de ameaça ao teto de gastos, regra que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação, principal âncora fiscal dos gastos do Executivo.

A ideia do governo era limitar o pagamento de precatórios a 2% do total e destinar o restante para o Renda Cidadã. Além disso, uma parte do valor que a União coloca no Fundeb seria colocado no benefício. Somando essas duas despesas com o valor previsto atualmente para o Bolsa Família, o programa de Bolsonaro teria um aporte de R$ 79,2 bilhões em 2021, no cálculo das consultorias. Sem o uso do Fundeb, proposta que enfrentou resistência do Congresso, ainda sobrariam R$ 74,3 bilhões (cerca de 1% do PIB).

O perigo, porém, está na manobra de pagar uma despesa permanente apenas adiando uma dívida que vai estourar lá na frente. "De plano, do ponto de vista estritamente orçamentário, entendemos que a aprovação de PEC que limita e difere o pagamento dos precatórios e sentenças judiciais na União não pode ser considerada como fonte adequada para financiar o custeio de um programa permanente de transferência de renda - uma política de Estado -, que pela sua importância e alcance social precisa ser financiado com recursos suficientes e igualmente de natureza permanente", diz a nota.

A inviabilidade de financiar o Renda Cidadã com o pagamento de precatórios já havia sido levantada por técnicos do Congresso. Em setembro, nota das consultorias de orçamento da Câmara e do Senado reforçaram a avaliação de que a criação do programa sem a diminuição de outras despesas permanentes compromete o teto de gastos.

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Outro obstáculo para o uso de precatórios apontado agora pelos técnicos da Câmara é a necessidade de aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para usar esse recurso. Para as consultorias, a medida teria de estar aprovada na Câmara e no Senado e promulgada pelo Congresso para só depois garantir espaço no Orçamento. É o que governo deseja, mas a proposta depende de 49 de 81 votos no Senado - por onde o texto começaria - e de 308 de 513 votos na Câmara.

Líderes do Congresso avaliam a possibilidade de aumentar o recurso do programa social no Orçamento mesmo sem a PEC aprovada, condicionando a despesa à promulgação da medida. Para os técnicos da Câmara, porém, os parlamentares não podem turbinar o programa social sem a Constituição alterada. "De outra parte, enquanto a PEC não estiver promulgada, o Congresso Nacional não pode alterar as programações originais do PLOA 2021, sob pena de contrariar a Constituição", afirmam as consultorias.

Se a estratégia de alterar o Orçamento sem mexer nos precatórios pela Constituição, o governo estaria burlando o teto de gastos, na avaliação dos consultores. Aprovando a despesa sem a PEC "a peça orçamentária estará ocultando o montante real dos encargos do Estado, o que pode ser considerado artifício para descumprir o limite autorizativo previsto no § 4º do art. 107 do ADCT (teto de gastos)". Além disso, a prática abre margem para se fazer o mesmo com outras propostas em tramitação no Congresso.

A nota também pontua que a definição dos valores necessários ao pagamento de precatórios e sentenças judiciais é exclusiva do Judiciário. Adiar a liquidação das dívidas, observam os técnicos, pode levar a crime de responsabilidade do presidente de um tribunal que define os montantes. "Tratando-se de despesas obrigatórias, e enquanto vigente o atual texto constitucional, não poderá essa dotação ser objeto de cancelamento no Legislativo para atendimento de outras despesas, como no caso, para atender à ampliação do principal programa de transferência de renda do governo federal, agora sob o título de 'Renda Cidadã'."

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Para tirar o programa do papel, o governo terá que apresentar a fórmula de financiamento válida para 2021. O senador Marcio Bittar (MDB-AC), é relator da PEC que deve criar a renda básica e do Orçamento de 2021. Tanto um projeto quanto outro estão parados no Congresso Nacional. Conforme o Estadão/Broadcast revelou, o presidente Jair Bolsonaro decidiu a adiar a conclusão para depois das eleições municipais, em novembro, em uma estratégia para influenciar na disputa e evitar uma frustração no eleitorado se o valor ficar abaixo do auxílio emergencial pago durante a pandemia de covid-19 - R$ 600 e R$ 300.

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