A China deverá importar pela primeira vez 100 milhões de toneladas de soja em um ano-safra, na medida em que amplia compras para recompor seu plantel de suínos afetado por uma doença fatal para porcos, adicionando mais um fator altista para a temporada permeada por preocupações climáticas, disse um analista do Rabobank nesta quarta-feira.
"Acreditamos que eles (chineses) estão com ritmo aquecido de compras para soja em 2020/21 (outubro a setembro), e pela primeira vez chegariam aos três dígitos na importação", disse Victor Ikeda, analista de grãos do banco, citando consolidação da retomada na demanda chinesa após ela ter sido impactada pela peste suína africana em 2018 e 2019.
Ele afirmou ainda que essa demanda do maior importador global de soja deve ser baseada no consumo de mais granjas estruturadas, que tendem a usar mais farelo na composição da ração.
Já no ciclo 2019/20 a China veio com ritmo forte de importações da oleaginosa, passando de um patamar de 82,5 milhões de toneladas em 2018/19 para 97,2 milhões de toneladas.
Ele apontou também um ritmo de importação mais forte que a demanda, visando uma recuperação dos estoques locais, após problemas no início do ano em meio ao surgimento da pandemia.
"Acharam necessidade de ter um pouco para eventuais problemas na logística", disse o analista, lembrando que portos fecharam no pico da pandemia na China. "Mudou do modo compras 'just in time', para o 'just in case', em caso de ter algum problema", acrescentou.
A Reuters reportou nesta quarta-feira, com base em fontes do mercado, sobre o interesse de algumas empresas chinesas de cancelar compras de soja nos EUA, devido a uma contração nas margens. Mas o analista vê isso como pontual.
O aumento de compras chinesas, comentou Ikeda, em meio a preocupações climáticas com a safra brasileira, cujo plantio está sendo finalizado, além da forte demanda do próprio Brasil por soja e questões cambiais na Argentina, delineiam um cenário de preços para 2021 "relativamente altista, se comparar com a média dos últimos anos".
Diante disso, a perspectiva do Rabobank é que os preços da soja em Chicago tenham espaço para se manter, em média, em intervalo entre 12 e 12,40 dólares/bushel ao longo de 2021, com a possibilidade de um alta para níveis acima de 14 dólares/bushel até ao menos a entrada da próxima safra americana, se houver algum problema no clima do Brasil e Argentina.
Nesta semana, a soja está operando perto de 12 dólares por bushel, oscilando em torno dos maiores níveis em quatro anos em Chicago.
SAFRA BRASILEIRA
No dia em que o Rabobank divulgou relatório sobre perspectivas do agronegócio brasileiro para 2021, Ikeda afirmou à Reuters que o banco mantém sua projeção de safra de soja, a principal do país, em 130 milhões de toneladas, seguindo a linha histórica de produtividade, enquanto ainda não é possível estimar eventuais perdas pelo seca.
Ele ponderou que outras instituições, como o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) e a estatal brasileira Conab, têm números maiores, como 133 milhões e 135 milhões, respectivamente. "Nós, ainda de forma conservadora, mantemos 130 milhões. Vimos um atraso no plantio e tem de monitorar os meses de dezembro e janeiro, que vão ser cruciais para o desenvolvimento da lavoura", afirmou.
"Acho que poderemos ter revisões mais significativas tanto para baixo quanto para cima. Para cima é mais limitado, os mapas de meteorologia apontam para possibilidade de chuvas abaixo das médias em dezembro, janeiro e fevereiro", acrescentou, citando impactos do fenômeno La Niña.
Segundo ele, qualquer problema climático que possa ocorrer na Argentina pode levar o Brasil a exportar mais farelo e óleo de soja, o que ampliaria a demanda para o esmagamento interno, que também deverá estar sustentado por um aumento da mistura de biodiesel no diesel para 13%.
O analista do Rabobank disse ainda que a instituição acredita em aumento na área de milho do Brasil independentemente de eventuais dificuldades para se plantar a segunda safra, em meio ao atraso da soja, considerando que os preços do cereal também atingiram níveis recordes no país.
A perspectiva é que o Brasil semeie 19,2 milhões de hectares de milho na safra 2020/21 (verão + segunda safra), 4,3% mais que no ciclo anterior, com produção estimada em um recorde de 107,2 milhões de toneladas.