O sistema brasileiro de pagamentos evoluiu bastante em apenas 20 anos. Quem está acostumado com a rapidez da transferência via Pix deve se lembrar do tempo elevado e da quantidade de etapas que um pagamento por meio de cheque exigia. Estamos agora na era das carteiras digitais, que ampliam e alteram nossa relação com o dinheiro. Contudo, como toda novidade, ela exige cautela e uma boa dose de conhecimento para que seja bem aproveitada.
Mas, quais as diferenças entre o real digital, que é uma CBDC (Central Bank Digital Currency), e as criptomoedas, como bitcoin e ethereum? Para quem acha que essa ainda é uma realidade distante, saiba que, atualmente, o yuan digital, que é a CBDC chinesa, já é utilizado no dia a dia por mais de 20 milhões de cidadãos, que têm suas carteiras digitais – ou wallets – emitidas pelo Banco Popular da China (o Banco Central deles).
A União Europeia está dando os primeiros passos para isso, e os Estados Unidos estão avaliando a possibilidade de criar sua moeda digital.
O cuidado com a segurança de dados
Tudo isso está se tornando realidade, mas a segurança dos dados e a regulamentação desse universo ainda são pontos de atenção.
“O importante é haver segurança jurídica no desenvolvimento desse novo ecossistema. Os desafios impostos por uma nova economia digital que tende à descentralização são enormes e não estão restritos à regulação local”, diz Thamilla Talarico, sócia-líder de blockchain e ativos digitais da EY Brasil.
“Autoridades e reguladores do mundo inteiro debatem as implicações que esses novos modelos trazem para as leis e formas de sanção existentes. Dentre as principais preocupações estão a proteção de dados e a prevenção à lavagem de dinheiro”, completa.
Real digital não é uma criptomoeda
Há, ainda, muitas dúvidas sobre como será o real digital, mas já temos uma certeza: a versão digital da nossa moeda não tem nenhuma relação com criptomoedas, que são mais conhecidas, já que estão há mais tempo no noticiário. Como o próprio nome em inglês sugere, a CBDC está vinculada a uma autoridade central, que é o Banco Central do país correspondente, ao contrário das criptomoedas.
Enquanto a CBDC centraliza a emissão da moeda e faz o controle das transações, as criptomoedas não contam com essa regulação. Isso não significa falta de segurança nas transações de criptomoedas, pois cada uma delas é registrada na blockchain, uma rede criptografada que não pode ser modificada ou corrompida pelos usuários.
“O futuro do dinheiro não passa apenas pela mudança da materialidade, porque quase não o veremos fisicamente, mas também pela forma de lidar com ele”, destaca Talarico. “Já é possível, por exemplo, com a utilização de criptomoedas, fazer a gestão completa do próprio dinheiro, sem precisar de qualquer intermediário, como instituições financeiras. O desafio está na segurança desse processo, já que o acesso ao dinheiro é impossibilitado pela perda da senha da carteira digital. Encontramos relatos na internet de pessoas que nunca mais acessaram seus recursos porque não lembram a senha ou, ainda, de quem morreu, mas não deixou a senha anotada para os familiares”.
Alta volatilidade das criptomoedas
A precificação das CBDCs ou moedas digitais é definida pelo Banco Central, que é o órgão responsável por assegurar a estabilidade da moeda e o controle de crédito de um país, emitindo papel-moeda e fiscalizando as instituições financeiras.
“Por esse motivo, dizemos que ela tem lastro, representando uma nova expressão, a digital, da moeda corrente nacional”, observa Talarico.
Já em relação às criptomoedas, quem define sua cotação é o próprio mercado, de acordo com a lei da oferta e da procura. Quanto mais pessoas estiverem dispostas a comprar determinada criptomoeda, mais seu preço sobe. Por outro lado, caso não haja esse interesse, seu preço tende a cair.
Em janeiro deste ano, o bitcoin, que é a mais tradicional das criptomoedas, completou 14 anos de existência, tendo atingido seu maior valor em novembro de 2021, ocasião em que fechou um dos dias em US$ 69 mil. Quase um ano e meio depois, a cotação é menos da metade disso – pouco mais de US$ 28 mil –, o que demonstra sua enorme volatilidade, representando um investimento de altíssimo risco.
CBDCs têm propósitos diferentes
As CBDCs se dividem em dois tipos: as de atacado e as de varejo. No atacado, a moeda digital está voltada para transações entre instituições financeiras, com uso indireto por parte da população, que, no Brasil, poderá tokenizar seu dinheiro aplicado nos bancos. É esse o tipo escolhido pelo Banco Central do Brasil, conforme explicamos na primeira reportagem da série.
“O propósito da CBDC em nosso país é fomentar modelos de negócio inovadores, inspirando-se no mercado de finanças descentralizadas ou DeFi para viabilizar uma nova infraestrutura de mercado. Para isso, vai incorporar as tecnologias de ativos digitais para promover a tokenização de ativos e a conexão com a chamada Web3 de forma segura e regulada”, afirma Talarico.
Já a CBDC do tipo varejo é voltada para o consumidor final como alternativa ao dinheiro físico. Nesse caso, ela permite até mesmo transações digitais por quem não tem conta em instituições financeiras. Trazendo para nossa realidade, podemos dizer que o Brasil optou pelo Pix para propósito semelhante, solução que tem sido bem-sucedida e recebido atenção de outros países interessados em replicá-la.
Fonte: Agência EY