O dólar fechou em leve alta ante o real nesta sexta-feira, revertendo queda de mais cedo, com investidores demandando proteção antes do fim de semana depois de mais uma sessão instável nos mercados internacionais.
Na semana, a cotação também subiu, mas no geral o câmbio foi o mercado doméstico com melhor performance no período, marcado por queda da bolsa brasileira e disparada nas taxas de contratos futuros de juros negociados na B3, por causa de riscos inflacionários e fiscais.
O dólar à vista teve ganho de 0,25%, a 5,3331 reais. A moeda oscilou entre alta de 0,57%, para 5,3501 reais, durante a tarde, e queda de 1,13%, para 5,2600 reais, ainda pela manhã.
Na semana, a divisa ganhou 0,47%. Em setembro, recua 2,69%.
A piora de sinal do câmbio seguiu o movimento de moedas no exterior. Embora o real tenha tido desempenho mais fraco que o de alguns de seus pares neste pregão, como peso mexicano e rand sul-africano, os gráficos de taxas de câmbio mostraram o dólar se fortalecendo ante várias moedas ao longo da tarde.
No plano doméstico, operadores comentaram decisão do ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), de que o presidente Jair Bolsonaro preste depoimento pessoalmente no âmbito do inquérito que aponta suposta interferência dele na Polícia Federal. O ministro negou pedido feito pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, para que o chefe do Executivo fosse interrogado por escrito, informou o STF nesta sexta-feira.
A percepção é que a discussão sobre a agenda de reformas pode ser prejudicada conforme o presidente segue às voltas com questões de fora do âmbito econômico.
Ainda que isso tenha contribuído para alguma pressão sobre o real nesta sexta, quando comparado a ações e renda fixa o mercado de câmbio teve desempenho superior nesta semana. O Ibovespa, principal índice das ações brasileiras, caiu 2,8% na semana (conforme dados preliminares), enquanto na curva de DI a taxa do vencimento janeiro 2025 saltou quase 30 pontos-base no período.
Analistas afirmaram que o motivo que prejudicou os demais mercados --receios sobre a inflação-- ajudou a conter o dólar nos últimos dias.
O entendimento é que, com a alta nos preços do atacado saltando aos olhos, o repasse desse movimento ao consumidor pode não ser desprezível, o que reduz a "folga" para a inflação absorver nova apreciação da moeda norte-americana --apontada como um dos principais fatores para a disparada nos preços do atacado e nos alimentos.
Em agosto, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrou alta de 0,24%, maior leitura para o mês desde 2016, mostraram dados divulgados esta semana.
O mercado também percebeu o presidente Jair Bolsonaro mais preocupado com potenciais efeitos da valorização do dólar no sentimento do eleitor, depois de recente ganho de popularidade apontado por pesquisas de opinião.
Na quinta-feira, o presidente disse que o valor da moeda norte-americana está alto e que estava tendo conversas com ministros e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, sobre o que poderia ser feito para atenuar o movimento dentro das regras de mercado.
Em nenhum outro mercado relevante o dólar subiu tanto neste ano, em termos nominais, com valorização de 32,90%. Isso deixa o desalinhamento médio da taxa de câmbio no Brasil negativo em 22,0% --ou seja, o real está neste ano 22,0% mais fraco do que o sugerido pelos fundamentos, segundo estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV).
E, de acordo com Emerson Marçal --coordenador do Centro de Macroeconomia Aplicada da Escola de Economia de São Paulo da FGV(FGV EESP) e um dos autores do estudo--, esse desvio negativo provavelmente não se alterou de forma visível desde o fim de junho, período mais recente coberto pelo estudo.
"A incerteza fiscal e política tem influenciado no desvio negativo em 2020", disse Marçal em entrevista à Reuters, destacando ainda os efeitos da pandemia na economia.