No momento em que o governo de Jair Bolsonaro contraria a própria promessa que fez um dia atrás - de dobrar os investimentos em fiscalização para o meio ambiente - fazendo exatamente o oposto, com cortes drásticos no Ibama e no Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), o ministro do Meio Ambiente (MMA), Ricardo Salles, afirma que o governo tenta encontrar uma forma de recompor os orçamentos.
A nova promessa, agora, é garantir para 2021 o mesmo orçamento geral que os dois órgãos receberam em 2020. Dessa forma, não haveria corte em relação ao ano passado. Paralelamente, seriam adicionados R$ 142 milhões para bancar ações específicas de fiscalizações nos dois órgãos ligados ao MMA. Essa remessa teria o propósito de atender o que Bolsonaro prometeu ao mundo: dobrar os repasses da fiscalização.
O Estadão apurou que Salles conversou diretamente com o ministro da Economia, Paulo Guedes, e que o chefe da equipe econômica se comprometeu em recompor o orçamento do ministério, com os R$ 270 milhões pedidos. Não foi detalhado, porém, como Guedes fará isso.
O ICMBio recebeu R$ 249 milhões no ano passado. Para igualar o número neste ano, precisa de mais R$ 72 milhões, porque, neste momento, conta com apenas R$ 177 milhões disponíveis. No Ibama, o orçamento de 2020 foi de R$ 1,706 bilhão. Para este ano, porém, o que está previsto são R$ 1,650 bilhão, uma redução de R$ 56 milhões. Nos dois órgãos, portanto, são necessários R$ 128 milhões para, pelo menos, igualar os repasses de 2020 e garantir, minimamente, uma operação básica.
Além desse recurso, é preciso que o governo tire da cartola mais R$ 142 milhões para cumprir a promessa de dobrar o montante destinado, especificamente, às ações de fiscalização tocadas pelo Ibama e ICMBio.
A questão é saber de onde, afinal, sairiam esses R$ 270 milhões, com um Orçamento federal engessado, repleto de cortes por todos os lados. Para colocar dinheiro nas duas autarquias, o MMA precisa retirar recursos de outro lugar. O próprio ministério teve seu orçamento cortado na carne, com redução de R$ 213 milhões sobre o orçamento que esperava para este ano.
Questionado pelo Estadão, Ricardo Salles confirmou o buraco mencionado e disse que o governo - leia-se o Ministério da Economia - vai dar um jeito de realocar recursos, para que a pasta possa destinar os R$ 270 milhões para o Ibama e Icmbio. "O governo terá que fazer esse ajuste de R$ 270 milhões", afirmou o ministro.
A falta de compromisso do governo federal com as promessas que acabou de fazer, de frente a líderes de 40 países na cúpula do clima, capitaneada pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, fica mais evidente quando se observa alguns cortes específicos feitos nesta sexta-feira, 23.
Sem nenhum constrangimento, o governo cortou R$ 4,5 milhões que estavam previstos para o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima, que é gerenciado pelo MMA e que lida, como o próprio nome diz, com prioridades do Brasil para reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
A reportagem questionou o Ministério da Economia sobre o arrocho aos órgãos. A pasta chefiada pelo ministro Paulo Guedes se limitou a dizer que seus cortes se aplicaram sobre o valor total do orçamento do MMA, incluindo emendas feitas no Congresso Nacional. Dessa forma, justificou, ele teria até ampliado um pouco a proposta original. "No âmbito da Secretaria de Orçamento Federal não houve redução do valor proposto pelo Poder Executivo", declarou.
O valor total alocado para o Ministério do Meio Ambiente e suas autarquias era de R$ 2,047 bilhões, o que foi elevado para R$ 2,322 bilhões no Congresso, uma diferença de R$ 275,3 milhões. "O valor total do veto foi de R$ 239,8 milhões, que é inferior ao valor acrescido pelo Congresso Nacional", declarou.
Hoje, o Ibama e o ICMBio estão sem recursos para realizar atividades básicas, com atraso recorrente de salários de terceirizados, falta de dinheiro para comprar combustível e pagar diárias de servidores.