BRASÍLIA - O Senado aprovou o texto principal do projeto de lei complementar que faz parte do pacote de corte de gastos apresentado pelo governo Lula. O texto recebeu apoio até mesmo da oposição, que ainda tentou mudar a proposta, mas apoiou o texto-base, após ser desidratado na Câmara.
O projeto do pacote fiscal foi aprovado por 72 votos a 1 - apenas o senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) votou contra. A oposição orientou a favor dizendo ser favorável ao corte de gastos, ainda que considerando o pacote do governo como insuficiente para a sustentabilidade das contas públicas.
Os senadores analisam agora os destaques (sugestões de mudanças ao texto principal). Após a conclusão da votação, o texto vai à sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O projeto cria novos gatilhos para reforçar o arcabouço fiscal e permite o uso de recursos parados em fundos públicos para abater a dívida pública. Ainda na Câmara, o projeto foi desidratado impedindo o governo federal de cortar emendas parlamentares impositivas (obrigatórias) para cobrir gastos obrigatórios e cumprir o limite de despesas.
A proposta também revoga a lei que instituiu o Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito (SPVAT), antigo DPVAT. O Novo DPVAT foi aprovado no Congresso em maio e sancionado no mesmo mês pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), apresentou uma proposta para alterar o projeto e forçar o governo a perseguir o centro da meta fiscal (com déficit zero nas contas públicas, sem as bandas de tolerância atual), com contenção de gastos em caso de resultado negativo e de aumento da dívida pública. De acordo com a assessoria do parlamentar, a proposta cortaria R$ 120 bilhões em despesas em um ano.
Desde o início da tramitação, o governo avaliava que o pacote passaria de forma mais fácil no Senado - os principais impasses foram enfrentados na Câmara. O pacote só andou, no entanto, após pagamento de emendas parlamentares que estavam travadas após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e mais promessas de liberações até o fim do ano.
Projeto aciona novos gatilhos ao arcabouço fiscal, mas só a partir de 2027
O projeto aprovado cria "reforços" ao arcabouço fiscal, prevendo disparo de novos gatilhos para congelamento de gastos em caso de piora das contas públicas. O ajuste, porém, só valerá a partir de 2027, no próximo mandato presidencial.
Um dos gatilhos do projeto prevê que, em caso de déficit primário a partir de 2025, será proibido a concessão, ampliação ou prorrogação de benefícios tributários. Além disso, haverá limitação de crescimento no gasto com pessoal em 0,6% ao ano acima da inflação - o piso do aumento de despesas estabelecido pelo novo arcabouço fiscal. Como o déficit será calculado em 2026, o gatilho valeria para 2027.
Outro gatilho determina que, em caso de redução nominal das despesas discricionárias (não obrigatórias, como investimentos e custeio), a partir de 2027, haverá essa restrição para benefícios tributários (tal qual ocorre em caso de déficit primário) e a mesma limitação para o crescimento de despesas com pessoal.
A proposta aprovada também determina que a criação ou prorrogação de benefícios da seguridade social ficam limitadas às regras de crescimento do arcabouço, ou seja, com teto máximo de 2,5% ao ano.
Uma das medidas proposta pela equipe econômica, contudo, caiu ainda na Câmara: a que limitava a restituição de créditos tributários pelas empresas. A proposta enfrentava forte resistência entre vários setores da economia, além de ter integrado uma Medida Provisória (MP) editada pelo governo em junho e que foi devolvida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Superávit de fundos para pagar dívida
A proposta aprovada estabelece que, entre 2025 e 2030, o superávit financeiro de fundos públicos só poderá ser usado para amortizar a dívida. O projeto do governo previa que o uso dos recursos seria de livre aplicação, o que foi amplamente criticado por economistas, como mostrou o Estadão, uma vez que abria margem para ampliar gastos.
Na proposta do governo, eram oito fundos listados, mas o relator manteve apenas cinco: os fundos de Defesa de Direitos Difusos (FDD), Nacional de Segurança e Educação de Trânsito (FUNSET), do Exército, Aeronáutico e Naval. Foram excluídos o Fundo Nacional Antidrogas (Funad), o Fundo da Marinha Mercante (FMM) e Fundo Nacional de Aviação Civil (FNAC) com a justificativa de que seus recursos "são utilizados para importantes investimentos".