A Track & Field, rede varejista de moda esportiva, pretende manter neste ano o ritmo de aberturas de lojas de 2020, quando foram inaugurados 35 pontos de venda, a maior marca dos últimos cinco anos. O foco serão cidades de pequeno e médio portes e pontos de vendas na rua. Essas lojas mais pulverizadas pelo País vão apoiar a estratégia de digitalização da varejista que também planeja um novo centro de distribuição na capital paulista. Maior e mais tecnológico, o novo CD e os pontos de venda vão dar agilidade às entregas das vendas online, que mais que triplicaram no ano passado.
A intenção da companhia, que abriu o capital na Bolsa em outubro e passou por uma profunda digitalização nos últimos meses, é estar cada vez mais próxima do novo consumidor que nasceu com a pandemia - brasileiros de classe média que migraram para cidades do interior e litoral e adotaram um estilo de vida mais saudável.
Segundo Fred Wagner, sócio-fundador da empresa e membro do Conselho de Administração, houve uma mudança drástica no guarda roupa do brasileiro que, trabalhando em casa, passou a usar roupas mais confortáveis. "Nós conseguimos nos posicionar nesse share of closet (parte do armário)", diz o executivo.
Para isso, a empresa ampliou a grade de tamanhos para GG e PP, a fim de conquistar pessoas que nunca tinham usado uma roupa esportiva antes, e também aumentou a possibilidade de cores, por exemplo. "Conseguimos capturar isso de forma importante", diz o executivo.
Esse resultado apareceu no último trimestre do ano passado, quando a empresa mais que dobrou o lucro líquido ajustado, de R$ 10,3 milhões entre outubro e dezembro de 2019 para R$ 22 milhões no mesmo período de 2020. No ano inteiro de 2020, o lucro líquido ajustado foi de R$ 29 milhões, uma cifra 20,2% menor do que em 2019. A maior fatia desse resultado foi atingida no último trimestre de 2020, quando 98% das lojas da rede estavam abertas.
Fernando Tracanella, diretor financeiro, ressalta que, apesar das adversidades do ano de 2020 por causa da pandemia, até o terceiro trimestre a empresa acumulou lucro líquido ajustado de R$ 7 milhões. "Não ficamos no prejuízo e com a reabertura das lojas conseguimos um resultado operacional que cresceu mais de 30% na receita no último trimestre."
O diretor financeiro explica que a comparação mais adequada é olhar o lucro líquido ajustado, que exclui da base um grande crédito tributário que inflou o resultado da companhia no último trimestre de 2019. Sem esse ajuste, o lucro líquido da varejista em 2020 foi de R$ 25,8 milhões, um resultado 50,3% menor em relação a 2019.
A receita líquida de vendas da varejista no último trimestre de 2020 atingiu R$ 121,4 milhões, com crescimento de 34,4% ante o mesmo período de 2019. No ano inteiro de 2020, as vendas somaram R$ 267,3 milhões, com recuo de 3,2%.
"Cair só 3,2% é um resultado muito positivo", afirma do consultor de varejo da Mixxer Desenvolvimento Empresarial, Eugênio Foganholo. O consultor lembra que o varejo de vestuário foi um dos mais castigados pela pandemia porque dentro de casa a necessidade de comprar esses itens diminuiu.
No ano passado, o volume de vendas de vestuário tecidos e calçados como um todo recuou 12,9% em relação ao ano anterior, segundo a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ao registrar uma queda menor nas vendas comparado com o setor, a empresa ganhou participação de mercado, observa Fohganholo.
E-commerce ganha força
Um dos pilares da companhia, que ganhou força em 2020 e que deve continuar este ano, é a grande capilaridade. Presente em mais de 100 cidades brasileiras com 260 lojas, a varejista fincou bandeira em 20 novos municípios no ano passado, a maioria de pequeno e médio portes. "Temos visto um grande interesse de franqueados em abrir lojas este ano em cidades menores. Estamos com pipeline bem aquecido, apesar de todas as dificuldades", diz Tracanella.
A companhia ingressou no e-commerce em 2009, mas o grande salto, assim como no restante do varejo, aconteceu em 2020. No ano passado, a venda online respondeu por 8% do faturamento no quarto trimestre, uma fatia bem maior que no início do ano, quando não havia pandemia. No entanto, as vendas influenciadas digitalmente, isto é, que incluem as transações feitas por meio de redes sociais e são afetadas de forma digital, como mensagens de texto, WhatsApp e e-mail, por exemplo, responderam por 38% dos negócios no quarto trimestre de 2020, ante 8% em no mesmo período de 2019.
Wagner, acredita que essa tendência digital veio para ficar e diz que a companhia está cada vez mais antenada com os negócios online, implementando a omnicanalidade (presença em vários canais, sejam eles online ou físicos), que permite uma grande confluência entre o mundo físico com o digital. Uma das ferramentas de engajamento do consumidor são os eventos virtuais, como corridas promovidas pela varejista. Além disso, no terceiro trimestre a empresa deve inaugurar uma loja de experiência no Shopping Iguatemi, em São Paulo, para conquistar o consumidor que procura uma vida mais saudável.
Desafio
"O estilo de vida quarentena/pandemia ajudou a Track & Field, ao contrário do que vem ocorrendo com as lojas de calçados e maquiagem", afirma o presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), Eduardo Terra. Ele lembra o Grupo Soma, dono das lojas de vestuário Farm e Animale, que também abriu o capital no ano passado, é outro que foi beneficiado por esse novo estilo de vida mais despojado.
No entanto, o consultor ressalta que para ter sucesso neste momento desafiador do varejo, com o novo fechamento de lojas físicas por causa da pandemia, é preciso ter uma combinação de produto e marca adequadas com vendas digitais consistentes. "Companhias de varejo especializado que têm apresentado resultados importantes na pandemia são as que têm um digital relevante."
Com boa parte das lojas fechadas neste momento, o desafio, segundo Terra, é acelerar ainda mais as vendas digitais para atravessar um primeiro trimestre no qual as lojas físicas devem sofrer muito.