O governo federal abriu mão de arrecadar R$ 525 bilhões em impostos para os cofres públicos em 2022. As renúncias fiscais aconteceram em diversas circunstâncias, como para executar políticas públicas, para fomentar setores específicos ou ainda por pressão de categorias e empresas.
A gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já sinalizou que pretende acabar com isenções que considera como "privilégios tributários", ou seja, que beneficiem poucos, para aumentar a arrecadação aos cofres públicos e garantir a eficiência do novo arcabouço fiscal.
A soma dessas renúncias fiscais, incluindo todas as isenções, anistias e remissões, foi de R$ 525.490.023.901 em 2022, segundo nota técnica mais recente divulgada pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais (Unafisco). Esses valores são divididos em categorias
O montante foi dividido e classificado em duas categorias pela Unafisco. Veja abaixo:
• Os gastos tributários com contrapartida social e/ou econômica somaram R$ 158.229.457.504 (30% do total);
• Os privilégios tributários somaram R$ 367.260.566.397 (70% do total);
O que são essas renúncias fiscais?
Conforme a avaliação publicada pela entidade, 30% do total são de gastos tributários com contrapartidas social ou econômica. Isto é, são impostos que deixam de ser pagos por quem deve para que algum benefício seja trazido à população brasileira.
Nesta soma, entram descontos para pessoas com deficiência comprarem automóveis, transporte escolar e até doações de bens para entidades filantrópicas. O governo Lula nunca mencionou ter intenção de rever essas isenções.
Por outro lado, os 70% restantes dos impostos não arrecadados foram considerados pela Unafisco como privilégios tributários. Ou seja, não trazem benefícios para a sociedade e beneficiam grupos que não precisam de incentivos ou auxílio governamental.
União não deve decidir sozinha, diz especialista
O vice-presidente de Relações Governamentais da empresa de consultoria especializada na área tributária Becomex, Diogo Wakizaka, aponta para a necessidade de analisar, com cuidado, os privilégios tributários e seus impactos antes de condená-las. "O grande ponto é esse: não é olhar o benefício em si e achar que ele é o problema. É enxergar o quanto ele está atingindo a finalidade a que ele se propõe", analisa.
Na visão de Wakizaka, a União não deve tomar decisões sobre alterações ou reformas tributárias sozinha. "É mais importante o governo chamar as empresas e a sociedade para uma discussão em relação aos pontos que têm maior chance de sucesso e dialogar", diz.
Isso porque os benefícios, isenções ou privilégios tributários têm, quando propostos, objetivo de fomentar ou incentivar investimentos em uma área de atuação específica, por exemplo. Retirá-los sem estudo de impacto pode aumentar a captação de recursos aos cofres públicos no curto prazo, mas pode desestimular o crescimento econômico nos setores afetados em um prazo maior.
Os dez maiores privilégios tributários
• Isenção dos lucros e dividendos distribuídos pelas empresas: R$ 58,9 bilhões
Os dividendos são uma parte dos lucros de uma empresa que são distribuídos entre os acionistas como uma forma de remuneração. Atualmente, no Brasil, os dividendos são isentos do Imposto de Renda na fonte e também não entram na base de cálculo do IR de quem recebeu.
O governo federal já anunciou que pretende alterar regras para tributar os dividendos, compensando com redução do imposto corporativo. A proposta, no entanto, só deve entrar em discussão na segunda fase da reforma tributária.
• Ausência de imposto sobre grandes fortunas: R$ 57,9 bilhões
O imposto sobre grandes fortunas, ou IGF, é um tributo previsto na Constituição Federal, mas que até hoje não foi regulamentado. Ou seja, não pode ser cobrado enquanto uma Lei Complementar não for aprovada. O governo Lula não é claro sobre suas intenções neste assunto, mas esse foi um mote de sua campanha presidencial na época das eleições.
• Zona Franca de Manaus: R$ 44,8 bilhões
A Zona Franca de Manaus é um parque industrial na capital amazonense criada pelo governo brasileiro para atrair fábricas para uma região pouco habitada. É uma área de livre comércio de importação e exportação e de incentivos fiscais especiais. A gestão atual já deixou claro que não irá rever os privilégios da região.
• Simples Nacional R$ 32,7 bilhões
O Simples Nacional é um sistema de tributação simplificada que facilita o recolhimento de contribuições das micro e médias empresas brasileiras. O governo federal não tem intenção de alterar a maneira como essa tributação é feita.
• Refis: R$ 25,4 bilhões
O Programa de Recuperação Fiscal (Refis) tem como objetivo colocar em dia a situação financeira de empresas e pessoas físicas junto à União ou à Receita Federal, reduzindo o valor de multas e parcelando valores de débitos inscritos em dívida ativa ou não.
O programa é defendido pela atual gestão, então nenhuma alteração significativa deve ser discutida.
• Desoneração da cesta básica: R$ 24,1 bilhões
Por lei, algumas contribuições tributárias são zeradas a itens alimentícios e de higiene considerados básicos. A isenção tem como objetivo tornar os itens básicos como mais acessíveis à população, e inclui carnes, peixes, sabonete, papel higiênico e mais itens.
O governo federal já deixou claro que não tem interesse em alterar a legislação para onerar os itens básicos.
• Desoneração da folha de salários: R$ 12 bilhões
A desoneração da folha de pagamento substitui a contribuição previdenciária sobre a folha de pagamento pela contribuição sobre a receita bruta da empresa. É uma forma das empresas pagarem menos em impostos e fomentar áreas em que mão de obra seja o principal ativo da empresa, como o ramo de serviços.
A equipe econômica do governo federal estuda alternativas para a tributação atual.
• Entidades filantrópicas: R$ 10,9 bilhões
O governo federal já declarou que não tem intenção de onerar entidades filantrópicas, como as Santas Casas.
• Exportação da produção rural: R$ 9,7 bilhões
Ainda não há uma definição sobre a intenção do governo Lula sobre a taxar o agro, mas a equipe econômica já sinalizou, anteriormente, que há problemas na exportação da produção rural.
• Informática e automação: R$ 7,5 bilhões
Os incentivos ao setor da informática e automação são defendidos pela atual gestão — por isso, é provável que não vejamos nenhuma proposta no sentido contrário.