Depois de um ano sabático para se recuperar de um burnout, Fernanda Ribeiro, 39, encontrou em sua pele, em sua cor e nas vivências de pessoas próximas um motivo para empreender. Começou com a AfroBusiness, uma rede de empreendedores liberais pretos, fundada em 2017, e, hoje, seu trabalho se amplifica para o mercado financeiro, um espaço tradicionalmente ocupado por homens brancos.
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Ela é CEO da Conta Black, negócio que descreve como um “hub de produtos e serviços financeiros”. A empresa nasce em 2018 com o intuito de ser uma instituição financeira que olha para o público preto e periférico sem discriminação.
“Um dos nossos sócios, que sempre foi um empreendedor, e quando ele precisou de crédito, ele teve o crédito negado. E daí você pode imaginar que ele estava negativado ou tivesse algum problema, mas não”, conta Fernanda, relembrando uma história que aconteceu há mais de 15 anos e funcionou como uma semente para a criação da Conta Black.
Anos depois, já atuando na AfroBusiness, histórias parecidas apareceram. “Quando começamos a interagir com outros empreendedores pretos, a gente vê que eles passavam exatamente pela mesma situação. Tinha o crédito negado, não conseguiam abrir contas, e a partir daí a gente tem a ideia de, junto a outros sócios, abrir a Conta Black”, diz.
Hoje, o hub financeiro tem mais de 60 mil clientes pelo País. Desse total, Fernanda afirma que cerca de 70% são mulheres e 80% são pretos. Para ela, a base de clientes da instituição “reflete o Brasil”.
Qual diferencial da Conta Black
Assim como qualquer outra instituição financeira, para ter um cadastro na Conta Black é preciso seguir alguns critérios, a exemplo de apresentar documentos. Além disso, um pedido de crédito não é feito em um dia e aprovado no outro, também há fatores a serem analisados como em outros bancos. A diferença, porém, “é a intencionalidade” da empresa, afirma Fernanda.
“A gente quer entrar e entender as especificidades do nosso cliente para, assim, conseguir ofertar produtos que atendam às suas necessidades”, diz.
Ela complementa que a empresa montou algumas linhas de crédito voltadas para o seu público principal: empreendedores periféricos. E, por enquanto, ainda está em expansão planos de crédito voltados para pessoas físicas.
No DNA da empresa, os cargos de lideranças são majoritariamente ocupados por pessoas pretas. Fernanda afirma que há, sim, pessoas não negras trabalhando na Conta Black, mas elas são as protagonistas.
“Eu milito sempre pela diversidade corporativa e, ao fundar a minha empresa, seria totalmente desconexo não trazer esses valores para cá”, considera.
A empresa leva a sério os compromissos que firma e a sua missão social. No último semestre, por exemplo, a instituição financeira lançou um curso para assessores de investimentos pretos, 100% gratuito. A ação foi feita em parceria com o Banco Genial e a TopInvest.
Metas para o futuro
Fernanda já vinha atuando como executiva há muitos anos, na área de comunicação interna em uma empresa. Foi quando veio o esgotamento e foi parar no hospital, diagnosticada com burnout. “Eu trabalhava, em média, 14, 18 horas por dia”, relembra.
Naquela época, Fernanda considerava ter alcançado a estagnação na carreira. Não tinha mais para onde crescer, mesmo entregando tudo de si. “Por ser uma mulher negra, eu sempre entregava três, seis vezes mais, e isso acabou me levando para o burnout.”
Do dia em que teve a crise e foi hospitalizada até pedir demissão do emprego em que estava se passou 1 ano. Nesse período, a executiva buscou montar um planejamento financeiro para que pudesse ficar um ano sem trabalhar, em uma transição de carreira. Ela buscou cursos, procurou entender melhor o seu trabalho e se dedicou a “entender quem era no mundo”.
Daí, no final desse ano sabático surgiu a AfroBusiness e, no seguinte, a Conta Black. Agora, no âmbito pessoal, para os próximos anos, Fernanda já planeja mais uma transição. Quer voltar a estudar, fazer um mestrado ou investir em pesquisas. Será uma oportunidade de levar sua experiência profissional para o mundo acadêmico.
“Acho que eu quero fazer novas coisas. Eu acho que eu tenho um instinto muito de transformar, de tentar fazer micro mudanças dentro do meu entorno”, diz.