Dez anos do 7 a 1: goleada permanece na memória de quem viveu a semifinal da Copa do Mundo

Funcionário do Mineirão e torcedor recordaram o dia 8 de julho de 2014

8 jul 2024 - 05h00
Seleção Brasileira foi goleada pela Alemanha na semifinal da Copa do Mundo de 2014
Seleção Brasileira foi goleada pela Alemanha na semifinal da Copa do Mundo de 2014
Foto: Francisco Carlos Ferreira / Estadão

Exatos dez anos depois, a goleada de 7 a 1 sofrida pelo Brasil para a Alemanha na semifinal da Copa do Mundo em casa ainda permanece na memória de quem viveu de perto aquele dia 8 de julho de 2014. Seja na visão de torcedores ou funcionários do Mineirão, o fiasco da seleção de Felipão guarda a mesma sensação: a de tragédia.

O duelo decisivo proporcionava um momento de celebração para a cidade de Belo Horizonte. Após passar por uma grande reforma, o estádio Governador Magalhães Pinto recebeu um total de seis jogos no torneio, e o último foi justamente o encontro entre brasileiros e alemães.

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Tudo isso tornava a semifinal no cenário perfeito para os funcionários do Mineirão. Na época assistente de operações no acesso dos torcedores ao estádio, Jefferson Douglas lembra que, antes da frustração, o clima era de festa e animação para uma confraternização pós-partida.

“Nós tivemos seis jogos aqui, esse era o último. Estava um clima festivo, muito bom. De todo mundo já esperando para o último jogo do Brasil aqui: ‘Nós vamos ganhar’. Estávamos muito confiantes. Já estávamos programando festas pós, comemorações desse último jogo. Jogou meio que uma água no chope de todo mundo aqui”, diz o hoje coordenador de operações do estádio em conversa com o Terra.

Jefferson Douglas com torcedores colombianos em jogo da Copa do Mundo no Mineirão
Foto: Reprodução/Arquivo pessoal

De um ponto de vista diferente, outra pessoa que acompanhou a derrota humilhante de perto foi o torcedor Felipe Turlão, que passou por Manaus, Fortaleza, Porto Alegre, Brasília, São Paulo e, por fim, Belo Horizonte, em uma verdadeira aventura de seis jogos do Mundial.

Para a partida da semifinal, o jornalista paulista chegou à capital mineira na manhã daquela terça-feira. Acompanhado de um amigo na jornada, ele conta que aproveitou a cidade, passou pela Pampulha e, claro, festejou com muito bom humor, antes de entrar no estádio para comer o famoso feijão tropeiro.

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Veja a escalação da Seleção Brasileira contra Alemanha:

A euforia era tamanha que agora Turlão reconhece que aquilo sequer fazia sentido, devido às atuações da Seleção Brasileira na época: “O pessoal estava muito otimista. Mesmo com o Neymar fora de jogo, foi um clima de euforia. Hoje a gente vê que era um clima totalmente absurdo, não fazia o menor sentido estar naquela euforia." 

Apesar de hoje ver com outros olhos, na ocasião, o palmeirense sentiu que tinha uma missão específica: conduzir a seleção ao hexacampeonato. Por causa da dificuldade de conseguir ingressos, muitos dos presentes na partida não eram os habituais frequentadores de estádios do Brasil. 

“Eu sabia que naquela Copa tinha muita gente que estava no estádio, mas não sabia o que estava fazendo ali. Então, sentia até uma responsabilidade, como torcedor de futebol. Era meio: ‘Tenho que ajudar, apoiar, conclamar as pessoas ali do lado a apoiarem’. A gente com a bandeirinha do Brasil lá, gritando: ‘Sou brasileiro’, que eu não gosto muito, mas é a música que tinha. O clima era esse até o apito inicial. Clima bom. Nem dava para imaginar”, relata o jornalista.

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Felipe Turlão mostra os seis ingressos que conseguiu para jogos do Mundial
Foto: Reprodução/Arquivo pessoal

Festas à parte, a campanha brasileira começou a ruir logo o apito inicial do árbitro. Aos 11 minutos, a Alemanha abriu o placar com Thomas Müller. Pouco depois, aos 23, saiu o segundo com Miroslav Klose. Apesar do choque, Turlão ainda acreditava na virada ou, pelo menos, no empate brasileiro. 

Os minutos seguintes, contudo, mostraram que a confiança do jornalista era equivocada. Aos 24, 26 e 29, os alemães empilharam bolas na rede de Júlio César e fecharam o primeiro tempo com o placar parcial de 5 a 0.

“O primeiro foi um choque por ter sido gol muito fácil, mas ok, 1 a 0. Ainda tem tempo de virar ou pelo menos empatar. Aí vem o segundo gol, e aí entre o segundo e o quinto, foi um atrás do outro. Então, assim, quando sai o segundo, você ainda pensa, 2 a 0 é complicado, mas ainda dá para buscar um 2 a 2 e levar para os pênaltis. Só que aí o terceiro já veio logo em seguida. Aí já foi o momento que eu falei: ‘Agora já era’. Só que foi tudo muito rápido, não tive tempo nem de pensar. Saiu o quarto gol, já estava claro que era um momento histórico. Tanto que foi a hora que eu sentei, parei de ver o jogo, e o quinto gol eu vi lá sentado”, conta Turlão.

Como o torcedor palmeirense recorda, a vontade era de ir embora ao fim do primeiro. Isso, porém, não foi possível devido à logística para voltar a São Paulo. Sem alternativas, ele seguiu no estádio para a segunda etapa e viu mais dois gols da Alemanha e um do Brasil. O tento solitário de Oscar foi motivo de uma comemoração de protesto do rapaz.

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Placar terminou em 7 a 1 para a Alemanha
Foto: Andreas Gebert/Picture Alliance / Getty Images

“Eu considero o pós-partida ao final do primeiro tempo. Vontade de ir embora, mas a logística seria ruim. Tinha que pegar o ônibus. Não teve jeito. Eu comemorei, mas foi aquela comemoração debochada. Tipo: finalmente saiu um gol. Mais debochando da situação do que com qualquer sentimento de alegria, porque ali o sentimento era de choque”, recorda.

Dentro do estádio, entre os 58.141 torcedores que lotaram o Mineirão naquela tarde, os alemães se concentraram atrás de um dos gols, com o restante das arquibancadas tomadas por camisas amarelas.

Com o apito final e a certeza do “fim de um sonho” de Turlão e de outros milhões de brasileiros, a volta para a casa foi diferente para quem torcida e para quem trabalhava na semifinal da Copa do Mundo. 

Mesmo que triste, o jornalista palmeirense viu um cenário pacifico, de brincadeiras e até mesmo consolo dos alemães com os brasileiros. O na época assistente de operações Douglas, no entanto, enfrentou um clima totalmente diferente. 

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O funcionário do estádio relembrou que entrou na arquibancada para assistir ao jogo, mas, ao término do primeiro tempo, ligou o alerta para uma possível saída antecipada dos brasileiros, e foi exatamente o que aconteceu.

“Como é Brasil, a gente tem o hábito de ver um pouco do jogo. Então acabou que no primeiro tempo aconteceu aquela tragédia, né? Aí já ligamos um alerta de que o Brasil os torcedores iriam embora mais cedo. Nisso, eu saio da arquibancada e vou para a parte de trás. Aí a gente já vê aquele clima, já vê gente chorando, gente achando ruim, gente brigando e tudo mais”, diz o mineiro.

Situação essa que veio a piorar com o apito final. Enquanto os alemães já se sentiam campeões, os brasileiros lidavam com a frustração. Conforme Douglas puxa da memória, o cenário estava montado para a confusão.

“Fim da partida, briga, confusão. Os torcedores da Alemanha se concentraram num setor do estádio. Atrás de um gol. Então, no pós-partida, a gente se atentou a esse acesso, de onde os torcedores da Alemanha sairiam, por questão de segurança. E acabou que nesse ponto teve muita confusão, muita briga mesmo. De chegar às vias de fato, dos torcedores do Brasil com os da Alemanha. Teve briga de trocar socos mesmo. O clima deles era, realmente, de campeão e a goleada em cima do Brasil. Então, os caras estavam bem empolgados. Por isso que teve isso. Aí, o pessoal começou a zoar. Brasileiro já put*. E foi aí que o pau quebrou”, conta o profissional.

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Desde que começou a trabalhar no estádio, em 2013, Douglas afirma que só viu algo semelhante ao 7 a 1 em 2019, quando o Cruzeiro foi rebaixado para a segunda divisão do Campeonato Brasileiro: “Um cenário bem parecido foi quando o Cruzeiro foi rebaixado, sabe? Assim, foi tenso no sentido de revolta de torcedor, galera puta e tal. Foram os dois jogos que marcaram."

O dia de Turlão não guardou histórias apenas nos arredores do Mineirão. O jornalista cita um momento da volta para São Paulo que lhe chamou a atenção: quando famosos, ricos, pobres e cidadãos comuns estavam unidos pela tristeza no aeroporto.

“Tava no aeroporto já, voltando. Foi engraçado, tava todo o PIB do futebol lá. Todos os comentaristas, narradores. Aí tinha empresário, estava o Roberto Justus. Tava todo mundo ali no aeroporto. E assim, todo mundo desnorteado. Sem saber para onde ir ou o que falar. Gente muito rica e gente muito pobre. Tava todo mundo ali unido pelo sentimento da tragédia, né. Foi muito engraçado esse momento. Nessa hora, é todo mundo muito igual, né”, completou.

Fonte: Redação Terra
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