A derrota para a Argentina na final da Copa América representou apenas o quinto insucesso de Tite à frente da seleção brasileira em mais de 60 jogos - e foi recém a segunda em jogos oficiais. Mas talvez esteja justamente aí o problema: o time sucumbiu duas vezes em jogos decisivos, nas quartas de final da Copa da Rússia, contra a Bélgica, e na decisão do torneio continental.
Ainda que o treinador diga que não se pode fazer terra arrasada com o vice-campeonato, fato é que a Copa América ajudou a mostrar algumas carências da seleção.
Apenas uma hecatombe tira o Brasil da Copa do Mundo do Catar no ano que vem - líder das Eliminatórias com 100% de aproveitamento, a seleção precisa apenas de mais quatro vitórias em 12 jogos para ir o Mundial -, mas conquistar o hexa vai demandar a correção de alguns problemas crônicos. O Estadão lista cinco que acompanham a seleção já há alguns anos.
1- Dificuldade quando sai atrás no placar
A seleção brasileira já demonstrou inúmeras vezes que sabe administrar o jogo quando tem o placar a seu favor. E os números estão a favor dela desde que Tite assumiu, em agosto de 2016. Aos todo, foram apenas cinco derrotas em 61 jogos. O time não foi sequer vazado em 42 partidas.
O problema é que o Brasil parece se perder quando sai atrás do marcador. Foi assim contra a Bélgica nas quartas de final da Copa do Mundo de 2018, na primeira derrota em jogos oficiais da Era Tite; e foi assim diante da Argentina no sábado, na segunda derrota em jogos oficiais com o treinador à frente.
Para se ter uma ideia, a seleção encerrou o jogo no Maracanã com um único jogador de meio-campo (Casemiro) e nada menos do que cinco jogadores de ataque. A tática em busca do empate, se ainda existia, era a do deus-nos-acuda.
2 - Ataque não flui
Tite é um técnico com convicções e que abraça seu grupo. Tem seus jogadores de confiança e, por definição, costuma insistir neles. Mas tem sido difícil para o treinador montar um ataque com fluidez no atual ciclo para a Copa do Mundo.
Ainda que os números sejam favoráveis e a seleção tenha tido, junto com a Argentina, o melhor ataque da Copa América e seja a mais efetiva das Eliminatórias, fato é que o trio ofensivo não empolga em jogo algum. E não importa quem seja esse trio.
A formação ofensiva tem variado. Gabriel Jesus e Richarlison são os preferidos, e nos últimos jogos compuseram o ataque com Firmino, Gabriel Barbosa ou Everton Cebolinha. Vinícius Jr. teve pouco espaço. Em comum a todos esteve o fato de que foi difícil algum deles fazer um gol.
Isso só escancara que o Brasil segue dependendo de Neymar, que tem jogado mais como armador - mas que não raro acaba sendo avançado no segundo tempo para resolver um problema que o ataque inicial não foi capaz.
3 - O ritmista ainda não veio
Meses antes da Copa do Mundo de 2018, Tite disse que faltava à seleção encontrar alguém que fizesse a função do que ele chamou de "ritmista", aquele jogador que dá o tom à equipe, em especial do meio para a frente. Mas lá se vão mais de três anos e nada de encontrar alguém capaz de dar esse ritmo. Faltando 16 meses para a Copa do Mundo do Catar, a busca segue sendo inglória.
4 - Problemas nas laterais
Para a Copa de 2018, Tite tinha dois laterais esquerdos em alta - Filipe Luís e Marcelo -, e Dani Alves como dono da ala direita. O hoje jogador do São Paulo se lesionou e ficou de fora do Mundial. Danilo e Fagner foram chamados.
Dos quatro que estiveram na Rússia, apenas Danilo segue sendo chamando - mas ninguém irá estranhar se Tite voltar a convocar Dani Alves, que terá 39 anos na Copa do Catar. Todos os demais ainda não conseguiram se adonar da posição. E foi a partir de uma falha de um deles, Renan Lodi, que o Brasil sofreu o gol que deu o título à Argentina no Maracanã.
5 - Crises no comando da CBF
Tite assumiu o comando técnico da seleção em 2016 quando o então presidente da CBF já era alvo de todo tipo de denúncia. Esteve à frente do time na Copa do Mundo com a entidade sendo oficialmente comandada por um mandatário tampão, o coronel Antônio Carlos Nunes. Iniciou a Copa América com o atual presidente da CBF, Rogério Caboclo, pressionado por acusações de assédio - e dias depois ele foi afastado por decisão da comissão de Ética. A seleção, aliás, havia se isolado de Caboclo.
Ainda que seja saudável - e recomendável - que o futebol seja independente da cartolagem, comandar uma seleção sem poder contar com o respaldo total da presidência faz o time nacional parecer um departamento isolado, que funciona na base do cada um por si. E, considerando tudo o que envolve atualmente o comando da CBF, dificilmente isso irá mudar até a Copa do Catar.